Em quais casos o aborto é permitido no Brasil?
Em 2019, o SUS registrou a média de cinco internações diárias de meninas entre 10 e 14 anos por motivo de aborto
Desde 1940, segundo o artigo 128 do Decreto Lei nº 2.848, o aborto pode ser realizado quando a gravidez é resultado de estupro ou quando põe em risco a vida da pessoa gestante. Mais de 80 anos depois, pouca coisa mudou no Brasil.
Há dez anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a gestação pode ser interrompida quando o feto é anencéfalo, uma malformação caracterizada pela ausência do cérebro.
Existem outros casos que são amparados pela jurisprudência e fundamentados nos riscos que a gravidez apresenta. Saiba mais sobre o tema:
O que é aborto
Aborto é definido como a interrupção da gestação, seja ele espontâneo, acidental ou induzido.
Acidental e natural
Abortos espontâneos e acidentais ocorrem, como o próprio nome indica, sem a intenção da interrupção da gestação.
O natural (espontâneo) costuma ocorrer no início da gravidez e pode acontecer por causas diversas, de alterações hormonais e uso de drogas a doenças autoimunes, virais e bacterianas. O acidental normalmente é resultado de acidentes domésticos e de trânsito.
Estes dois tipos, quando não se tem a vontade e o uso de métodos abortivos para cessar a gravidez, são os mais frequentes e comuns. Portanto, por serem frutos de fatalidade ou acaso, não são punido por lei.
Induzido
Aborto induzido se refere a interrupção da gestação intencional, por vontade da pessoa gestante. Salvo as condições liberadas pela Lei de 1940 -estupro e risco de morte- e pela má-formação e impossibilidade de sobrevivência, como na anencefalia, a prática é considerada crime no Brasil.
Neste mês, o juiz Marcelo Paulo Salgado, da 36ª Vara Cível de Belo Horizonte, autorizou a interrupção da gestação de um feto diagnosticado com a anomalia megabexiga. O feto tinha “alta probabilidade” de morrer dentro do útero ou “até mesmo nos primeiros dias de vida”.
Nesse caso, o juiz também considerou “o sofrimento psicológico a que estaria submetida a mãe e a inutilidade da exposição ao risco de vida ou de sequelas à sua saúde”. A decisão, portanto, se encaixa na determinação do STF de 2012.
O processo pode ser realizado por meio de medicamentos, normalmente até 12 semanas, curetagem ou de forma cirúrgica. Vale lembrar que o médico indica o melhor método para não promover sofrimento desnecessário ou risco à saúde.
Apesar da possibilidade legal, ninguém é obrigado a abortar. Mesmo em casos de violência sexual ou de fetos malformados sem possibilidade de sobrevivência, o aborto é uma escolha e, por crença ou ideologia, a gestação pode ser mantida.
O que diz o Código Penal
Aborto provocado pela gestante (Art. 124) – Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Detenção, de um a três anos.
Aborto provocado por terceiro (Art. 125) – Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Reclusão, de três a dez anos. (Art. 126) – Provocar aborto com o consentimento da gestante: Reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único: Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.
Forma qualificada (Art. 127) – As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.
Não se pune o aborto praticado por médico (Art. 128):
Aborto necessário
I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
Por ser ilegal, os dados no Brasil não são precisos. De acordo com informações divulgadas pelo próprio Ministério da Saúde, o aborto inseguro (realizado clandestinamente) causa a morte de uma mulher a cada 2 dias. Ressalta-se que há, devido a ilegalidade, subnotificação de casos.
Segundo a Pesquisa Nacional do Aborto, realizada pela Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, em 2016, as mulheres que abortam são em geral casadas, já têm filhos e declaram seguir uma fé cristã. Uma em cada cinco mulheres até 40 anos declara já ter abortado.