Caso de homofobia na infância nos ajuda a entender Carlinhos Maia
OPINIÃO: Humorista deu um triste relato de violência, e isso me fez refletir sobre as declarações homofóbicas que ele mesmo já deu
O que vou falar aqui é bem polêmico e vai me render muitas críticas, não tenho dúvida. Eu mesmo me posicionei contra Carlinhos Maia por diversas vezes, justamente por ele ser uma pessoa pública que simplesmente não se assume gay por inteiro, e não usa seu poder de influenciador digital para levantar bandeiras da causa LGBTQI+.
Quem não se lembra quando Carlinhos disse que seu casamento com Lucas Guimarães não seria um “casamento gay”, sob pretexto de que rótulos causariam apenas mais preconceito? “Não é casamento gay, é a união de Carlinhos e Lucas”, disse o digital influencer.
Ele também já disse que é “um gay que gosta de ser homem”, já criticou a imaginária “ditadura gay“, e não beijou o próprio marido durante o casamento.
Bom, tudo isso me deixava revoltado. Um cara tão influente, tão querido pelo público, não usar sua própria condição para ajudar a causa LGBTQI+, e pelo contrário, destilar ainda mais ignorância e preconceito sobre o tema. Isso não me entrava na cabeça.
Mas uma série de Stories publicados por ele no Instagram na noite desta terça-feira, 28, me fez refletir e repensar minha opinião sobre a postura dele dentro da comunidade.
Carlinhos contou sobre um episódio terrível de violência na infância. Quando tinha apenas 12 anos de idade, ele e a mãe foram a uma procissão da Igreja Católica na cidade onde morava. A mãe, que não escuta direito, seguia em frente, e virou alvo de agressores que resolveram tacar pedras em direção a ela, enquanto gritavam que seu filho [o Carlinhos] era “viadinho”.
Vendo que a mãe não tinha se dado conta das pedras, Carlinhos se posicionou em frente a ela, tentando protegê-la. Todas as pedras o acertaram, e o humorista chegou em casa ensanguentado. Ele havia escondido essa história da mãe até a publicação dos Stories, e disse, na época, que havia caído no chão.
No relato, Carlinhos conta que, desde aquele dia, prometeu a si mesmo que iria suportar todas as pedras que a vida lhe mandasse para proteger a família. “Desde aquele dia, eu sempre ia ser linha de frente para tudo que fizessem comigo, mas não atingiria nunca mais um deles. Desde aquele dia, eu cresci com isso na cabeça, de que eu seria muito forte, e nada mais iria me derrubar”, contou.
Esse foi o caso mais grave de homofobia do qual Carlinhos foi vítima. E isso nos requer uma reflexão sobre a falta de posicionamento dele com relação à causa LGBTQI+.
Assumir-se homossexual diante de uma sociedade tão conservadora e retrógrada quanto a nossa é um ato de coragem, é desprender-se das amarras e constrangimentos do passado. É mostrar aos outros a sua verdade e receber as duras pedras que o preconceito arremessa.
Mas Carlinhos já recebeu pedras demais. Não só no sentido figurado. Ao rejeitar o título de “casal gay”, por exemplo, Carlinhos tenta se proteger, novamente, das pedras do passado.
Não estou aqui tentando defendê-lo e dizendo que a atitude dele é correta. Mas é coerente com seu histórico de violência.
Agora, com mais informação e maturidade, chega a hora em que é necessário dar um basta nisso. Carlinhos tem mais de 15 milhões de seguidores só no Instagram. Quantos deles são LGBTQI+ e bastaria apenas um empurrãozinho, uma inspiração para poderem viver livremente?
Além disso, as pedras já foram arremessadas e já atingiram Carlinhos em cheio. O que mais temer se tudo já está posto à mesa? Todos sabem da homossexualidade, do casamento com Lucas Guimarães e, agora, do que ele sofreu por ser quem é.
Com seu poder de influência, com seu jeito alegre de ser, com seu espírito destemido, o humorista pode ajudar muitos outros da comunidade LGBTQI+.
Ao assumir-se inteiramente gay, ao levantar a bandeira do arco-íris, ao posicionar-se contra o preconceito, muitos outros também o farão. Carlinhos tem o poder de evitar com que mais pedras acertem outras pessoas, basta ele deixar as pedras que o acertaram no lugar onde merecem ficar: no passado.