Paciente de médico diz que foi ‘amarrada’ e que ‘estava apodrecendo’
"Estava apodrecendo viva. A dor que eu senti não desejo para ninguém", disparou Amanda Araújo, outra paciente que processa Bolívar Guerrero por erro médico
Amanda de Sousa Araújo, de 36 anos, disse em um relato que foi “amarrada” na clínica do médico Bolívar Guerrero e que estava “apodrecendo de dentro pra fora” após procedimentos cirúrgicos malsucedidos feitos pelo cirurgião plástico. Guerrero está preso desde o último dia 18 de julho após ser acusado pela paciente Daiana Cavalcanti de mantê-la em cárcere privado dentro de um hospital particular no Rio de Janeiro.
A dona de casa, mais uma que processa o médico, foi operada na clínica do cirurgião em 2013, mas o resultado foi totalmente catastrófico, causando danos que culminou em dores que ela sente até os dias atuais. Além da questão estética de seu corpo, que assim como outras denunciantes, também passou a ter pontos de necrose devido a falta de apoio no pós-operatório.
A redução de mama que virou uma abdominoplastia
O ano era 2013, Amanda tinha acabado de completar 27 anos, era uma mulher insatisfeita com os seios pois os achavam muito grandes. Foi aí que ela conheceu o trabalho de Bolívar e resolveu que ia fazer a cirurgia de redução de mama na clínica dele.
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Ele havia sido indicado por uma amiga dela, e o fato de ter realizado cirurgia em uma cantora de funk famosa, a Perlla, fez ela confiar que aquele lugar que realizaria seus desejos, mas mal ela sabia que, na verdade, era o começo de uma história cheia de problemas.
“Muito simpático e solícito, já na primeira consulta indicou um lifting de coxa e uma abdominoplastia. Na hora fiquei preocupada, pois estava acima do peso, mas ele me tranquilizou e disse que havia feito algo parecido em outra artista famosa. Me senti segura ao ver fotos dela”, disse ela, em uma relato à revista Marie Claire.
Com ansiedade a mil devido a cirurgia, Amanda Araújo fez três procedimentos cirúrgicos em 18 de fevereiro de 2013, o que fez ela ficar 48 horas dentro do hospital.
“Quando cheguei em casa, meus familiares me alertaram para um roxo enorme acima dos pontos da barriga. Imediatamente liguei para ele, que disse serem apenas hematomas, ou seja, algo normal. Eu estava tão feliz por começar a alcançar o corpo que eu queria, que nem liguei para mais nada. Focava apenas na minha recuperação”, contou.
Depois de uma semana, ela voltou ao lugar para fazer uma revisão e notou que as manchas alertadas por pessoas da família apenas aumentavam, mas segundo ela, Bolívar insistia dizer que era “normal”.
“Na semana seguinte, em outra revisão, além das machas cada vez maiores, saía um líquido podre de mim. O cheiro era insuportável. O médico me disse que era seroma, um acúmulo de líquidos entre dois tecidos que foram descolados um do outro em procedimento cirúrgico, e voltou a dizer que estava tudo bem”, disse.
Pontos de necrose
“Dias depois, ele fez três buracos na minha barriga, disse que tinha um pontinho de necrose. Eu estava apodrecendo de dentro para fora e ele continuava insistindo que estava tudo normal”, falou ela no relato.
A perna começou a dar problema também pois o pontos também estavam abrindo. Então, ela resolveu retornar ao hospital para outra revisão pois estava com medo de “suturar” a coxa.
“Minha filha, na época, tinha quatro anos e nada consegue apagar da cabecinha dela o jeito que viu a mãe. Eu era casada e me separei logo depois da cirurgia, acho que nem meu ex-marido aguentava olhar para a deformação que se tornou o meu corpo. Mas não o culpo”, relata.
Em 19 de março, ela foi internada no Hospital Santa Branca e não pode mais sair. Com anemia grave e uma infecção quase generalizada, Amanda estava com grande risco de morrer.
“Me amarraram e começaram a cortar minha barriga. Ali tive uma crise nervosa e comecei a gritar, espernear”, relembra das cenas.
