Parada LGBT é espaço para diversão e luta, ressalta organizadora
Para Claudia Regina, Parada do Orgulho LGBTQ+ representa expressão das reivindicações da comunidade
Há 50 anos, a resposta a um episódio de abuso policial ocorrido em um bar, em Nova York, deu início à rebelião de Stonewall abrindo caminho para a luta dos direitos LGBT em todo o mundo.
No próximo domingo, 23, Stonewall será tema da 23ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, que acontece a partir das 10h em frente ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), na avenida Paulista. A ideia, segundo os organizadores, é celebrar as conquistas e o orgulho de ser LGBTQI+.
A presidente da Associação da Parada do Orgulho LGBT (APOGLBT SP), Cláudia Regina, remonta à origem do Carnaval para desmistificar o julgamento por vezes pejorativo atribuído à Parada. “É engraçado porque costumam comparar até com o Carnaval. Mas é bom lembrar que o Carnaval também traz muitas questões, ele cutuca, mexe com a política. Começou como uma manifestação de protesto, dos negros, a única forma de começar a brincar, o batuque, a coisa que começou com o samba lá atrás, como expressão da liberdade. Então, vamos dizer que é praticamente a mesma coisa”, compara.
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Por que você não deve falar ‘Parada Gay’ e sim ‘Parada LGBT’
Para Claudia, a Parada é uma “expressão das nossas reivindicações e também da nossa luta”. “Brincando, a gente está colocando nossas bandeiras, está colocando nossa luta. Esta Parada, exatamente por ter essa manifestação, trazendo a história, vai ter um posicionamento diferente. Assim como já tivemos temas que mexeram com o debate nacional, seja falando de ano eleitoral, Estado laico, da importância do voto, e é na festa que fazemos isso”.
Criminalização
Em meio à onda conservadora que ganhou força, voz e voto nos últimos anos no Brasil, a parada acontece dias depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar que a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero seja considerado crime.
Para Cláudia, a decisão pode ser considerada uma importante vitória, mas não põe fim à luta por direitos. “Nós ainda somos resistência e a luta continua. Porque só criminalizar não resolve. Nós estamos enfrentando retrocessos de estrutura, o que é muito mais perverso. À medida que o governo tira investimento da saúde, tá afetando CRT’s [Centros de Referência e Treinamento destinados ao tratamento de DST’s e Aids], afeta a conta de medicamentos de alto custo para pacientes com HIV e Aids. Isso condena à morte.”
Ressalta também a importância da educação _ alvo de cortes do atual governo _ na construção de uma sociedade acolhedora e aberta às diferenças. “Se você tira investimento da educação, você destrói um espaço de construção da cidadania. Espaço onde se discutia a questão da diversidade, para preparar a juventude que tem outras orientações e como elas funcionam.”
E emenda: “No passado, conseguimos até conversar com as escolas, chegando a fazer palestras para alunos de ensino médio e fundamental _ que nada tinha a ver com essa história de kit gay. E de repente incluem o Estado policialesco dentro das salas de aula. Quer dizer, você criminaliza de um lado, mas cria agressores de outro. Porque vai ter gente atacando, achando que pode. Se você não tem investimento na política de segurança, não adianta. Assim como acontece na questão do racismo, que também é crime, e acontece. Não tem tantas prisões nem processos muito graves em relação a isso”.
Orgulho em números
Considerada a maior parada LGBT do mundo, cerca de 3 milhões de pessoas são esperadas pela organização no próximo domingo.
Com uma programação que reunirá artistas como a ex-Spice Girl Mel C, Iza, Luisa Sonza, Gloria Groove, Aretuza Love, Lexa e Mc Pocahontas, o evento deve movimentar aproximadamente R$ 288 milhões, de acordo com estimativa da Prefeitura de São Paulo. Empresas como Burger King, Amstel, Uber, Avon, Microsoft, Mercado Livre, Accor e Phillip Morris estão entre os patrocinadores.
Parada mambembe
Cenário inimaginável há 23 anos, quando mais ou menos 2.000 pessoas se reuniram na avenida Paulista pela primeira vez e caminharam até a praça Roosevelt, acompanhadas por um kombi do sindicato das costureiras e escoltada por anarcopunks que faziam a segurança. Era um sábado, 28 de junho de 1997.
“Apesar de não estar envolvida desde o começo, sei que naquele tempo não havia grana. O dinheiro era arrecadado com eventos, festas que o Grupo Somos realizava, era uma grande dificuldade. Hoje as empresas veem com outros olhos, que não são apenas ‘pink money’, a maioria está aceitando a luta. Inclusive, incrementando mudanças no seu quadro, contratando trans, atendendo às reivindicações da comunidade. Isso foi uma mudança e, lógico, conquistada pelas Paradas. Mas hoje possivelmente está mais fácil. Na primeira Parada, os anarcopunks foram os seguranças e usaram uma Kombi dos sindicatos das costureiras para tocar as músicas, uma coisa bem mambembe”, lembra Cláudia.