Saiba diferenciar tipos de ensino e acerte na escolha da escola
Educação é uma das bases primordiais na vida de uma criança. O direito à educação é previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e é essencial para o pleno desenvolvimento infantil.
Na hora de matricular um filho em uma escola, muitos pais passam por diversas dúvidas, principalmente em relação ao estilo de ensino que querem para a criança ou adolescente. Isto porque o ensino tradicional não é mais o único a ser cogitado e procurado nos dias de hoje, já que diversas linhas pedagógicas têm chamado cada vez mais a atenção das famílias.
Métodos alternativos de ensino vêm sendo mais descobertos desde os anos 1960 e inseridos em escolas mundiais com mais relevância a partir do final da década de 70 e início da de 80. Com propostas modernas, ensinos baseados em pedagogias construtivista, democrática, Waldorf, Montessori ou Pikler, por exemplo, priorizam o estímulo aos talentos pessoais, as artes, o contato com a natureza e o lado emocional dos alunos.
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Segundo Luciana Barros de Almeida, presidente do Conselho Nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia, as novas linhas pedagógicas que se instalaram no Brasil aumentaram as possibilidades de enriquecimento das metodologias de ensino. “Entendemos que em educação não há um único caminho para a aprendizagem, o melhor caminho é aquele que dá certo para cada um”, diz.
De acordo com Luciana, o constante aumento da procura por ensinos alternativos se deve à necessidade de inovação, de experimentar o diferente e identificar o que não está dando certo. “Em educação é saudável que o novo apareça e que possamos experimentá-lo, pois assim avançamos e promovemos a mudança necessária para seguirmos aprendendo”, explica.
Mas, como diferenciar todas as metodologias de ensino? Qual linha pedagógica é indicada para cada criança? Existe algum perfil de identificação para que um aluno estude em uma determinada escola?
Saber escolher a metodologia adequada à personalidade do filho é o primeiro passo que pais devem tomar para uma vida escolar eficaz, já que o rendimento do aluno pode estar relacionado ao seu perfil perante a pedagogia seguida pela instituição.
Uma criança ou um jovem que estuda em um local com abordagem diferente ao seu comportamento pode vir a ter falta de interesse ou de atenção e mau rendimento escolar, além de problemas emocionais.
Escola Tradicional
As escolas tradicionais surgiram na Europa do século XVIII e seguem um modelo de ensino e avaliação padronizados. Elas possuem foco no aprendizado voltado para a competitividade de vestibulares, por exemplo, e representam para os pais uma esperança de sucesso no futuro dos filhos.
O ensino tradicional se baseia na tradição conteudista centrada no professor – que transmite o conhecimento ao aluno – e acredita que, para formar um estudante crítico e questionador, é necessário se ter uma base sólida de informação.
Porém, pela grande exigência por um alto desempenho dos alunos – que começa ainda na primeira infância – estas escolas passaram a ser questionadas por algumas famílias, educadores e profissionais da área da Educação e Psicologia, por exemplo.
Apesar dos bons resultados atingidos em rankings escolares, instituições de ensino tradicionais podem causar estresse e doenças emocionais em seus alunos com tanta pressão, exigência e excesso de conteúdos. Aumento de nervosismo, crises de insônia e depressão são exemplos de problemas que podem ser gerados pelo grau elevado de cobrança, ainda mais quando ele acontecer antes do amadurecimento da criança.
O ensino tradicional valoriza o conhecimento e, quanto mais conteúdo o aluno aprende, melhor avaliado ele é pela instituição. Além de exigir bom desempenho, as escolas tradicionais tendem a ser mais rígidas também em regras de comportamento, como horário, frequência, uso de uniformes, e atitudes dentro da escola.
A educação tradicional ainda é a mais procurada em todo o mundo, com filas de espera enormes por vagas em algumas escolas. Muitos pais buscam o ensino tradicional por o considerarem um investimento na vida da criança, como também um incentivo ao cumprimento de regras e costumes mais conservadores.
Escola Construtivista
O construtivismo é o método alternativo de ensino mais difundido no Brasil. Inspirado nas ideias do psicólogo suíço Jean Piaget (1896-1980), esta metodologia foca no aprendizado como construção, onde a criança entende o mundo por assimilação e sempre com uso da sua realidade como referência, ou seja, ela utiliza de conhecimentos que já possui para compreender o novo.
No construtivismo, a escola não tem um currículo rígido e propõe atividades que ajudam na ampliação do conhecimento infantil já existente. Segundo o método, este processo estimula a autonomia, criatividade e senso crítico da criança ou adolescente.
