Crise climática: apesar de promessas, países deixam a desejar
A Cúpula de Ação Climática terminou sem grandes resultados
Quando o secretário geral da ONU, Antonio Gutierrez, convocou os países-membros das Nações Unidas, a sociedade civil organizada e o setor empresarial para se reunirem no último dia 23, em Nova York, para a Cúpula de Ação Climática (Climate Action Summit), solicitou uma lição de casa muito simples: “tragam planos concretos e realistas para em 2020 aumentar as ambições das metas sob o Acordo de Paris”.
Essa demanda vem respaldada por uma série de relatórios divulgados nos últimos anos, em que até os dados mais conservadores reforçam a urgência em ações para evitar os cenários mais trágicos da crise climática.
Em especial, o “Relatório 1,5”, do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado no final de 2018, que coloca para os tomadores de decisão um limite de tempo: temos apenas 12 anos para reduzir em 45% as emissões de gases do efeito estufa e alcançar em seguida emissões “zero” antes de 2050.
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Não alcançar essa meta é, entre outras coisas, aceitar que os impactos decorrentes dessa omissão serão responsáveis pela morte de milhares de pessoas, por migrações forçadas em massa, pela extinção de centenas de espécies, pelo desaparecimento de ecossistemas inteiros e pelo alagamento de grandes áreas costeiras.
Para que esse cenário não se torne real, todos os setores da economia global precisarão mudar radicalmente em um espaço de tempo muito curto, algo ambicioso, mas totalmente possível de ser feito considerando a tecnologia que já temos disponível. Para isso acontecer, entretanto, precisamos de muita vontade política e engajamento social.
Quanto ao engajamento, nunca antes na história vimos tanta mobilização pela agenda climática. Desde que as greves pelo clima comandadas por jovens tomaram o mundo, questionando a falta de maturidade dos “adultos” para levar os alertas científicos a sério, a discussão saiu da bolha ambientalista.
É nesse contexto que chegamos em Nova York para a Cúpula de Ação Climática: precisando de um movimento global de ambição e comprometimento orientado à transição econômica para modelos de baixo carbono. E, mais uma vez, entre todos os anos em que conferências para o clima são realizadas, não chegamos nem perto de onde precisamos chegar.
Apesar da abertura da Cúpula ter sido marcada por falas muito potentes não só do próprio Secretário Geral, mas também dos jovens ativistas Paloma Costa, Greta Thunberg e Anurag Saha Roy, por horas a fio a plenária principal da sede das Nações Unidas foi palco de belos discursos midiáticos que entre si reconheceram os dados e alarmes científicos, as mobilizações de jovens pelo mundo e a necessidade para maior comprometimento coletivo.
Mas, para além das belas palavras, em termos de ações reais muito pouco foi feito: China, Estados Unidos e Índia, que juntos respondem por 48,6% das emissões globais, não fizeram nenhum movimento novo. A União Europeia mantém uma certa consistência em ações pelo clima, mas continua muito longe considerando seu potencial em recursos e tecnologias.
O Brasil, grande protagonista histórico nesse espaço, quase passou despercebido pela comunidade internacional, não fosse pelos comentários do presidente francês, Emmanuel Macron, de que tratados comerciais (Como o do Mercosul — União Européia) devem ser vinculados ao Acordo de Paris e ao não desmatamento, reforçando que a política de estado ecocida e negacionista adotada pela sua atual gestão federal brasileira não vai passar pelo crivo internacional sem sanções.
Ao final do dia, 65 países se comprometeram em inserir maior ambição em suas metas para o Acordo de Paris até o ano que vem e 66 manifestaram intenções de alcançar a meta carbono “zero” até 2050. Dentro desses números a grande maioria é composta pelo grupo dos países menos desenvolvidos (aqueles que em geral são mais vulneráveis aos extremos climáticos e que historicamente emitiram uma parcela ínfima dos gases de efeito estufa que criaram essa crise).
Apesar de ser algum resultado, isso está muito além do que poderia e precisa ser feito. Como provocou a ativista brasileira Paloma Costa na cerimônia de abertura: “vocês vão parar de conversa e transformar as soluções em compromissos reais? Ou devemos esperar até o ano que vem quando nos reunirmos aqui novamente?”. Por enquanto, esperamos até o próximo ano dentro dos apenas 11 que temos, que logo vão ser 10, 9, 8 e continuam contando.
Enquanto cientistas alertam, jovens vão às ruas e milhares de pessoas na linha de frente dos extremos climáticos sofrem todos os dias o capitalismo globalizado resiste em encontrar soluções para a crise ambiental criada pela sua própria existência.
Ainda não temos as lideranças necessárias com coragem para questionar a manutenção desse mesmo sistema e as entregas da Cúpula da Ação Climática confirmam que outros caminhos fora dessa estrutura precisam ser construídos. Não fazer isso é assumir o risco cada vez mais próximo de acabarmos rumando para um futuro distópico onde humanos disputam suas vidas por água e gasolina.
Como afirmam em suas palavras de ordem os jovens nas greves pelo clima, o que falta para os nossos tomadores de decisão reconhecerem isso é apenas uma coisa: maturidade.
Por João Henrique, do @ciclimaticos