Em vídeo, mãe de Miguel diz que a impunidade não vai ocorrer
Nesta quinta (3), será a 1ª audiência de instrução do caso Miguel; Mirtes também tornou-se coautora de uma petição com quase 3 milhões de assinaturas
A trabalhadora doméstica Mirtes Renata de Souza, mãe de Miguel Otávio, tornou-se autora de um abaixo-assinado para cobrar justiça por seu filho. Ela também gravou um vídeo inédito para levantar o apelo das quase 3 milhões de pessoas que assinam a petição e exigem agilidade no processo judicial e a responsabilização de Sari Gaspar Corte Real. Nesta quinta-feira (3), data da primeira audiência de instrução do caso, haverá um ato pacífico.
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O abaixo-assinado abraçado por Mirtes foi aberto na plataforma Change.org _ um dia depois da morte de Miguel, que tinha 5 anos _ pela estudante Dani Brito, de 22 anos, que mora em Recife (PE). A mãe de Miguel se tornou coautora da petição com o objetivo de intensificar a pressão nas autoridades para uma conclusão rápida e isenta do caso, com a adoção das medidas criminais, cíveis e trabalhistas cabíveis, bem como para protestar contra os “injustificáveis meses de lentidão”.
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“A justiça do nosso país para os ricos é branda, para nós que somos negros, pobres, periféricos, ela é extremamente pesada. Se tem lei nesse país, tem que ser igual para todos. Eu estou nessa luta para que as leis desse país sirvam também para Sari Corte Real”, diz Mirtes. O desabafo consta de um vídeo inédito gravado pela trabalhadora doméstica para falar sobre o apelo dos milhões de brasileiros e brasileiras que se uniram a ela no abaixo-assinado.
“Às quase 3 milhões de pessoas que assinaram a petição online da Change.org, eu sou eternamente grata, de coração, por estarem comigo nessa luta. Eu não me sinto só, eu sei que tem quase 3 milhões de pessoas junto comigo. Conto com vocês para que continuem assinando e divulgando para que o Judiciário veja que não sou só eu que quero justiça por Miguel, mas vocês também querem”, afirma no depoimento. O vídeo pode ser conferido na íntegra nas redes sociais da organização.
Símbolo de protesto pela morte do menino, o abaixo-assinado _ disponível em aqui _ chegou à marca de 1 milhão de assinaturas em apenas um dia. Em 48 horas, já havia dobrado de tamanho. A petição é a maior já criada sobre um tema racial em toda a história da Change.org no Brasil, além de ser a segunda que mais engajou pessoas neste ano na plataforma, no país, atrás apenas de “Justiça Por Mari Ferrer”.
Audiência e protesto
Nesta quinta-feira (3), às 9 horas, a acusada Sari Corte Real e quase 20 testemunhas de defesa e de acusação vão prestar depoimento na primeira audiência de instrução para o julgamento, na 1ª Vara dos Crimes Contra Criança e Adolescente da Capital, em Recife.
No mesmo dia, um ato pacífico de protesto por justiça a Miguel está previsto para ocorrer em frente ao Centro Integrado da Criança e do Adolescente (Cica), prédio onde está localizada a 1ª Vara. A mãe de Miguel espera que o Poder Judiciário seja pressionado a dar mais atenção ao caso de seu filho e que a condenação e prisão de sua ex-patroa aconteçam.
“É uma dor que eu vou levar para o resto da vida, mas só que a impunidade não vai ocorrer porque Miguel tem mãe, e o meu nome é Mirtes Souza”, declara a trabalhadora doméstica no vídeo divulgado pela plataforma Change.org. “Justiça por Miguel”, clama ao final.
O ato é organizado pela Articulação Negra de Pernambuco, pelo Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (GAJOP) e pelo Instituto Menino Miguel, que vêm apoiando a luta de Mirtes e sua família ao longo do processo. Seguindo as recomendações sanitárias exigidas na pandemia, participarão familiares, amigos, artistas e representantes do movimento negro e de outros movimentos sociais e populares.
Relembre o caso
Miguel perdeu a vida depois de ter sido abandonado por Sari no elevador do prédio de luxo. Sozinho, saiu no 9º andar quando as portas do elevador se abriram, escalou uma grade de proteção e acabou caindo de uma altura de, aproximadamente, 35 metros. Detida pela Polícia Civil, a patroa pagou uma fiança de R$ 20 mil para obter liberdade provisória.
“Da mesma forma que as pessoas se sensibilizaram com o caso George Floyd, foram para as ruas, gritaram pedindo por justiça, pedindo o fim de toda essa violência, eu espero que elas também se sensibilizem com o caso de Miguel, porque era uma criança que morreu de uma forma trágica, uma criança que tinha muita coisa pela frente, muito futuro”, disse Mirtes à equipe da Change.org.
Além de esperar que as pessoas tomem o caso Miguel como um exemplo para que não volte a ocorrer com outras crianças, a mãe do garoto destaca a necessidade de mais empatia e amor pelo próximo. “O mundo de hoje está muito cruel, principalmente na questão do racismo, está muito escancarado, está de uma forma que, sinceramente, dá até medo viver nesse mundo porque tudo pode acontecer”, pondera a trabalhadora doméstica. “Mas a gente precisa levantar a cabeça, seguir em frente e lutar contra isso, lutar contra essa violência”, acrescentou a empregada doméstica.
O caso Miguel foi citado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como um exemplo de “racismo sistêmico” na pandemia. Essa denominação apareceu em um documento produzido pelo Grupo de Trabalho sobre Pessoas de Descendência Africana. Nas conclusões do grupo, certas populações, como as trabalhadoras domésticas, são vulneráveis na pandemia.