O que aprendi vivendo 100 dias dentro de uma Kombi
Ao todo foram 100 dias de viagem e aproximadamente 18 mil km rodados, saindo do Brasil, mais especificamente de Campinas, no interior de São Paulo, passando por toda a Argentina, de norte a sul, chegando na cidade mais austral do mundo, Ushuaia, e voltando pelo Chile, de sul a norte, atravessando o deserto de Atacama e voltando novamente para o Brasil, com direito a uma passadinha no Paraguai. Toda essa aventura ou loucura, chamem como preferir, foi feita por mim e meu namorado, a bordo de uma Kombi ano 1990 que apelidamos carinhosamente de Baunilha.
A decisão de fazer uma viagem de carro, mais especificamente uma Kombi, surgiu depois que assistimos o documentário “Transpatagônia” do jornalista Guilherme Cavallari, que fazia o percurso da transpatagônia de bicicleta e sozinho. Como não somos tão radicais assim resolvemos adaptar um pouco nosso tipo de viagem, mas o destino já estava certo iríamos até o fim do mundo na cidade de Ushuaia.
Viajar de carro não é um tipo de viagem barata, ainda mais por uma longa distância, precisávamos reduzir os custos ao máximo e então resolvemos comprar uma Kombi e morar dentro dela, assim diminuiria os custos com hospedagem, que é uma das coisas mais caras de uma viagem.
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Depois de um mês da decisão já estava tudo pronto, corremos contra o relógio, pois não queríamos pegar o inverno na patagônia e também não queríamos adiar a viagem para o ano seguinte. Fizemos o roteiro somente de ida, o de volta iríamos fazer no decorrer da viagem. Foi preciso fazer algumas adaptações na Kombi, colocando um sofá cama, uma pia e algumas caixas de MDF que serviram como armários para utensílios de cozinha e roupas.
Agora, o que eu aprendi vivendo 100 dias dentro de uma kombi? Posso dizer que foram muitos os aprendizados e vou listar alguns deles aqui pra vocês. Primeiramente aprendi a praticar muito mais o desapego, morar dentro de uma kombi não te trás luxo algum, muito menos conforto. Aprendi a dar valor nas coisas pequenas da vida e nas coisas não materiais, observar a natureza é algo incrível e nesses momentos tudo o que eu precisei foi de um bom agasalho e uma caneca de chá quentinho, só pra ficar horas contemplando o que a vida me proporcionou.
O luxo eu já deixei de lado em outras viagens que fiz, mas essa foi bem mais intensa, passar uma semana sem conseguir achar um lugar para tomar banho é realmente difícil, mas a cada curva da estrada a paisagem tirava essa preocupação da minha mente. Houve partes do Chile, mais precisamente na carretera austral, que não havia banheiros, nem se eu quisesse pagar para usar, aprendi a fazer xixi nos lugares mais inusitados e quase congelei fazendo xixi no meio da neve, mas no final foi tudo muito engraçado.
Os 100 dias e 18 mil km me trouxeram uma paz interior que nunca havia tido antes, aprendi a dar valor no que realmente é necessário, aprendi a ser sempre gentil com as pessoas, mesmo que elas não sejam com você. Uma das maiores lições que levo disso tudo é que a vida pode ser bem mais simples do que se imagina e que o mundo não é tão ruim e perigoso como aparece nos programas policiais, eu aprendi a confiar nas pessoas, abrir meu coração e aceitar tudo o que o próximo tem para me oferecer.
Foi confiando que conheci pessoas maravilhosas nessa viagem, pessoas que nos acolheram em suas casas sem ao menos nos conhecer, que nos ajudaram quando precisamos, que nos levaram para conhecer suas famílias e que hoje fazem parte da nossa história.
Ter cuidado é diferente de se privar de tudo por medo, eu nunca deixei de ter cuidado durante nossa viagem e também nunca me privei de experiências por medo. Se não confiarmos nas pessoas nunca saberemos o que elas tem a nos oferecer.
Estar disposto a receber, aprender e retribuir é o aprendizado que devemos levar para nossa vida.