Casa de José Saramago é atração emocionante da Espanha

17/11/2015 20:36 / Atualizado em 07/05/2020 10:27

Por Eduardo Vessoni, do site Viagem em Pauta

O interfone branco da casa de José Saramago e Pilar del Río nunca funcionou muito bem, o que algumas dezenas de vezes obrigou o próprio Prêmio Nobel da Literatura a se dirigir à porta para saber quem insistia em tocar a campainha.

Não raro, o visitante desconhecido do lado de fora –um fã em busca de uma dedicatória ou alguém para trocar palavras– era convidado para entrar e tomar um típico café português na cozinha com vista para o mar de Puerto del Carmen, nas Ilhas Canárias.

Cinco anos depois da morte de Saramago, em 2010, o clima hospitaleiro permanece inalterado naquela construção branca que se destaca na paisagem vulcânica dessa ilha espanhola, a 140 km da costa da África e a mil da Península Ibérica.

Recentemente, o Viagem em Pauta esteve nas Ilhas Canárias e visitou ‘A Casa’, como o local é conhecido, e foi recebido por Juanjo, filho de Pilar del Río, esposa de Saramago.

Está tudo lado lá, como se o escritor estivesse para chegar a qualquer momento, naquela casa que emprestou seus cômodos para abrigar um museu que até hoje serve como residência. E a gente nunca sabe se está em uma casa que virou museu ou se é um museu com alma de casa.

O relógio da sala sempre marca 16h, horário em que o escritor conheceu sua esposa Pilar del Río; o computador onde escrevera clássicos da literatura segue sobre a mesa de madeira da biblioteca; e o café continua sendo preparado na cozinha para o visitante recém-chegado.

Localizada no município de Tías, em Lanzarote, ‘A Casa’ foi a residência em que o casal dividiu espaço com os cunhados de Pilar, por 18 anos, e local onde Saramago escreveu obras como “Ensaio sobre a cegueira” e “A viagem do Elefante”.

Durante uma conferência em Tenerife, em maio de 1991, José e Pilar aproveitaram a viagem para visitar os cunhados María del Río e Javier Perez, que já moravam nessa ilha de 845 km² de extensão. Apaixonados por aquele cenário de traços surreais, Pilar teria perguntado a Saramago com a intenção de fincar raízes por ali: “Nosso futuro passa por Lanzarote, José?”.

Não só o futuro, como também o presente e o passado.

A visita guiada de uma hora pelos cômodos da casa, transformada em museu, em 2011, é como uma experiência literária ao vivo, em que os textos escritos pela própria Pilar vão sussurrando detalhes das vidas profissional e pessoal de Saramago, nos ouvidos dos visitantes que são acompanhados pelo áudio guia.

Assim como em sua obra, de textos marcados pela oralidade e pela pontuação nada convencional, a visita surpreende. Sobretudo quando o guia que lhe abre a porta da casa é Juanjo, o filho de Pilar del Río que também trabalha no museu.

E a cada ambiente que se visita, Saramago parece voltar a viver como uma viagem que sempre recomeça, assim como a vida, segundo texto do próprio escritor, na obra ‘Viagem a Portugal’.

Confira casas de escritores brasileiros que viraram museus

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Um dos espaços mais impactantes dessa ‘casa feita de livros’, como Saramago definia a residência, esse ambiente conta com um acervo de 16 mil livros, além de objetos como o computador usado pelo escritor e um quadro do pintor checo Jiri Dokoupil, em que o casal é retratado em desenhos feitos com fumaça de vela.

Nessa espécie de exposição de livros, é possível ver obras com dedicatórias de escritores como Gabriel García Márquez e Eduardo Galeano, e uma estante só com títulos escritos por mulheres, um pedido feito pela própria Pilar, para quem “elas têm seu espaço, nas bibliotecas”.

A rotina do escritor no local era se sentar na mesa em frente, todas as manhãs, para ouvir música e retomar os escritos do dia anterior.

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Local de descanso de Saramago, esse ambiente se destaca pelos diversos quadros pintados que retratam personagens dos livros do Prêmio Nobel, como as obras de Oscar Niemeyer e Carybé.

Essa sala possui vista para o jardim e o mar, que Saramago costumava chamar de “a melhor obra”. Era o lugar para estar, ter estado e seguir estando.

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Foi no quarto do casal que, no dia 18 de junho de 2010, José Saramago “deixou que a vida o fosse deixando ou se foi deixando ir da vida”, segundo descrição sobre esse cômodo da casa.

O local abriga livros, fotografias e gravuras adquiridas em um antiquário de Budapeste.

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O local onde Saramago escreveu “Ensaio sobre a cegueira” e os “Cadernos de Lanzarote” abriga dicionários, fotografias de familiares como as de seus avós e de sua única filha, coleções de tinteiros, canetas e corta-papéis, e uma cópia do Prêmio Nobel de Literatura.

Dado a Saramago, em 1998, o prêmio foi recebido no mesmo dia da comemoração dos 50 anos da Declaração dos Direitos Humanos e o original se encontra, atualmente, na Biblioteca Nacional de Portugal.

Toda vez que um visitante chega a esse ambiante, o guia aciona o CD com poemas cantados em flamenco por Esperanza Fernández. Saramago preferia o típico ritmo espanhol ao fado português que, segundo o próprio escritor, tinha caráter melancólico.

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Nem só com livros se faz a casa de Saramago e Pilar.

Objetos feitos com materiais da ilha como o tapete de pedra vulcânica que Saramago cuidava, pessoalmente, uma gravura de César Manrique e arte portuguesa do século 17 são algumas das peças expostas nessa sala.

Destaques para a coleção de cavalos, uma das paixões de Saramago, sobre um móvel Art Déco (que passou a receber elefantes, após o lançamento do livro “A viagem do Elefante”) e o relógio que, assim como todos os outros da casa, marca quatro da tarde.

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Esse é o ambiente mais socializador de toda a residência, onde os guias preparam um típico café português para os visitantes, hábito mantido desde a época em que Saramago passava algumas horas do dia no local.

Com vista para o jardim e até hoje local de almoço da família, a cozinha já recebeu nomes como Bernardo Bertolucci, Carlos Fuentes, Eduardo Galeano, Marisa Paredes, Pedro Almodóvar, José Luis Rodríguez Zapatero e Sebastião Salgado, quem espalhou fotos de trabalhos no mundo e para quem Saramago escreveria o texto que havia sido pedido pelo fotógrafo brasileiro.

Uma das lembranças de Juanjo, filho de Pilar e guia no museu, são as tardes de churrasco no jardim e as longas refeições na mesa da cozinha.

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Interfone na entrada da Casa de José Saramago e Pilar del Río, em Lanzarote, nas Ilhas Canárias[/img]

SAIBA MAIS
A Casa
Calle Los Topes, 2 (Lanzarote, Ilhas Canárias – Espanha)
Tel.: (34) 928 833 053
De segunda a sábado, das 10h às 14h (a última entrada é às 13h30)
Entrada paga
www.acasajosesaramago.com