Loja da Zara em Fortaleza vigiava clientes negros e com roupas simples

Código “Zara zerou” em alto-falante anunciava cliente suspeito

Durante a investigação para apurar crime de racismo cometido contra a delegada Ana Paula Barroso, o delegado-geral da Polícia Civil do Ceará, Sérgio Pereira dos Santos, descobriu que o código “Zara zerou” era usado para indicar a presença de suspeitos em potencial dentro da loja.

Esses suspeitos eram, via de regra, pessoas negras com roupas simples. O anúncio era feito por meio de alto-falantes internos.

Loja da Zara em Fortaleza vigiava clientes negros e com roupas simples
Créditos: Reprodução/Polícia Civil
Loja da Zara em Fortaleza vigiava clientes negros e com roupas simples

Em um dos vídeos das câmeras de segurança, uma mulher entra na loja e é imediatamente abordada por um funcionário.

“Isso era um comando que era dado pra que todos os funcionários da loja ou pelo menos alguns a partir de então começassem a observar aquela pessoa não mais como consumidor, mas como suspeito em potencial que precisava ser mantido sob vigilância da loja”, disse Sérgio Pereira ao G1.

Em setembro, Ana Paula Barroso, que é negra e diretora-adjunta do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis, teve a entrada barrada na loja.

Em nota, a Zara alegou que a abordagem foi motivada causa de protocolos de medida sanitária e que “não tolera nenhum tipo de discriminação”.

Delegada na Zara

Ana Paula Barroso acusou a loja espanhola Zara por racismo após ser barrada em uma unidade da varejista, num dos principais shoppings de Fortaleza, no dia 14 de setembro.

Delegada acusa Zara de racismo após ser barrada em loja de Fortaleza
Créditos: Divulgação/Polícia Civil
Delegada acusa Zara de racismo após ser barrada em loja de Fortaleza

Ana Paula carregava uma sacola em uma mão e um sorvete na outra ao adentrar a loja. Logo em seguida foi surpreendida pelo gerente da Zara que a barrou alegando “normas de segurança”.

A delegada, então, perguntou se o problema era sua máscara de proteção contra o coronavírus estar no queixo, por ela estar tomando o sorvete. Segundo Ana Paula, a resposta que recebeu foi de que não poderia ficar na loja e foi conduzida à porta.

Ana Paula saiu da loja e ainda próxima a Zara perguntou para um segurança do shopping se baixar a máscara enquanto tomava um sorvete seria motivo para ser impedida de frequentar o estabelecimento. O funcionário lhe disse que não e chamou o chefe da segurança. A delegada foi reconhecida por ele, por já terem trabalhado juntos.

Juntos, a delegada e o chefe da segurança do shopping foram até a Zara falar com o gerente. “Ele perguntou ao funcionário o que havia acontecido, e ele foi logo dizendo que não tinha preconceito, que tinha amigos negros, gays e lésbicas”, disse a delegada Anna Claudia Nery da Silva, que investiga o caso como um provável ato racista. “Quando ele fala esta frase, já mostra que há um preconceito”, acrescenta.

Segundo depoimentos ouvidos por Anna Claudia Nery, o chefe de segurança fez a mediação, enquanto o gerente afirmou ter sido mal interpretado. O responsável por aquela loja da Zara pediu desculpas.

Como denunciar racismo

Casos como esses estão longe de serem raros no Brasil. Para que eles diminuam, é fundamental que o criminoso seja denunciado, já que racismo é crime previsto pela Lei 7.716/89. Muitas vezes não sabemos o que fazer diante de uma situação como essa, nem como denunciar, e o caso acaba passando batido.

Desde 1989, a Lei 7.716 define como crime a discriminação pela raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional
Créditos: iStock/@innovatedcaptures
Desde 1989, a Lei 7.716 define como crime a discriminação pela raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional

Para começar, é preciso entender que a legislação define como crime a discriminação pela raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, prevendo punição de 1 a 5 anos de prisão e multa aos infratores.

A denúncia pode ser feita tanto pela internet, quanto em delegacias comuns e nas que prestam serviços direcionados a crimes raciais, como as Delegacias de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), que funcionam em São Paulo e no Rio de Janeiro.