Através da música e do esporte, instituto promove autonomia de deficientes visuais
Segundo o IBGE, o país possui mais de 6,5 milhões de pessoas com deficiência visual, sendo cerca de 500 mil completamente cegas
Aline Louzano
Em Soneto da Cegueira, o autor argentino Jorge Luis Borges, que perdeu a visão aos 55 anos, escreveu: “quem é sem olhos sabe mais, enfim: / Seus dedos são lanterna ao serenar / O corpo, a dor, a alma, o verbo, o lar, / E o mundo explode em luz dentro de mim”.
Agora, imagine perder a visão na vida adulta e precisar depender de outros sentidos para se orientar. Com essa proposta, o Instituto dos Cegos – Centro de Reabilitação Visual busca habilitar e reabilitar essas pessoas, promovendo sua autonomia.
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Romiro Pedro da Silva, gestor da instituição, explica que, para treinar o tato, são oferecidas inicialmente aulas de artesanato antes do ensino do braille.
A organização possui uma sala de tecnologia assistiva, onde os alunos aprendem a usar o celular, mexer no WhatsApp e enviar e-mails, por exemplo. “Temos até um equipamento que lê livros automaticamente quando colocado à frente”, relata.
É comum que algumas pessoas tenham dificuldades no uso do computador, por isso também são oferecidas aulas de datilografia.
Também são atendidos crianças e adolescentes em idade escolar com aulas no contraturno. “Transformamos todo o material passado pelos colégios em braille ou ampliamos conforme a necessidade da baixa visão”, conta Romiro, acrescentando que são recebidos estudantes tanto do ensino público quanto do privado.
No processo de reabilitação e habilitação, a inclusão é fundamental. Por isso, sempre que possível, toda a turma da escola é convidada para visitar o local. “Promovemos um dia de vivência para que todos conheçam as dificuldades e compreendam o cotidiano do amigo”.
Após o primeiro ano de atendimento, é realizada uma reavaliação, e, dependendo da evolução, os atendidos podem receber alta de alguns profissionais. “Eles só recebem alta quando atingem o nível de autonomia necessário”, explica.
Mesmo após a alta, os participantes continuam frequentando a organização mensalmente para atividades de convivência. “Eles passam o dia todo aqui, conversando, assistindo a filmes e cantando no karaokê. Em alguns dias, também organizamos bailes. Aqui acaba sendo uma segunda casa para eles”.
Um motivo de orgulho para a instituição é a ausência de fila de espera. “Atendemos todos que chegam, e de forma gratuita”, comemora Romiro, destacando que não há limite de idade para participar.
A equipe é composta por 36 profissionais, entre médicos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicólogos, pedagogos, assistentes sociais e professores de informática, música e educação física, atendendo 280 estudantes de São José do Rio Preto e de 102 cidades da região.
O instituto mantém parcerias com o Sistema Único de Saúde (SUS), secretarias de educação, além da secretaria de assistência social.
Mercado de trabalho e autonomia
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que mais de 6,5 milhões de pessoas no Brasil possuem alguma deficiência visual, sendo cerca de 500 mil completamente cegas e 6 milhões com baixa visão.
A busca por emprego dessa população é marcada por muitos desafios. Por isso, a entidade mantém parcerias para facilitar a entrada dos atendidos no mercado de trabalho. “No mês passado, um dos nossos assistidos, que é excelente em informática, começou a trabalhar em uma empresa de automação”.
Para garantir a adaptação tanto da empresa quanto do assistido, uma profissional visita o local e orienta sobre acessibilidade, além de ensiná-lo a se locomover no ambiente de trabalho.
Esse processo de ganho de autonomia é fundamental para a autoestima. “Antes, muitos adultos passavam o dia inteiro em casa; nós os ensinamos a andar de ônibus. A evolução é tão grande que até casais se formaram aqui”, relata Romiro.
Em busca de mais independência, são oferecidas aulas de culinária, nas quais os assistidos aprendem a preparar pratos básicos.
Evolução da instituição
A instituição foi fundada em 1º de setembro de 1948, na cidade de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, com o nome de Instituto Riopretense dos Cegos Trabalhadores, e contou com o apoio de empresários, comerciantes e entidades da sociedade civil.
Inicialmente, o objetivo era evitar que as pessoas com deficiência visual fossem abandonadas nas ruas, e funcionou como abrigo até 1994. “As famílias deixavam seus parentes aqui e não retornavam. Tivemos um atendido que morou no instituto por 28 anos”, relembra Romiro.
Na época, os assistidos aprendiam a fabricar produtos como vassouras, que eram vendidos nas ruas. “Isso mostrava à sociedade que eles eram pessoas úteis”.
Atualmente, a organização oferece atividades esportivas como o judô, cujas aulas são ministradas por uma atleta paralímpica. O espaço também conta com uma academia interna, e um dos professores de educação física faz parte do Comitê Paralímpico Brasileiro.
Outra atividade oferecida é a musicalização. “Nosso professor de música foi aluno da instituição e agora ensina tanto crianças quanto adultos”, explica Romiro. Três profissionais se dedicam ao ensino de canto e de instrumentos como violão e bateria. No final do ano, são organizadas apresentações para as famílias.
O instituto também produz próteses oculares em parceria com o SUS e oferece consultas oftalmológicas para toda a comunidade três vezes por semana a preços populares. Além disso, para promover acessibilidade e inclusão, é oferecido a bares e restaurantes a produção de cardápios em braille, e toda a renda é revertida para a instituição.
Saiba como ajudar
O Instituto dos Cegos está localizado na Rua Dr. Cléo de Oliveira Roma, nº 200, Jd Morumbi, São José do Rio Preto – SP, e aceita doações de pessoas físicas e empresas. Você também pode ajudar comprando na lojinha solidária. Voluntários são bem-vindos para tarefas como contação de histórias e organização de doações. Saiba mais seguindo os perfis no Facebook e Instagram ou visite o site.
Aline Louzano – Lupa do Bem
Causadora de Educação