Leia reportagem de José Alberto Guereiros na qual Caymmi fala do filho Dori

22/05/2014 18:21 / Atualizado em 06/05/2020 16:10

Reportagem de José Alberto Gueiros, feita em 13 de outubro de 1954, em que Dorival Caymmi fala carinhosamente de seu filho Dori:

 
  - Picasa
” – E anda agora, fascinado pelo mistério da adolescência. Descobre coisas, pergunta lindas perguntas. Não sabe o que lhe está acontecendo, mas felizmente eu sei. Treze anos com muita imaginação é assim mesmo. 

Isto é Caymmi, abordo de uma grande madrugada, no “Clube 36”, falando do filho, Dori, cujo desenho (feito a caneta entre “Só Louco” e “Maracangalha”) publicamos aqui. O seu lado de pai é tão belo quanto de compositor.

– São as minhas melhores invenções – diz o poeta do mar referindo-se à meninada: um brotinho de 15 anos (“Nãna… e descobriu que está bonita”); o primeiro varão (“Dori, estou me repetindo nele”), e o caçula (“Danilo Cândido… uma beleza com o temperamento da mãe”).

Pretender que um homem famoso seja ininterruptamente um ator até para si mesmo é como pretender que o acrobata ao tomar o trem execute um duplo salto mortal ou que o malabarista jogue para o ar os pratos, os ovos e os talheres na hora de tomar suas refeições. A frase é roubada de Pitigrilli, mas tem o propósito honesto de liquidar o lugar-comum: “ele é completamente diferente na vida real”.

Caymmi não fica em casa de violão em punho, como gostariam de imaginar os menos imaginosos. Mas continua poeta na educação dos filhos. Observa-os como se assistisse a auroras, e se encanta dos seus encantos. Deste seu Dorival (Dori) que desenhou, disse-nos sutilezas.

– Um menino tem um mundo interior que não acaba mais. E sabe muito bem esconder os sonhos que sonha, de olhos abertos. Olhos que só observam a realidade para descobrir sugestões de beleza, outros motivos de sonho… Vejo a minha infância se repetindo nele. Na inquietação de pai, temo, às vezes, pelo seu futuro, formando-se assim romântico para uma era de pragmatismo. Mas não deseja acorda-lo. Prefiro não interferir nas suas cismas que devem ser tão belas. Antes ponho-me a cismar também, tentando descobrir a minha mocidade na dele. E nestas indagações sinto a beleza no mistério de ser pai.

Ali estava o Caymmi normal, sem palmas, sem acompanhamento, dizendo fora da música a melhor das suas canções.

O pescador tem dois amores. Um bem na terra e um bem no do mar.

Agora, Caymmi, ponha os meninos nas músicas porque você tem três novos amores, além de Stella e do mar.

Dorival filho, desenhado pelo Dorival pai, de madrugada.”