“Durante minha internação, Dr. Bolívar quis fazer uma sutura elástica e eu o questionei sobre o que era. De forma grosseira, ele jogou em mim uma folha impressa com informações do Google. Perguntado, confessou que nunca havia feito o procedimento antes. Não aceitei servir de cobaia. Uma pessoa da equipe dele levou uma especialista em feridas para ver meu caso e ela indicou usar outra pomada, que não a que ele usava, e o médico não aceitou. Por baixo dos panos, combinamos que eu compraria a pomada e usaríamos sem ele saber. Só assim as minha feridas começaram a sarar”, disse, depois de perceber que tinha sido operada em um lugar que não estava ajudando-a.
Para Amanda, ela viveu um “inferno” dentro do hospital. Ela considera que viveu um “verdadeiro martírio”.
“Precisei passar por uma transfusão de sangue, fazia muitos e muitos exames, incluindo um para descobrir o tipo de bactéria que eu tinha e saber se foi uma infecção hospitalar. Nunca tive acesso a nada. Ele nunca cedeu meu prontuário”, contou.
‘Entre a vida e a morte’
“Vivia dopada de remédios para dor. Foi um pesadelo. Fiquei internada entre a vida e a morte por quase quatro meses. Depois, em outro hospital, tive que fazer tratamento de oxigenação hiperbárica, que ajuda na cicatrização. Todos os dias, uma ambulância me buscava para me levar”, relatou sobre os dias de desespero.
“Hoje em dia, sei que ele alega mil coisas, porque adora colocar a culpa nas pacientes. As vítimas que morreram não estão mais aqui e não podem se defender, mas eu posso. Estava apodrecendo viva. A dor que eu senti não desejo para ninguém”, prosseguiu.
Ela ainda critica o grupo de apoiadoras do médico, as “Bolivetes” defendem e indicam ele para outros futuros pacientes. “Elas são fanáticas, brigam por ele. Como é uma roleta russa, algumas se dão bem, mas sempre fica algum erro. Conheço uma paciente que até que ficou sem umbigo”, falou.
Danos causados são sentidos até hoje
Segundo Amanda, depois de ficar “entre a vida e a morte”, as sequelas das cirurgias que não deram certo marcam sua vida até os dias atuais, pois ainda sente dores intensas na barrida e ainda precisa lidar com as cicatrizes que ficaram na sua virilha. Além de alegar ter dificuldades para andar, ela precisa fazer uso de analgésicos constantemente.
“Dr. Bolívar me deixou com sérios danos físicos e psicológicos que nem eu sei se um dia irão passar. Preciso ainda fazer uma perícia para analisar todos os danos causados por ele. Há quase um ano estou nessa e não consegui ainda fazer a perícia, pois não tenho mais dinheiro para pagar um perito particular. Antidepressivos, ansiolíticos, terapia, analgésicos é o que tomo constantemente. Só durmo à base de fortes remédios”, contou a mulher.
Processo judicial
Amanda de Sousa disse que até demorou para mover um processo contra o médico na Justiça, mas em 2015 ela decidiu iniciar o processo judicial, que segue tramitando atualmente. “Demorei também para desabafar nas minhas redes sociais. Simplesmente não conseguia, algo me travava. O medo não me deixava prosseguir”, disse.
“Ele tirou a minha vaidade, tirou tudo de mim. E nem falo só pela parte estética. Se me chamam para ir à praia, eu até vou, mas com um short de cintura alta que não apareça tanto a minha cicatriz. Mas é impossível não vê-la, pelo menos uma parte dela, já que meu umbigo ficou fora do lugar, bem acima do normal. É difícil falar sobre isso. Relatar tudo é reviver…Nenhum médico, até agora, aceitou fazer a correção da minha cirurgia por conta do alto risco”, desabafou em outra parte de seu relato.
“Quando vi na TV que ele foi preso por manter uma paciente por dois meses em cárcere privado no hospital, fiquei feliz. Já quando li que ele poderia sair da cadeia me senti atordoada. Decidi que não dá mais para ficar calada, não tem como aceitar isso. Hoje tenho um propósito: preciso conscientizar outras mulheres e salvá-las de viver o que eu vivi”, finalizou.