Marco Pigossi relata o medo de um ‘galã da Globo’ se assumir gay
O ator disse que seu maior medo era as pessoas descobrirem sua sexualidade e isso ser a derrocada de sua carreira
Marco Pigossi concedeu entrevista para revista Piauí revelando detalhes de como foi difícil o processo de um “galã da Globo” se assumir gay. Com 32 anos, o ator falou sobre o início da carreira, a relação com o pai bolsonarista, as fugas dos holofotes para que não descobrissem sua sexualidade e também da nova fase da sua vida após anunciar para o mundo que está em um relacionamento sério com o cineasta italiano Marco Calvani.
Atualmente vivendo em Los Angeles, nos Estados Unidos, junto com o namorado, ele contou que morou por oito anos com antigo companheiro e que se distanciou do pai, Oswaldo Pigossi, eleitor de Jair Bolsonaro, depois das eleições presidenciais em 2018.
Marco começa o texto falando que não tinha referências gays em sua casa e que achava que sua orientação era ia “passar”. “Eu não tinha referência alguma no meu convívio e, quando assistia à televisão, nada servia como alento. Nas novelas ou nos programas de humor, quase sempre os gays eram retratados de forma caricata, pejorativa. Então, me sentindo solitário e sem amparo, me restava torcer para que fosse apenas uma fase”, explicou ele.
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Papéis de galãs para despistar qualquer suspeita sobre sexualidade
Pigossi relembrou de seu icônico personagem em “Caras & Bocas”, de 2009, em que fazia um gay afeminado.
“Na minha cabeça, não havia nenhuma margem de chance para eu me assumir. Se fizesse isso, todas as portas se fechariam para mim de forma automática (…) Essa possibilidade me aterrorizava”, disse ele, que na época, fazia terapia durante a trama três vezes por semana para aprender lidar com os sentimentos.
Ele ainda afirmou que por ter uma “aparência heteronormativa”, ele foi convidado para vários papéis de galãs e no fim ficou preso no estereótipo de mocinho.
“Estava infeliz por dentro. Seguia me escondendo. Na verdade, eu me fazia passar por um heterossexual por pura e simples manifestação de medo”, desabafou.
“Em 2010, o ano em que emendei Caras & Bocas direto para a novela Ti Ti Ti, li uma entrevista do Silvio de Abreu, autor de telenovelas e então diretor de dramaturgia da Globo, na Folha de S.Paulo. Ele dizia que um ator assumido era um ‘bobo’, pois a revelação fatalmente prejudicaria sua carreira”, contou.
Crise de pânico com as especulações de romance com Rodrigo Simas
Pigossi ainda revelou que, em seus doze anos de vida pública, teve um relacionamento com um homem que durou oito anos. Eles moravam na mesma casa e tentavam esconder a relação de qualquer forma. Em 2012, o nome dele estava envolvido em uma fake news sobre um suposto “lance” com um ator da novela que fazia naquela época – Fina Estampa. Os sites de fofoca falavam que ele vivia um romance com ator Rodrigo Simas.
“Era mentira absoluta. A matéria não dava os nossos nomes, mas deixava claro de quem se tratava. Chegava a dizer que nós nos ‘pegávamos’ nos bastidores das gravações. Era tudo invenção, mas as pessoas acreditam no que querem acreditar (…)”, falou o ator, que leu a notícia assim que chegou de viagem.
“Então, tive uma crise de pânico, comecei a tremer e suar. Fui para o banheiro do aeroporto, me tranquei em uma cabine e comecei a vomitar. Liguei para meu parceiro, chorando. Eu dizia para mim mesmo que minha carreira tinha acabado. Não conseguia sair dali. Meu companheiro teve que pegar um voo de São Paulo ao Rio para me buscar”, explicou.
Terapia de um lado, pai bolsonarista de outro
A terapia era a ajuda que Pigossi precisava para se aceitar e, como ele disse, outras coisas começaram “a tomar outra forma na minha cabeça”.
“E então vieram a candidatura e a eleição de Jair Bolsonaro em 2018. Meu pai (Oswaldo Pigossi) votou em Bolsonaro. Durante os oito anos do meu namoro com um homem, minha família sempre soube. Mas meu namorado e eu nunca jantamos com meu pai, que jamais perguntou sobre meu relacionamento”, desabafou.
“Minha vida amorosa era um não assunto. E, quando meu pai votou em Bolsonaro, senti uma dor profunda, uma tristeza profunda (…) Meu pai e eu ficamos sem nos falar durante o ano da eleição – e até hoje temos contatos apenas esporádicos. O abismo, que já era grande, tornou-se ainda maior”, disse.
A saída da Globo e o início de ser quem realmente é
Pigossi falou que a decisão de não renovar com a Globo também fazia parte do processo de assumir homossexual, o que ele acreditava que seria menos doloroso. Morando no exterior, ele começou a fazer outros tipos de trabalhos, como a série australiana “Tideslands” e da Espanha, “Alto Mar”.
O artista fez questão de dizer que está apaixonado por Marco Calvani e relatou como foi o momento em que decidiu que ia se assumir nas redes sociais.
“Eu topei, mas senti uma certa apreensão. Qual seria a reação das pessoas? (…) Postei e fiquei com um frio na barriga. (…) Recebi mais parabéns do que no dia do meu aniversário”, relembrou.
“Foi uma libertação. Uma festa. Nada como viver às claras, ser o que se é em privado e em público. Talvez os futuros galãs não sintam o mesmo medo que eu senti de perder minha carreira. Bolsonaro trouxe uma onda de ódio inacreditável, mas o efeito colateral foi fortalecer todos nós, gays. Naquele feriado, as respostas foram um alento imenso, o acolhimento de um mundo inteiro. Marco e eu convidamos uns amigos para comemorar. Tomei um porre. E hoje me sinto invencível”, finalizou.