Inseminação artificial caseira se populariza no País; veja riscos
Procedimento de fertilização feito em casa traz riscos para a saúde e tem menos chances de dar certo
Frequentemente, o sonho de ter filhos é inibido pelo preço das inseminações artificiais, que, somado aos da medicação específica, de exames e do acompanhamento médico, torna essa realidade distante de muitas famílias brasileiras. A condição socioeconômica leva algumas pessoas a um procedimento caseiro. A inseminação caseira se dá de maneira intuitiva -e perigosa.
Um doador, muitas vezes encontrado por meio de redes sociais, faz a coleta do sêmen e o material é introduzido na pessoa que vai gestar. Isso ocorre por meio de seringa, cateter, pipetas e até objetos mais “rústicos”, como caneta ou funil.
“Além do uso de materiais não esterilizados e sem controle de segurança, não se tem a testagem para doenças sexualmente transmissíveis, como é exigido pelos órgãos regulamentadores”, diz a médica Thais Domingues, especialista em reprodução assistida da Huntington, em entrevista à Catraca Livre.
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Coletado em local adequado, qualquer material biológico é sempre testado antes de ser introduzido em um terceiro. Assim, apenas por meio de avaliação laboratorial, é possível saber se existem agentes infecciosos, como HIV, sífilis, hepatites B e C ou zika vírus. Outro fator é a contaminação por bactérias e fungos, comum quando a manipulação do material é feita sem um ambiente devidamente esterilizado.
Um banco de espermas atua sob fiscalização de agências de vigilância sanitária como a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Além disso, há uma triagem social dos doadores e a relação é controlada -o indivíduo que doa não se encontra com quem vai receber o sêmen.
Mas isso não é tudo: os materiais usados para a inserção também trazem risco para a saúde. Além da falta de esterilização e de segurança, existe a possibilidade de o objeto introduzido provocar algum ferimento interno.
“A introdução é feita de maneira caseira, sem profissional habilitado que possa ter visão direta do local a ser inserido o material. Isso pode provocar pequenos cortes, chamados de laceração, que causam sangramento, dor e risco de infecção”, esclarece Domingues.
A especialista lembra que existem diferentes procedimentos em prática hoje no Brasil. “A inseminação artificial e o coito programado são os procedimentos de baixa complexidade”, explica.
“Já a fertilização in vitro é o tratamento de alta complexidade para casais com maiores dificuldades. Qualquer um deles deve ser indicado e realizado por profissionais habilitados”, indica a médica. “Apenas um profissional habilitado e idôneo pode indicar o melhor tratamento a ser realizado, que nem sempre é a inseminação.”
O que diz a lei
Vale lembrar que a comercialização de material biológico humano é proibida em todo o Brasil, segundo o artigo 199, parágrafo 4º, da Constituição Federal de 1988.
“A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização.”
Para complementar, a Lei de Biossegurança (lei nº 11.105/2005) veta expressamente a comercialização de sangue e de seus derivados e componentes, bem como a de células-tronco embrionárias utilizadas para fins de pesquisa e terapia.
Portanto, se alguém cobrar para ser doador, denuncie.
Caso da suposta inseminação de Glória Trevi
Em 2001, o caso da cantora mexicana Glória Trevi, que estava detida no Brasil por rapto, violação e corrupção de menores, ficou famoso. Ela alegou ter engravidado na carceragem da Polícia Federal.
No primeiro momento, ela havia dito que fez inseminação artificial para engravidar. O doador seria o assaltante Marcelo Borelli. A dupla teria usado uma caneta BIC como pipeta e uma caixa de leite para transportar o sêmen de uma cela para outra.
Apesar de a cantora ter mudado a versão da gravidez, a forma de fertilização entrou no imaginário dos brasileiros. “É pouco provável que se obtenha sucesso [com esse procedimento]”, revela Domingues.
Posteriormente, Glória disse que tinha sido estuprada por policiais federais enquanto estava presa e engravidou. O escândalo quase gerou uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito).
Ela foi considerada inocente da acusação e liberada em 2004. Um exame de DNA revelou que o pai da criança era o empresário Sergio Andrade.