Vivemos em emergência climática e ouvir a juventude é o caminho
O potencial de mobilização dos jovens é um combustível extra que precisa ser agregado ao movimento climático
É comum escutar dos mais velhos e até mesmo de grandes lideranças que os jovens são a esperança do amanhã, que são o futuro, mas, recentemente, a juventude tem mostrado com ações que o tempo verbal que a representa é o presente. Para atrair holofotes e pressionar os tomadores de decisão na causa climática o movimento da juventude Fridays For Future (sextas pelo futuro, em tradução literal) tem protagonizado mobilizações ao redor do mundo.
Ocorreram greves pelo clima no Brasil, em mais de 65 cidades, e, nos dias 20 e 27 de setembro, o movimento explodiu globalmente. Em muitas das mobilizações no país foram relatados conflitos intergeracionais, especialmente porque, dessa vez, os jovens fizeram um chamado para que todos se unissem. Muitos dos ativistas climáticos do movimento tiveram suas ideias ignoradas em prol da experiência “dinossaurica” do ambientalismo brasileiro, que ainda não tem como pauta primária a crise climática.
No Rio de Janeiro, a experiência causou inquietação nos jovens. “O diálogo precisa ser horizontal, a experiência dos mais velhos conta, mas a energia da indignação da juventude perante essa realidade insustentável é a força motriz para a transformação”, conta Larissa Franco, jovem carioca de 22 anos, do Fridays For Future.
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“Enxergo a colaboração como uma estratégia muito importante, uma vez que juntamos a energia e vontade de mudança dos jovens com a experiência dos adultos. Porém um ponto ainda muito negativo é a dificuldade de uma parte dos adultos quanto ao entendimento do protagonismo jovem no ativismo climático”, declara Thamyres Freitas, bióloga e ativista de 23 anos também do movimento Fridays For Future.
Esse conflito não é novidade. Sempre que os jovens se posicionam e agem para incidir em políticas e processos de tomada de decisão, costumam ser descredibilizados e só são vistos de forma justa quando geram algum resultado imediato. Quando ganham notoriedade, muitas vezes, são desvalidados e colocados como se fossem meros figurantes da própria causa — na tentativa de trazer uma falsa representatividade.
Amanda Segnini, co-fundadora do Engajamundo, conta um pouco como foi driblar estes conflitos quando, em 2012, resolveu, junto a outros 5 ativistas, fundar uma organização que pudesse levar os jovens para espaços de poder: “Criamos o Engaja logo depois que saímos da faculdade. Pra ganhar os espaços de confiança sobre o que a gente estava fazendo e falando levou muito tempo. Batemos em muitas portas, principalmente para conseguir financiamento. Levamos muitos ‘nãos’, porque éramos jovens e não acreditavam que sabíamos o que estávamos fazendo”, diz. Hoje é visto que não existe uma organização no Brasil que articule juventudes tão distintas como o Engajamundo faz.
Na visão de especialistas, a juventude tem um papel muito importante no movimento climático e faz severas considerações. Segundo Iago Hairon, cientista social e diretor executivo do Engajamundo, é pela visão dos jovens que a solução climática vai ocorrer. “A gente vai precisar de todo mundo pra fazer uma mudança sistêmica. Mas o que a gente tá falando é que é pela lente dos jovens que a mudança virá. Por questões sociológicas, os jovens são um potencial. Isso não significa que estamos excluindo outras pessoas, estamos só focando em um grupo.”
Carlos Rittl, biólogo e diretor executivo do Observatório do Clima, elogia a juventude ativista pelo clima. “Os jovens têm criado entre si cidadania climática, ajudando outros jovens a entenderem qual é o seu papel no mundo. Quando vão em busca de atuar em relação aos grandes processos globais de negociação, de pressão a melhores políticas públicas que tratem de clima ou da responsabilidade que a emergência climática exige, como também na solução delas.”
“Os jovens estão trazendo um sentido de urgência e energia que os adultos não estavam colocando pela causa. É um super desafio pro planeta inteiro e a gente tem mais que agradecer que os jovens estejam se movendo”, conta Mariana Menezes, que é mãe de três filhos e ativista do movimento Parents for Future (no Brasil conhecido como famílias pelo clima).
Os jovens ativistas pelo clima trazem uma mudança de cenário na luta pelo meio ambiente. O ativismo jovem tem carregando o que o país precisa para enfrentar a crise climática: coragem e inovação. Neste período em que se vive tantos desmontes identificados globalmente como um desafio à crise climática, cabe aos adultos entenderem que é preciso inovar também e ouvir atentamente a forma que a juventude compreende e interage com o mundo.
A professora e pesquisadora Regina Novaes diz que “a juventude é como um espelho retrovisor que reflete e revela a sociedade”. Se é com eles que está o protagonismo e a solução do maior desafio da história da humanidade, por que não praticar mais o exercício de abraçar o novo e o diverso, dando mais abertura para a possibilidade de uma “sociedade solução” e menos competitiva como a conhecemos?
Os modelos de desenvolvimento atuais se mostram cada vez mais falhos no enfrentamento da crise climática, por que não ouvir a quem tem abdicado das suas infâncias e adolescências pra ir pras ruas sugerir mudanças? Reconhecer as falhas é preciso, inovar para ir adiante é uma urgência.
Por Nayara Almeida