Historiadora que criticou Beyoncé se desculpa e culpa Folha por título

“Penso que a Folha de S Paulo deveria assumir sua responsabilidade, também, pois é de sua editoria o título", afirmou Lilia Moritz Schwarcz

A historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, especialista em ‘escravidão’ pediu desculpa pelo artigo “Beyoncé erra ao glamorizar negritude com estampa de oncinha” sobre o filme de Beyoncé , ‘Black is King‘ e culpou a Folha de S. Paulo pelo título após repercussão negativa do caso.

Historiadora que criticou Beyoncé se desculpa e culpa Folha por título
Créditos: Reprodução/Instagram e Youtube
Historiadora que criticou Beyoncé se desculpa e culpa Folha por título

O artigo também falava que “diva pop precisa entender que a luta antirracista não se faz só com pompa, artifício hollywoodiano, brilho e cristal”. Entretanto, nesta terça-feira (04), ela publicou um texto no Instagram, reconhecendo seu erro.

“Passei as última 48 horas praticando a escuta. Conversei com pessoas amigas e críticas, e rascunhei essa mensagem inúmeras vezes. Não deveria ter aceito o convite da Folha, a despeito de apreciar muito o trabalho de Beyoncé; seria melhor uma analista ou um analista negro estudiosos dos temas e questões que a cantora e o filme abordam. Ao aceitar, não deveria ter concordado com o prazo curto que atropela a reflexão mais sedimentada. Deveria também ter passado o artigo para colegas opinarem. Não ter dúvidas é ato de soberba. Também não deveria ter escrito aquele final; era irônico e aprendi que é melhor dizer, com respeito, do que insinuar”, escreveu.

Ela admitiu seu erro: “Errei e peço desculpas aos feminismos negros e aos movimentos negros com os quais desenvolvi, julgo eu, uma relação como aliada da causa antirracista. Assumo a minha responsabilidade pelo artigo e não pretendo vencer qualquer discussão. Quando uma situação dessas se monta, todos perdem; tenho consciência”, publicou.

Para finalizar, a antropóloga disse que a Folha de S Paulo tem culpa: “Penso que a Folha de S Paulo deveria assumir sua responsabilidade, também, pois é de sua editoria o título e o subtítulo que não usam minhas palavras. Não falo em ‘erro’, tampouco que Beyoncé ‘precisa entender’ ou que usa ‘artifício holliwodyanno’ no meu artigo. Agradeço, assim, aos que fizeram críticas construtivas, sigo aprendendo com elas”, concluiu.

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Passei as última 48 horas praticando a escuta. Conversei com pessoas amigas e críticas, e rascunhei essa mensagem inúmeras vezes. Não deveria ter aceito o convite da Folha, a despeito de apreciar muito o trabalho de Beyoncé; seria melhor uma analista ou um analista negro estudiosos dos temas e questões que a cantora e o filme abordam. Ao aceitar, não deveria ter concordado com o prazo curto que atropela a reflexão mais sedimentada. Deveria também ter passado o artigo para colegas opinarem. Não ter dúvidas é ato de soberba. Também não deveria ter escrito aquele final; era irônico e aprendi que é melhor dizer, com respeito, do que insinuar. A primeira parte do artigo eleva a obra de Beyoncé, o que não é favor algum: trata-se de uma celebração da experiência negra realizada por uma das maiores artistas do nosso tempo. Apesar da minha carreira na área, não se está imune à dimensão do racismo estrutural e da branquitude. Errei e peço desculpas aos feminismos negros e aos movimentos negros com os quais desenvolvi, julgo eu, uma relação como aliada da causa antirracista. Assumo a minha responsabilidade pelo artigo e não pretendo vencer qualquer discussão. Quando uma situação dessas se monta, todos perdem; tenho consciência. Penso que a Folha de S Paulo deveria assumir sua responsabilidade, também, pois é de sua editoria o título e o subtítulo que não usam minhas palavras. Não falo em “erro”, tampouco que Beyoncé “precisa entender” ou que usa “artifício holliwodyanno” no meu artigo. Agradeço, assim, aos que fizeram críticas construtivas, sigo aprendendo com elas.

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A historiadora recebeu duras críticas por seu artigo publicado na Folha de S.Paulo.

“Quem precisa entender sou eu. Eu preciso entender que privilégio é esse que te faz pensar que você tem alguma autoridade para ensinar uma mulher negra como ela deve ou não falar sobre o seu povo. Se eu fosse você (valeu Deus), estaria com vergonha agora. Melhore!”, disparou a cantora Iza, defendendo Beyoncé.

O ator Ícaro Silva. “Você é uma grande, grande vergonha. Não somente para o Brasil e para o povo preto, mas para todos os povos aqui presentes. Não vejo por onde defender seu declarado racismo, sua arrogância branca elitista em se dar o direito não somente de reduzir uma obra prima ao nicho ‘antirracista’, mas em acreditar que tem conhecimento antropológico sobre África”, reiterou.

“Obviamente não tem, ou não teria reduzido a pele de um bicho sagrado à estampa que peruas de sua classe insistiram em apropriar em sua cafonice colonialista. Profunda vergonha, profundo constrangimento em ser contemporâneo dessa pessoa. Nos deixe em paz, nenhuma obra nossa estará sequer perto de sua reduzida compreensão”, escreveu Ícaro Silva.

A jornalista, humorista e ativista Maíra Azevedo, mais conhecida por Tia Ma, também criticou a historiadora pelo artigo sobre o filme de Beyoncé. “O erro é uma mulher branca acreditar que pode dizer a uma mulher preta, como ela deve contar a história e narrar a sua ancestralidade. A branquitude acostumou a ter a negritude como objeto de estudo e segue crendo que pode nos dizer o que falar sobre nossas narrativas e trajetórias. Lilia é uma historiadora, pesquisa sobre escravidão, mas está longe de sentir na pele o que é ser uma mulher preta”, ressaltou.

“Enquanto todas as pessoas negras se emocionam, se reconhecem e se identificam, a branca aliada diz que Beyoncé deixa a desejar! É isso! No final, [somos] nós por nós e falando por nós! Como diz um provérbio africano: ‘enquanto os leões não contarem suas próprias histórias, os caçadores seguirão sendo vistos como heróis’. E aqui, quando a gente conta, dramatiza e sonoriza, querem apontar o roteiro! Parem! Estamos no comando das nossas narrativas!”, salientou.

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O erro é uma mulher branca acreditar que pode dizer a uma mulher preta como ela pode contar a história e narrar a sua ancestralidade. A branquitude acostumou a ter a negritude como objeto de estudo e segue crendo que pode nos dizer o que falar sobre nossas narrativas e trajetórias. Lilia é uma historiadora, pesquisa sobre escravidão,?mas está longe de sentir na pele o que é ser uma mulher preta. @beyonce do alto da sua realeza no mundo pop nunca deixar de ser negra, mesmo sentada no trono em sua sala de estar. A branquitude segue acreditando que pode nos ensinar a contar nossa própria história. Enquanto todas as pessoas negras se emocionam, se reconhecem e se identificam, a branca aliada diz que #beyonce deixa a desejar! É isso! No final nós por nós e falando por nós! Como diz um provérbio africano: “enquanto os leões não contarem suas próprias histórias, os caçadores seguirão sendo vistos como heróis”… E aqui, quando a gente conta, dramatiza e sonoriza querem apontar o roteiro! Parem! Estamos no comando das nossas narrativas! #povopreto #amor #raizes #ancestralidade #blackisking #bey #beyoncè

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