A incerteza do amanhã: bióloga teme futuro da Ciência no Brasil
Pós-doutoranda e pesquisadora pela UFRGS, Flávia Tirelli é autora de um abaixo-assinado, criado na Change.org, contra cortes na CAPES
Ela se formou bióloga, mestre em Biologia Animal e doutora em Zoologia. Fez parte do doutorado na Inglaterra e hoje atua como pós-doutoranda na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde pesquisa sobre ecologia e conservação dos mamíferos terrestres. Criadora de um abaixo-assinado em defesa dos investimentos na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Flávia Tirelli lembra que sua especialização só foi possível graças às bolsas concedidas pela fundação e teme o que pode acontecer com os bloqueios anunciados pelo governo.
Há uma semana universidades do Brasil inteiro foram surpreendidas pela suspensão de bolsas, oferecidas pela Capes, que já estavam previstas no sistema. Sem qualquer aviso, o governo anunciou o bloqueio de 4.798 bolsas de pesquisa. Dias depois, liberou 1.324, mas manteve o recolhimento das restantes – 3.474. A medida deixou a comunidade acadêmica ainda mais apreensiva, já que antes um contingenciamento nas verbas de custeio das universidades federais tinha sido divulgado.
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“Pessoas que fizeram seleção e foram aprovadas dentro de editais prevendo bolsas, tiveram sua renda eliminada e a vida prejudicada sem qualquer explicação concreta. Assim, parece que não se quer mais pessoas capazes de produzir perguntas e buscar respostas, somente repetir afirmações. O governo e parte da sociedade estão exaltando e endeusando a ignorância, e isso tende a ser muito perigoso”, comenta.
Flávia destaca que, muitas vezes, a bolsa é a única fonte de renda para alunos que vêm de outros estados ou países para os cursos pós-graduação. Segundo ela, a incerteza sobre o que acontecerá tem causado uma piora nos quadros de ansiedade e depressão, por conta da angústia de “não se saber como será o dia de amanhã”. De acordo com a Capes, quem já tem as bolsas, como é o caso de Flávia, não corre o risco de perdê-las, porém, o corte atinge alunos que iniciariam os cursos.
Docente no Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal, a pós-doutoranda desenvolve pesquisas junto a orientandos e colaboradores nacionais e internacionais. Apreensiva com possíveis cortes no orçamento da Capes, coletou mais de 330 mil assinaturas em uma petição, criada ainda no ano passado. Agora, com o recolhimento das bolsas, se diz ainda mais preocupada com o futuro da Ciência no país.
“Eu enxergo como o início do fim da Ciência no Brasil. As bolsas são os salários dos pesquisadores. Quando o governo indica que não haverá mais bolsas, ele está dizendo para os estudantes de graduação que busquem qualquer alternativa de futuro que não a academia”, declara. “A longo prazo, [a medida] afeta a produtividade científica dos programas de pós-graduação e reduz a geração de conhecimento para o país como um todo e, inclusive, para o resto do mundo, já que existem muitas pesquisas inovadoras e de ponta sendo realizadas no Brasil”, completa.
A pós-doutoranda exemplifica, ainda, que em sua área, esse desincentivo à pesquisa pode representar perdas irreversíveis para a biodiversidade do planeta, “já que o Brasil está entre os países que possuem a maior riqueza de espécies, muitas delas existentes somente aqui”.