Para Piaget, por exemplo, noções de quantidade, proporção, sequência e volume surgem em momentos diferentes do desenvolvimento infantil e de forma espontânea.
No construtivismo, o aluno é visto como protagonista da aprendizagem, e o professor, como facilitador. Nas escolas desta pedagogia, os estudantes são incentivados a resolverem os problemas antes de o professor mostrar o caminho.
As ideias e teorias de alfabetização da psicóloga argentina e aluna de Piaget, Emilia Ferreiro, também são bases para algumas escolas construtivistas. Ela dizia que o aprendizado começa muito antes da escola e que crianças descobrem a escrita, por exemplo, sem estarem em uma instituição educacional. Ferreiro sugere que grande parte das crianças conseguem descobrir regras da escrita sozinhas, desde que imersas em um ambiente alfabetizante.
Escola Sócio-construtivista
Vertente do construtivismo, a escola sócio-construtivista se baseia nas ideias do psicólogo bielo-russo Lev Vygotsky (1896-1934), que desenvolveu a teoria de que o conhecimento é adquirido a partir das relações interpessoais.
Para os sócio-construtivistas, o papel da linguagem é fundamental e esta pedagogia acredita que o aluno aprende através da interação com grupos sociais, outros alunos e professores – estes, aliás, atuam como mediadores entre o a criança ou adolescente, seus conhecimentos e o mundo.
Com inspiração também em Piaget, a escola sócio-construtivista estimula a criança a aprender a partir de suas experiências. O foco desta pedagogia está também na importância do trabalho e discussão em conjunto entre os alunos para uma melhor compreensão de pontos e vista diferentes.
Escola Progressista-humanista
Também derivada do construtivismo, essa metodologia trabalha a criança com foco na progressão do seu conhecimento. Com foco na vivência grupal e equilibrada entre alunos e professores, esta metodologia valoriza as diferenças e individualidades de cada um.
As relações intra e extraescolares são essenciais nesta pedagogia de ensino, sendo que a escola deve estimular o aluno, através do que ele já conhece, a superar desafios e alcançar um nível mais elevado de aprendizado.
Escola Democrática
Uma escola democrática é aquela que se baseia em uma pedagogia libertária, na qual os alunos são os atores centrais do processo educacional e os professores são facilitadores que auxiliam nas atividades, de acordo com o interesse do estudante.
A linha democrática de ensino dá a alunos, professores, funcionários e pais direitos de participação na instituição. Cada um é, nesse sentido, responsável por si, mas também pelos demais.
Mônica Padroni, diretora da Educação Infantil da Escola Projeto Vida, em São Paulo, diz que a instituição tem uma postura de escutar o estudante, de forma associada aos objetivos educacionais. Além de usar instrumentos de pesquisa com alunos e pais, questões sobre convivência entre os estudantes ou entre a equipe escolar e a utilização do espaço, por exemplo, são discutidos em assembleias.
A escola emprega a democracia e conceitos de cidadania, sempre com foco no estudante. “Acreditamos numa criança potente, que pensa sobre o mundo todo o tempo e que traz informações que devem ser consideradas em nosso trabalho”, explica Mônica.
A Projeto Vida, que recebe crianças de seis meses (no berçário) até o Fundamental 2 e se prepara para abrir vagas para o Ensino Médio, segue o construtivismo como linha pedagógica principal, mas não única, pois a visão de ensino e aprendizagem está inserida em pedagogias ativas, como a democrática.
Segundo Mônica, o princípio da escola é voltado para que a criança tenha uma infância cheia de experiências com elementos da natureza e criação de brinquedos e brincadeiras – o que segundo ela não acontece em instituições totalmente voltadas em alunos para o Ensino Fundamental. “Têm escolas que não respeitam as necessidades das crianças pequenas e as colocam sentadas por horas em cadeirinhas preenchendo folhas ou apostilas”, diz.
De acordo com a diretora da Projeto Vida, as crianças devem ter tempo para observar o espaço que as rodeia, a expressão corporal, as artes, e para ouvir e criar histórias. Já os alunos maiores, devem ter um espaço que se preocupe com as habilidades cognitivas e conteúdos, como também com as habilidades sócio-emocionais e a formação de valores e princípios.
Escola Waldorf
A pedagogia Waldorf foi criada a partir das ideias do filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925) e tem esse nome porque os primeiros alunos dele eram funcionários da fábrica alemã Waldorf Astoria.
O ensino Waldorf acredita que o aprendizado deve andar juntamente com atividades corporais e artesanais, para assim, trabalhar o desenvolvimento físico, social e individual da criança de forma conjunta. Neste método, os alunos são divididos em faixas etárias – e não em séries – e não há repetência, por acreditar que o ritmo biológico do aluno não pode ser mudado.
