Aysén, a nova fronteira para curtir o Chile
Nessa região patagônica existem 4.800 rios, 2.000 lagos, 1.200 ilhas, 28 geleiras, e inúmeros fiordes, estreitos e canais
Imagine a Cordilheira dos Andes. Imagine agora esse maciço andino mergulhando no Pacífico. Pronto. Estou em Aysén, província chilena na Patagônia norte. Continuo: nessa região existem 4.800 rios, 2.000 lagos, 1.200 ilhas e 28 geleiras, e sei lá quantos fiordes, estreitos e canais.
O gigantismo sempre fez parte dessa natureza patagônica. Quanto ao clima tanto faz chegar no inverno ou no verão, a possibilidade de encontrar as quatro estações num mesmo dia é grande.
Escolhi o outono para visitar Aysén. Talvez por ter nascido nessa estação seu look me seduz mais e assim busco um lugar gelado com nevascas que podem ocorrer a qualquer momento. Ainda mais quando pontos de luz dourada (devido aos raios solares) surgem no meio da neve fina. Mas me atraem as tonalidades quentes do vermelho, amarelo e laranja das árvores que se misturam como num quadro do pintor americano Jackson Pollock.
Em telas enormes, esse artista jogava latas de tinta para criar um abstracionismo em cores harmoniosas. Confira e me diga se não estou certo.
O objetivo da minha viagem era percorrer parte da “Carretera Austral”, estrada com 1.240 km e paisagens incomuns para brasileiros, a fim de conhecer a Geleira San Rafael e as ‘Capillas de Marmol’ (Capelas de Mármore). Como as distâncias são grandes separei cinco dias para aproveitar essa jornada ao máximo, sem correria.
Minha primeira surpresa foi na chegada ao aeroporto de Balmaceda, depois de um voo de quatro horas a partir de Santiago. Ao desembarcar o policial me avisa: “ não se distancie muito porque em 300 metros já estará na Argentina. Você sabia que para aterrissar o avião faz a aproximação passando sobre o território argentino”?
Duas horas mais tarde faço check in no Hotel Loberias del Sur, em Puerto Chacabuco. A escolha desse hotel foi proposital. Antes de tudo por sua localização no meio da Carretera Austral, depois pelos roteiros que ele organiza que batiam em cheio àqueles que havia planejado, pois não desejava alugar um carro.
Na manhã seguinte, já em plena ação, fui para Puerto Tranquilo. Esse vilarejo distante 300 km de Chacabuco, às margens do Lago General Carrera, o 2º maior da América do Sul, depois do Titicaca, é ponto de partida para as ‘Capillas de Marmol’.
O roteiro pela Carretera Austral durou mais de sete horas de viagem, por causa de constantes paradas para fotografar cachoeiras, casas solitárias de madeira em meio a árvores coloridas e montanhas com seus cumes nevados. E, ainda mais com o tempo mudando de acordo com seu humor: de um frio de 6º C ao amanhecer, nevasca no meio do caminho, sol de rachar na hora do almoço no povoado Cerro Castillo, e completou com um toró daqueles quando cheguei em Puerto Tranquilo. Mas, não era esse o clima que estava esperando?
Não perdi o entusiasmo para ir debaixo de chuva e frio até as ‘Capillas de Marmol’. Senti apenas a falta de uma roupa impermeável, pois a jornada (ida e volta) e permanência nos labirintos de mármore demora duas horas. Mas as cavernas arrebatam!
Nas águas agitadas do lago surge um enorme monólito e fica claro o quanto a água e o vento desgastaram sua base, poliram o mármore deixando à vista os extraordinários veios da pedra. Quando o bote se aproxima surgem as belas cavernas com labirintos, túneis, arcos, e passagens estreitas.
Esculpida durante milhões de anos as ‘Capillas de Marmol’, na Patagônia chilena, é uma inigualável obra de arte, rara união de grafismos, texturas, formas e cores. E, mais o som da água batendo nas rochas embala a visão. Os furos e labirintos em seu interior tornam o local ainda mais belo e misterioso. Em dia de luz excepcional e com águas muito tranquilas, pode-se ver ainda as diferentes formações submersas. Diante daquele mármore, penso que o genial Michelangelo surtaria.
Dois dias depois estou navegando novamente. Desta vez a bordo do catamarã Chaitén, numa intrincada trama de fiordes, canais, e estreitos que ligam ilhas por toda parte para alcançar a geleira São Rafael. Um passeio que demora dez horas e inclui café da manhã, almoço e o lanche da tarde.
A primeira pista que estou próximo da geleira é a visão de blocos de gelo que flutuam na correnteza, os témpanos. A imagem da água cristalina coalhada desses blocos se confunde com o céu e as nuvens, e me sugere mar e terra invertidos.
À vista do glacial é surpreendente, inesperada e magnífica. A colossal massa de gelo azul desliza por 15 quilômetros por uma encosta até desabar na laguna, formando muralhas de 60 metros de altura.
Desembarco num zodíaco, bote de borracha, para me aproximar mais da geleira. Não há vento, mas a chuva faz marcação cerrada o tempo todo. Novamente me arrependo de não ter trazido calças e blusões impermeáveis para essa viagem à Patagônia. Mesmo assim a visão de icebergs em tons azuis translúcidos ao meu lado compensa qualquer outro pensamento. No retorno ao catamarã, chocolate quente, vinho ou whisky ficam à disposição.
O nome Chile ressoa no mundo todo entre os que cultuam aventura, certo? E, o que dizer então de Aysén, destino que sozinho engloba muitas viagens? Esse é seu trunfo!
Onde ficar: Hotel Loberias del Sur, Puerto Chacabuco. Excelente localização, amplos e confortáveis quartos, substancioso café da manhã, almoço e jantar com produtos regionais como peixes e mariscos sempre frescos, wi-fi gratuito, além de oferecer as principais excursões pela região de Aysén, www.loberiasdelsur.cl
Para saber mais: www.recorreaysen.cl
Importante lembrar: Um Seguro Viagem — sempre necessário e importante– só é lembrado quando precisamos dele. Foi o que aconteceu comigo com os imprevistos nos trajetos aéreos dessa viagem. Meu voo São Paulo – Santiago teve demora de quase seis horas, sem prévio aviso da cia. aérea. Três dias depois, o voo Santiago – Balmaceda, pela mesma cia. antecipou seu horário em quatro horas, novamente sem nenhum comunicado.
Cancelamentos de voos, atrasos, perda de bagagem são apenas alguns itens que podem transformar sua viagem num pesadelo.
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Texto e fotos: Heitor e Sílvia Reali