O Largo da Batata precisa de você
Grupo se reúne semanalmente para fazer uma “ocupação por gambiarra” no meio do espaço vazio
Sexta-feira, 19h no Largo da Batata. Centenas de pessoas andam de um lado para o outro, passando por lojas de comércio popular, bares e barracas de camelôs. Bebem, compram, falam aos celulares, procuram o ponto de ônibus ou a entrada do Metrô mais próxima. Tudo acontece sob a luz âmbar que vem dos postes de iluminação.
Uma jovem se aproxima de um grupo de 20 pessoas dispostas entre cadeiras de praia, guarda-sóis, bicicletas e redes. “Oi, eram vocês que estavam aqui semana passada, tocando música? Vocês estão aqui sempre?”. Quem a responde com uma fala já ensaiada é Marcos Rodrigues, um dos participantes do grupo “A Batata precisa de você”, que, uma vez por semana, ocupa um pedaço de chão no Largo da Batata para propor uma nova estratégia de urbanização para a cidade de São Paulo.
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“Eu até já decorei o que falar, de tanta gente que chega perguntando”, diz Rodrigues, contando que as ocupações do grupo atraem cada vez mais curiosos e passantes. “Semana passada, quando tivemos forró, umas 400 pessoas chegaram a se juntar aqui em volta”, completa.
A programação dos encontros muda semanalmente. Desde karaokê até roda de samba, passando por oficina de pipas, intervenções, forró, futebol e outras atividades lúdicas. Cada pessoa pode propor o que quiser e todo mundo está convidado para fazer parte da ocupação.
A estrutura montada é formada por coisas compradas nos arredores do Largo e por outras que foram “agregadas” pelos participantes. Assim, cadeiras, guarda-sóis, grama artificial e redes entre os postes de luz se transformam em um novo tipo de mobiliário urbano.
Os encontros são organizados pelo Facebook, no grupo aberto “A BATATA PRECISA DE VOCÊ!”. Acontecem sempre às sextas, a partir das 18h, e duram até a madrugada, dependendo da disposição de quem estiver por lá.
Ocupação regular e hackeada
Quem idealizou a “ocupação por gambiarra” foi a arquiteta e produtora cultural Laura Sobral, paulistana de 28 anos e vizinha do Largo da Batata há onze meses. “Temos várias ocupações pontuais na cidade que acabam se tornando mais midiáticas do que efetivas”, explica. “As pessoas passam, veem um grupo de jovens estranhos ao local e não dão muita bola. O ideal é que a ocupação seja feita por quem é do local. Por isso que, quando me mudei para cá, resolvi ver se as pessoas daqui estavam dispostas a isso”, conta.
Em janeiro deste ano, Laura chamou amigos e família para fazer a primeira ocupação, um “Leituraço”. “Éramos 10 gatos pingados lendo aqui, mas foi ótimo porque era a primeira vez e a intenção era passar a ideia de que uma coisa ia nascer ali”, lembra. “Não é legal chegar aqui com 15 coletivos e mil pessoas, os locais têm que se sentir convidados a participar do acontecimento e a fazê-lo crescer”.
Laura faz de tudo. Organiza o evento, convida, junta os participantes, escreve cartazes, cuida das atividades. Passa a semana dormindo pouco para programar a sexta-feira. “Mas as coisas estão ficando cada vez mais colaborativas”, fala, contando que no último evento, por exemplo, um grupo de conhecidos propôs uma oficina de pipas, chegou no dia e fez. “Outro dia chegou um cara e pediu cinco reais para comprar querosene e ficar cuspindo fogo. Ele comprou e ficou aí cuspindo fogo. Entendeu como funciona?”
E o público parece responder positivamente. Além das pessoas que aparecem perguntando o que está acontecendo – e são muitas -, algumas param e se juntam ao fuzuê. “Tem quem passa antes de ir pra casa, quem vai e depois volta, quem sai do bar e confere, quem vem aqui pra juntar latinha e acaba dançando. Tem de tudo”, diz Marcos Rodrigues, pai de Laura.
Para fazer parte da ocupação regular, “não existe curadoria ou nota de corte”. “Isso aqui é completamente hackeado, é código aberto, qualquer um pode copiar”, diz Laura. “Temos que saber usar as vias legais para melhorar a cidade, claro, mas também temos que partir para a ação direta de vez em quando. Até porque não precisa de autorização para fazer o que fazemos. Somos só uns cidadãos reunidos numa praça”, conclui.