Relato mostra como acolhimento ajuda a superar trauma de abuso
“Eu tinha uns 8 anos e fui abusada sexualmente pelo zelador do prédio onde morava. Eu não tenho traumas porque eu fui IMEDIATAMENTE COMPLETAMENTE ACOLHIDA”, relatou a ginecologista Bel Saide em post compartilhado no Facebook.
Cerca de 30 anos após o acontecimento, ela compartilhou depoimento sobre a experiência de sua infância, no qual descreve como o acolhimento de todas as pessoas ao seu redor foi fundamental para que ela, criança na época, pudesse superar o trauma causado pelo abuso.
Situações de violência sexual, como a relatada por Bel, são ainda muito comuns entre crianças. De acordo com relatório da Childhood, entre 2012 e 2015, foram registrados mais de 157 mil casos de violência sexual (que engloba tanto a exploração quanto o abuso) de crianças e adolescentes. Isso significa que, a cada uma hora, há pelo menos 4 casos de uma criança ou adolescente sexualmente violentada no Brasil.
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Nesses casos, além da denúncia, acolher a criança, como aconteceu com Bel, é fundamental para ajudá-la a superar o trauma.
“Percebo que a maioria carrega uma dor profunda, em maior ou menor grau. Muitas tem como sequela dificuldades em diversos aspectos da vida, muitas desenvolvem sérias doenças ginecológicas em consequência. Eu menstruo sem dor. Meu útero é saudável. Eu estranhava isso. Por que? Eu não tinha traumas, eu não me sentia sequer culpada porque eu fui IMEDIATAMENTE COMPLETAMENTE ACOLHIDA. Por TODOS a minha volta. Por meu irmão que mesmo tão pequeno me ouviu, acreditou em mim e cuidou de mim, levando o assunto a quem deveria levar, impedindo assim que aquilo se prolongasse ou piorasse. Por meus pais que nem por um segundo sequer duvidaram de mim, nem sequer me perguntaram nada. Ate pelos vizinhos do prédio que sabendo de tudo nunca me abordaram com questionamentos de nenhum tipo, assim como não insinuaram que meus pais não me protegeram daquilo. Eu era a vítima, completamente e o tempo todo a vítima. Uma criança indo brincar. Ele era o abusador. Ele e somente ele o culpado. Senti vergonha, mas não passei por constrangimentos. Fui acolhida por meu pai que reagiu à altura e rapidamente”
No relato, ela também menciona que seu pai, muitos anos depois, lhe revelou que chegou a prestar queixa contra o abusador, e que ela, preservada por essa decisão, não passou por exame de corpo e delito, e nem precisou relatar os detalhes do abuso para outras pessoas.
Aprovada nesse ano, o PL (Projeto de Lei) 3.792/15, protege a criança e evita que ela precise relavar repetidas vezes uma situação de abuso, o que, muitas vezes, significa reviver a situação e pode causar ainda mais traumas.
- Afinal, o que é abuso sexual?
De acordo com o National Center for Child Abuse and Neglect, o abuso sexual acontece quando existem contatos ou interações entre uma criança ou adolescente com um adulto usado para estimulação sexual do abusador ou de outra pessoa.
Para a ABRAPIA (Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência), “abuso sexual é uma situação em que uma criança ou adolescente é usado para gratificação sexual de um adulto ou mesmo de um adolescente mais velho, baseada em uma relação de poder”.
Já para a Academia Americana de Pediatria o abuso sexual é considerado quando uma criança é envolvida em atividades sexuais que não é capaz de compreender, para as quais não está preparada em termos de desenvolvimento e não pode dar consentimento, e/ou que violam as leis ou tabus da sociedade.
Especialistas recomendam o diálogo e a informação como a melhor forma de proteger crianças de abusos.
“De qualquer maneira, é possível conversar com a criança sobre a importância dos cuidados com seu próprio corpo, indicando que ela pode recusar alguns tipos de carinho ou contato que não tenha vontade de ter e mostrando que algumas partes do corpo são muito íntimas e não devem ser tocadas por qualquer pessoa. Esse diálogo cabe quando o adulto possui uma relação de vínculo e confiança com a criança e precisa ser delicado e adequado à linguagem infantil, caso contrário não fará sentido para ela, podendo assustá-la e angustiá-la. Outra possibilidade é explicar à criança que nem sempre os outros sabem que a estão machucando ou tendo um tipo de contato físico que ela não gosta e que nessas ocasiões é importante que ela diga algo, colocando seu limite ou pedindo ajuda”, explicou a psicóloga Isabel Gervitz em entrevista ao Catraquinha.
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