Cientistas criam tijolo feito de xixi

Combinação de urina, areia e bactérias resulta em material resistente

Pode soar estranho, mas o “número 1” nosso de todo dia pode ser muito útil para fazer coisas novas. Na Universidade da Cidade do Cabo, na África do Sul, um grupo de pesquisadores desenvolveu um tijolo feito de xixi humano.

O tijolo é um exemplo de como o xixi pode ser reaproveitado
Créditos: Divulgação/University of Cape Town
O tijolo é um exemplo de como o xixi pode ser reaproveitado

O processo funciona da seguinte forma: primeiro de tudo, urina, areia e bactérias são colocadas juntas em um molde, neste caso, na forma de tijolo.

As bactérias liberam uma enzima chamada urease, que reage com a ureia presente na urina, enquanto produz carbonato de cálcio, que “cimenta” a areia no formato desejado.

O carbonato de cálcio, aliás, é o calcário, ingrediente principal do cimento.

Os ingredientes básicos do tijolo feito de xixi: urina, areia e bactéria que produz enzima responsável pelo efeito “cimento”
Créditos: Divulgação/University of Cape Town
Os ingredientes básicos do tijolo feito de xixi: urina, areia e bactéria que produz enzima responsável pelo efeito “cimento”

Esse processo químico, chamado de precipitação microbiana de carbonato, é similar à maneira como se formam corais no mar.

Um ponto importante é que tudo acontece à temperatura ambiente. Uma das vantagens disso é que o processo ajuda no enfrentamento do aquecimento global.

Para ser fazer um tijolo comum, por exemplo, é preciso queimar o barro a uma temperatura de cerca de 1.400 graus, o que emite muito CO2.

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Em média, leva-se de quatro a seis dias para o tijolo ficar pronto, mas, quanto mais tempo a bactéria tiver para agir, mais resistente será o produto final.

O tijolo feito de xixi fica pronto em alguns dias – quanto mais tempo de reação, mais resistente ele fica
Créditos: Divulgação/University of Cape Town
O tijolo feito de xixi fica pronto em alguns dias – quanto mais tempo de reação, mais resistente ele fica

O tijolo feito de xixi tem cheiro?

E tem cheiro? No início do processo, sim, porque a urina libera amônia (que, aliás, é convertida m fertilizante rico em nitrogênio). Mas o odor desaparece após 48 horas, dizem os cientistas.

Eles também afirmaram, em reportagem da BBC, que, em uma das etapas da produção, boa parte dos patógenos é eliminada, portanto o tijolo não traz riscos para a saúde.

O nitrogênio, que pode ser obtido da urina, é usado em fertilizantes
Créditos: Criniger kolio/Shutterstock
O nitrogênio, que pode ser obtido da urina, é usado em fertilizantes

Produção de fertilizantes

Além do tijolo, outros subprodutos desse processo desenvolvido pelos pesquisadores é o nitrogênio e o potássio, que são componentes importantes de fertilizantes.

O xixi é responsável por menos de 1% da água suja descartada em uma casa, mas contém 80% do nitrogênio, 56% do fósforo e 63% do potássio de toda essa água, segundo os pesquisadores.

Cerca de 97% do fósforo presente na urina pode ser transformado em fosfato de cálcio, outro ingrediente chave para fertilizantes.

Isso é importante porque as reservas naturais de fosfato estão se esgotando pelo mundo.

Em outras palavras, o processo todo do tijolo feito de xixi pode resultar em “resíduo zero”, com a urina sendo completamente convertida em produtos úteis.

Coleta de urina

A ideia de usar ureia para fazer tijolo já foi testada há alguns anos nos Estados Unidos usando soluções sintéticas.

Mas a urina usada pelos pesquisadores é “natural” e foi coletada em banheiros masculinos, por meio de urinóis especiais.

Em média, uma pessoa produz de 200 a 300 mililitros de urina a cada vez que faz xixi, segundo informaram os pesquisadores.

O tijolo desenvolvido por eles precisa de 25 a 30 litros – parece muita coisa, mas boa parte dessa urina também é usada para produzir cerca de um quilo de fertilizante.

Então, para fazer um tijolo de urina, você teria que ir ao banheiro cerca de cem vezes.

Os desafios agora, portanto, são como coletar urina de mulheres, a logística para reunir e transportar o líquido e como transformar a produção desse tijolo em algo rentável.

De qualquer maneira, a novidade não deixa de provocar um jeito diferente de olhar para a questão de reciclagem e reaproveitamento desse resíduo.

Além de novas possibilidades para a construção civil e a arquitetura.

Curadoria: engenheiro Bernardo Gradin, presidente da GranBio e especialista em soluções sustentáveis.

Em parceria com qsocial