Com base na concepção de ser humano e mundo desenvolvida por Steiner, a pedagogia Waldorf foca no conhecimento da criança para seu desenvolvimento em diversos aspectos, dando igual importância às formações ética, estética e acadêmica.
Com objetivo nas potencialidades individuais, esta metodologia valoriza a integração social de escola e família, imaginação, criatividade, arte e movimento, habilidades em resolver problemas, e em uma infância saudável, por exemplo.
Maria Zita Braga Jacob Cecchini, diretora do Colégio Waldorf Micael de São Paulo, na capital paulista, diz que, na escola, o mesmo professor acompanha os alunos do 1º ao 8º anos – além dos professores de matérias -, criando um vínculo profundo com as crianças e suas famílias. Para ela, a metodologia Waldorf é embasada no estudo da criança e no seu desenvolvimento.
Na pedagogia Waldorf, a alfabetização só se inicia a partir do primeiro ano do Ensino Fundamental e não há reprovação de alunos. “Há testes, mas há outros aspectos que compõem a avaliação, tais como o envolvimento, o trabalho realizado e a participação. A avaliação é sempre contínua e paralela, para orientar a prática pedagógica e os reforços necessários”, explica Zita, como é chamada no Colégio Waldorf Micael.
Em seu cotidiano, o Colégio Waldorf Micael, que recebe alunos do Ensino Infantil (com idade mínima de dois anos) ao Ensino Médio, conta com atividades como jardinagem, teatro, euritmia, ginástica Bothmer, agrimensura, astronomia, estágio agrícola, mosaico e marcenaria, por exemplo. E a música é uma disciplina curricular desde o Ensino Infantil, com aulas de canto e vários instrumentos, do kântele ao violino.
Escola Montessori
A linha montessoriana, proposta pela médica e pedagoga italiana Maria Montessori (1870-1952), foi uma das primeiras a inserir questões afetivas na educação. No Brasil, somente no final dos anos 80 este método começou a se popularizar.
Maria Montessori elaborou uma teoria científica do desenvolvimento infantil com proposta pedagógica em um ensino ativo, no qual a criança cria um senso de responsabilidade a partir de seu próprio aprendizado. Primeira mulher italiana a se formar em medicina, ela dizia que o ambiente precisa ser rico em estímulos que despertem o interesse para a atividade e convidem a criança a conduzir suas próprias experiências.
A pedagogia montessoriana acredita que a concentração e o desenvolvimento infantil acontecem através da manipulação de objetos. Na sala de aula, tudo deve estar à altura das mãos das crianças e o professor é considerado um guia para o aprendizado.
Edimara Lima, diretora pedagógica da Prima Escola Montessori, em São Paulo, explica que ser montessoriano é, antes de tudo, ser um estudioso. “Um dos princípios de Montessori é a Educação Científica, isto nos obriga a estudar e inserir no nosso cotidiano as conquistas, descobertas e pesquisas da Psicologia, da Pediatria, e hoje da Neurologia mais do que tudo”, diz.
A escola, que recebe crianças do berçário (a partir de quatro meses) ao Ensino Fundamental 2, segue totalmente a linha montessoriana, com base em observar, buscar embasamento teórico e intervir. “Na sala montessoriana, como me explicou um garoto de quatro anos, ‘a gente brinca e a professora olha’. Isto permite que cada um mantenha seu ritmo de aprendizagem, sem pressões demasiadas ou cobranças descabidas, cada um tem seu tempo e o apoio necessário para trabalhar a si mesmo”, explica Edimara.
A pedagoga, que também faz parte do Conselho Nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia, diz que a escola montessoriana é uma grande vivência democrática, construída e reconstruída cotidianamente, mas com limites. “As crianças e os jovens devem ser autores do aprender e explorarem suas potencialidades e talentos, mas isso não se aprende ouvindo, mas sim vivendo”, conclui.
Escola Pikler
Assim como as pedagogias Montessori e construtivista, a abordagem Pikler surgiu como resposta a um ensino tradicional, o qual dispõe as crianças sentadas em fileiras, não trabalha tanto a dimensão lúdica e tem pouco foco em atividades de expressões corporais e artísticas.
Apesar de apresentarem muitas aproximações, as abordagens Pikler e as metodologias já citadas acima (Montessori, Waldorf e construtivista) nasceram em contextos distintos. A Pikler foi desenvolvida após a Segunda Guerra Mundial, em Budapeste, na Hungria, e apresenta uma atenção especial para construção da autonomia dos bebês e crianças de 0 a 3 anos.
