A incerteza do amanhã: bióloga teme futuro da Ciência no Brasil

Pós-doutoranda e pesquisadora pela UFRGS, Flávia Tirelli é autora de um abaixo-assinado, criado na Change.org, contra cortes na CAPES

Em parceria com Change.org (Oficial)
16/05/2019 13:55

“Lutar por maiores investimentos em educação e ciência é a base de qualquer sociedade que busque ser minimamente desenvolvida”, desabafa Flávia
“Lutar por maiores investimentos em educação e ciência é a base de qualquer sociedade que busque ser minimamente desenvolvida”, desabafa Flávia - Arquivo Pessoal

Ela se formou bióloga, mestre em Biologia Animal e doutora em Zoologia. Fez parte do doutorado na Inglaterra e hoje atua como pós-doutoranda na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde pesquisa sobre ecologia e conservação dos mamíferos terrestres. Criadora de um abaixo-assinado em defesa dos investimentos na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Flávia Tirelli lembra que sua especialização só foi possível graças às bolsas concedidas pela fundação e teme o que pode acontecer com os bloqueios anunciados pelo governo.

SOMOS TODOS #EDUCAÇÃOSIM

Há uma semana universidades do Brasil inteiro foram surpreendidas pela suspensão de bolsas, oferecidas pela Capes, que já estavam previstas no sistema. Sem qualquer aviso, o governo anunciou o bloqueio de 4.798 bolsas de pesquisa. Dias depois, liberou 1.324, mas manteve o recolhimento das restantes – 3.474. A medida deixou a comunidade acadêmica ainda mais apreensiva, já que antes um contingenciamento nas verbas de custeio das universidades federais tinha sido divulgado.

“Pessoas que fizeram seleção e foram aprovadas dentro de editais prevendo bolsas, tiveram sua renda eliminada e a vida prejudicada sem qualquer explicação concreta. Assim, parece que não se quer mais pessoas capazes de produzir perguntas e buscar respostas, somente repetir afirmações. O governo e parte da sociedade estão exaltando e endeusando a ignorância, e isso tende a ser muito perigoso”, comenta.

Flávia destaca que, muitas vezes, a bolsa é a única fonte de renda para alunos que vêm de outros estados ou países para os cursos pós-graduação. Segundo ela, a incerteza sobre o que acontecerá tem causado uma piora nos quadros de ansiedade e depressão, por conta da angústia de “não se saber como será o dia de amanhã”. De acordo com a Capes, quem já tem as bolsas, como é o caso de Flávia, não corre o risco de perdê-las, porém, o corte atinge alunos que iniciariam os cursos.

Docente no Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal, a pós-doutoranda desenvolve pesquisas junto a orientandos e colaboradores nacionais e internacionais. Apreensiva com possíveis cortes no orçamento da Capes, coletou mais de 330 mil assinaturas em uma petição, criada ainda no ano passado. Agora, com o recolhimento das bolsas, se diz ainda mais preocupada com o futuro da Ciência no país.

Outra preocupação de Flávia é com o risco do fechamento de universidades e institutos federais devido ao bloqueio de verbas de custeio
Outra preocupação de Flávia é com o risco do fechamento de universidades e institutos federais devido ao bloqueio de verbas de custeio - Arquivo Pessoal

“Eu enxergo como o início do fim da Ciência no Brasil. As bolsas são os salários dos pesquisadores. Quando o governo indica que não haverá mais bolsas, ele está dizendo para os estudantes de graduação que busquem qualquer alternativa de futuro que não a academia”, declara. “A longo prazo, [a medida] afeta a produtividade científica dos programas de pós-graduação e reduz a geração de conhecimento para o país como um todo e, inclusive, para o resto do mundo, já que existem muitas pesquisas inovadoras e de ponta sendo realizadas no Brasil”, completa.

A pós-doutoranda exemplifica, ainda, que em sua área, esse desincentivo à pesquisa pode representar perdas irreversíveis para a biodiversidade do planeta, “já que o Brasil está entre os países que possuem a maior riqueza de espécies, muitas delas existentes somente aqui”.