Dona Inah, a diva do samba com mais de 60 anos dedicados à música
Assim como Clementina de Jesus, Cartola, Walter Alfaiate, Glória Bomfim e outros nomes sagrados do samba que chegaram tardiamente ao grande público, a paulista Ignez Francisco da Silva, mais conhecida como Dona Inah, só teve seu talento devidamente reconhecido no ano de 2005, aos 69 anos de idade.
Foi quando Dona Inah ganhou o Prêmio de Música Brasileira na categoria Revelação, com seu primeiro CD, “Divino Samba Meu”, lançado em 2004. “Olha Quem Chega”, totalmente dedicado à obra do compositor Eduardo Gudin, lançado em 2008, colocou-a como finalista pelo mesmo prêmio na categoria de Melhor Cantora de Samba, ao lado de Leci Brandão e Mart’nália.
Em 2013, lançou seu terceiro disco, “Fonte de Emoção”, cantando composições de Dona Ivone Lara, Paulo César Pinheiro, Teroca, Vó Suzana e a primeira música de sua autoria a ser gravada, “Chorar Jamais”.
Escute a canção “Chorar Jamais”:
De lá para cá, Dona Inah já realizou shows na França, Turquia, Marrocos e Cuba – onde gravou 14 canções com músicos do Buena Vista Social Clube e o pianista Pepe Cisneros – batendo recorde de bilheteria, conquistando a crítica. Recentemente, a artista também foi homenageada no documentário “Que Cantadora a Vida me Fez”, da cineasta Patrícia Francisco.
Dona de um timbre rasgado e emotivo, a cantora possui um jeito inconfundível de interpretar mestres como Nelson Cavaquinho, Délcio Cavalho e Cartola. Passados 82 anos de idade e mais de 60 de carreira, Dona Inah é hoje uma das principais representantes do samba paulista.
No entanto, a trajetória da majestosa cantora, distinguida pelo tratamento de dona e “inah” – palavra que homenageia a avó e significa “indígena” – foi muito além dessas conquistas.
Nascida em 17 de maio de 1935 na cidade de Araras, no interior de São Paulo, Dona Inah foi educada nas sutis harmonias das valsas e boleros entoadas por seu pai trompetista e projetou-se como cantora aos nove anos de idade em apresentações em bailes de fazendas da região e festas da cidade.
Pioneira e irreverente, ela foi a primeira mulher negra a cantar no famoso Araras Clube, reduto da elite local à época.
Contando com os poucos recursos da família e auxílio de conhecidos que apostaram no seu talento, ela se dedicou seriamente a carreira de cantora. Na década de 1950, com menos de 20 de idade, mudou-se para Santo André e passou a se apresentar profissionalmente nas principais orquestras e emissoras de rádio da cidade.
Com um repertório em que misturava sucessos interpretados por Isaurinha Garcia, Aracy de Almeida, Orlando Silva e Nelson Gonçalves, Dona Inah foi, aos poucos, conquistando o público e tornando-se uma figura carimbada nas rodas de samba em São Paulo.
No entanto, sem condições financeiras ou apoio para dar continuidade a carreira de cantora, pouco a pouco, o estilo de vida artístico foi tragado pelas durezas do dia a dia, e Dona Inah volta seus esforços para cuidar dos filhos e trabalhar como babá, empregada doméstica e cozinheira.
No início dos anos 2000, após uma contratação na Prefeitura de São Caetano – o que representou uma maior estabilidade financeira -, Dona Inah decide retomar sua carreira musical. Em 2002, ela é convidada para cantar no musical “Rainha Quelé”, em homenagem à Clementina de Jesus, ao lado de nomes como Marília Medalha e Fabiana Cozza. A partir daí, sua carreira deslancha.
Para além das glórias e conquistas, conhecendo a história de Dona Inah, nos damos conta da imensa dívida da sociedade com as mulheres do samba, sobretudo com as mulheres negras, parcela da sociedade que sofre até hoje com a discriminação de gênero e com o preconceito racial.
Mesmo tendo lançado seu primeiro CD aos 69 anos, Dona Inah consagra-se como uma figura de elevada importância para a cultura popular brasileira, ainda que pouco conhecida.
Ouça o álbum “Olha Quem Chega”, dedicado à obra do compositor Eduardo Gudin:
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