A abordagem Pikler já é seguida por algumas escolas no Brasil. Com princípios como a construção da autonomia, motricidade livre e a segurança afetiva, essa metodologia acredita que a capacidade de aprender está na criança.
A escola Aroeira, que atende crianças de 0 a 6 anos de idade, em Guarulhos (SP), tem os princípios de Emmi Pikler como base de sua filosofia, mas também influência no Interacionismo Sociodiscursivo (incentivo às produções de textos orais dos bebês e crianças pequenas) e na Ludicidade (incentivo à aprendizagem da livre construção de jogos e brincadeiras).
Na escola Aroeira, além do movimento livre e autonomia dos bebês, a afetividade entre educadores e crianças também é valorizada. “Momentos como os de troca, banho e alimentação são de extrema importância e exigem conhecimento, tranquilidade e carinho, além de serem reconhecidos como parte do processo de aprendizagem”, conta Wellington Domingos, diretor da instituição.
Wellington diz ainda que a escola se inspira em processos de interação das crianças entre si, com educadores e com objetos, por exemplo, para o desenvolvimento das dimensões psicomotora, afetiva e social infantil.
Escola How-to-live
A filosofia How-to-live foi criada pelo mestre iogue indiano Paramahansa Yogananda. No Brasil, já existe uma escola que tem sua metodologia focada nos princípios desta filosofia. A Arte de Ser, em São Paulo, tem como metodologia de trabalho a filosofia do mestre iogue voltada à educação para a paz, com olhar intenso para o desenvolvimento integral da criança nos âmbitos emocional, físico, mental e espiritual.
A instituição, que tem formato de uma associação sem fins lucrativos, tem base na alimentação vegetariana e aplica os princípios da Yoga na arte de educar. “A filosofia How-to-live se difere das demais pedagogias, pois seu foco é observar e incentivar o desenvolvimento da criança a partir do olhar de suas quatro dimensões, que são os pilares da escola: ciência do corpo, engenharia mental, artes sociais e ciência espiritual aplicada”, explica Maeve Vida, coordenadora pedagógica da Arte de Ser.
Na escola, além de brincar, as crianças praticam Yoga, meditação e atividades que treinam a concentração do momento presente como ikebana, jardinagem, artes com elementos da natureza e exercícios de vida prática (lavar, limpar, varrer, organizar, plantar e colher, por exemplo).
Segundo Maeve, a escola – voltada para o Ensino Infantil – também procura utilizar ideias de educadores como Maria Montessori, Emmi Pikler, Rudolf Steiner, Sathya Sai Baba, Rabindranat Tagore e Mahatma Gandhi em sua rotina.
Acesso a pedagogias alternativas
No Brasil, as escolas com pedagogias alternativas de ensino são geralmente particulares, ou seja, gera um custo (às vezes bem alto) para as famílias e, por isso, não são acessíveis a tantos alunos.
Porém, em São Paulo, já há escolas públicas com foco neste tipo de ensino, como é o caso da Escola Municipal de Ensino Fundamental Desembargador Amorim Lima. A mudança para o atual projeto pedagógico, que segue a linha construtivista, foi aprovada e inserida na instituição pela diretora Ana Elisa Siqueira, com colaboração de pais, professores e alunos.
Com inspiração na Escola da Ponte, em Portugal, na Amorim Lima cada aluno tem um educador tutor, que é responsável pela avaliação do estudante e o auxilia em todas as atividades. Lá não há aulas expositivas (com exceção nas disciplinas de matemática, oficina de texto e inglês) e os alunos recebem roteiros com perguntas e tarefas que devem ser respondidas ou desenvolvidas por ele individualmente ou em grupo. Neste sistema não há provas comuns, já que o conhecimento do estudante é avaliado pela qualidade destes roteiros e pela sua participação na escola.
Afinal, como escolher?
Ao escolher uma escola para o filho, os pais devem sempre prestar atenção na linha pedagógica seguida pela instituição. Mas, é importante não se prender a rótulos e analisar de perto as práticas realizadas em salas de aula para, então, decidir se as atividades e a metodologia são coerentes aos princípios da família.
Entretanto, independentemente da proposta pedagógica, a criança ou o adolescente somente terá satisfação e bom rendimento escolar se tiver identificação com a instituição de ensino. Por isso, é sempre importante observar a personalidade dos filhos antes de começar a busca por uma escola.
Luciana Barros de Almeida, da ABPP, explica que a criança tem facilidade e flexibilidade para se adaptar a diversas metodologias e, portanto, pode mudar de escola, se for necessário. “Quando o tempo de adaptação escolar for superior à um mês, talvez seja o momento de analisar e considerar a troca de metodologia”, diz.
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