Programa ‘Tempo de Despertar’ reabilita homens denunciados por violência doméstica

Projeto realizado em Taboão da Serra contou com a participação de 26 denunciados

A cada 90 minutos uma mulher é assassinada no Brasil segundo pesquisas recentes sobre o tema. Os números representam uma média de 5.664 mortes por ano em um cenário de um Brasil quase não revelado.

Das estatísticas para o mundo real, um projeto realizado em Taboão da Serra, cidade da região metropolitana de São Paulo, usa o diálogo para refazer as contas desse saldo negativo com o projeto “Tempo de Despertar”, idealizado pela promotora de justiça, Maria Gabriela Manssur.

Voltado aos homens agressores, o programa acontece a cada 15 dias com o objetivo de debater o machismo, desrespeito às mulheres, a Lei Maria da Penha e os direitos nela previstos.

Além de propor uma reflexão sobre a violência dos agressores, o projeto busca entender o que há por trás da vida de cada participante, os dramas cotidianos e histórico familiar deles. Ao final do curso, o objetivo é promover uma eventual inserção deles no mercado de trabalho, cursos de alfabetização, profissionalização, acompanhamento psicológico, psiquiátrico e tratamento de drogas e álcool.

Coração aberto ao diálogo 

Autora do projeto e coordenadora do Núcleo de Combate à Violência Doméstica, Gabriela ressalta que o trabalho com os agressores é uma parte importante no enfrentamento à violência contra a mulher. A promotora acredita que projeto pode mudar o comportamento dos homens, diminuindo o índice de reincidência. “No começo eu mesma tinha um pouco de receio sobre como seria a reação deles. Por outro lado, nunca encontramos nenhum tipo de problema e a aquele resistência inicial por parte de alguns deu lugar à boa convivência nas reuniões. No final todos se tornaram grandes amigos em um espaço de aprendizado e solidariedade”, explica.

Uma nova vida

Na última terça-feira, 25 de novembro, o Catraca Livre conferiu a formação do grupo de 26 homens que respondem à justiça por algum tipo de acusação. Agora, inicia-se uma nova etapa, onde os participantes, autores de violência contra a mulher com inquéritos ou processos em curso (selecionados pelo Ministério Público e Judiciário), terão acompanhamento por mais seis meses para avaliar a efetividade dos encontros.

“Estava passando por uma fase muito difícil na minha vida e o programa me ajudou a tentar corrigir, repensar as atitudes. Mudar meu comportamento, ser uma nova pessoa e ter a chance de recomeçar ao lado de uma nova companheira. Saber educar meus filhos.  Todos os erros que cometi tiveram a ver com falta de preparo, histórico de violência na infância, na família; hoje quero mudar tudo isso”. – Dias

“Você aprende a enxergar a fragilidade da mulher, interpretá-la melhor e analisar com mais cautela. Tudo isso vai ser fundamental para servir de aprendizado pro meu comportamento. Antes eu era muito impulsivo, minha defesa era o ataque. Hoje minha arma é diálogo, a compreensão. Quero ser multiplicador de tudo que aqui aprendi”. – Valentim. 

“Não estou aqui para dizer quem é certo ou errado, o importante é se conscientizar. Esse período me fez pensar. A vida é curta, a gente precisa levar dela, aproveitar a oportunidade de recomeçar. Não somos bandidos, temos uma vida inteira pela frente. Para quem tem filhos também é uma chance de se desculpar, se reparar com a família para que isso jamais se repita. Que se tenha mais respeito pelas mulheres, principalmente”. – Fonseca. 

Veja como denunciar a violência doméstica

No Brasil há um número específico para receber esse tipo de denúncia,180, a Central de Atendimento à Mulher. O serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias do ano e a ligação é gratuita. Há atendentes capacitados em questões de gênero, políticas públicas para as mulheres, nas orientações sobre o enfrentamento à violência e, principalmente, na forma de receber a denúncia e acolher as mulheres.

O Conselho Nacional de Justiça do Brasil recomenda ainda que as mulheres que sofram algum tipo de violência procurem uma delegacia, de preferência as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM), também chamadas de Delegacias da Mulher. Há também os serviços que funcionam em hospitais e universidades e que oferecem atendimento médico, assistência psicossocial e orientação jurídica.

A mulher que sofreu violência pode ainda procurar ajuda nas Defensorias Públicas e Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, nos Conselhos Estaduais dos Direitos das Mulheres e nos centros de referência de atendimento a mulheres.

Se for registrar a ocorrência na delegacia, é importante contar tudo em detalhes e levar testemunhas, se houver, ou indicar o nome e endereço delas. Se a mulher achar que a sua vida ou a de seus familiares (filhos, pais etc.) está em risco, ela pode também procurar ajuda em serviços que mantêm casas-abrigo, que são moradias em local secreto onde a mulher e os filhos podem ficar afastados do agressor.