Câncer de mama: volta ao trabalho exige cuidados físico e emocional
O retorno ao trabalho após o tratamento do câncer de mama representa um marco significativo na vida de muitas mulheres
O câncer de mama é o tipo mais comum entre as mulheres em todo o mundo. Dados da Agência Internacional para Pesquisa de Câncer (Iarc, na sigla em inglês), apontam que uma em cada 20 mulheres em todo o globo será diagnosticada com câncer de mama até 2050 se os níveis atuais de prevenção e tratamento permanecerem. No Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), mais de 73 mil pessoas recebem o diagnóstico da doença todos os anos.
Diante desse cenário, o retorno ao trabalho após o tratamento do câncer de mama representa um marco significativo na vida de muitas mulheres. Mais do que a retomada da rotina, esse momento simboliza a superação de uma fase difícil e o recomeço de uma nova jornada.

No entanto, essa transição também envolve desafios físicos, emocionais e sociais que precisam ser reconhecidos e acolhidos. Especialistas destacam que a reinserção profissional deve ser feita com sensibilidade, apoio multidisciplinar e respeito às necessidades individuais. Nesse processo, políticas públicas e ações institucionais que garantam direitos, acolhimento e bem-estar no ambiente de trabalho são essenciais para promover uma reintegração saudável e digna.
No Brasil, o tema tem ganhado atenção do poder público e um Projeto de Lei (PL 4294/24) propõe garantir estabilidade temporária no emprego para trabalhadoras diagnosticadas com câncer de mama. Segundo o texto, o vínculo empregatício seria mantido por até 12 meses após o término do auxílio-doença. A proposta, que modifica a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a Lei de Benefícios da Previdência Social, ainda está em análise e precisa ser aprovada tanto pela Câmara quanto pelo Senado para entrar em vigor.
Quais são os cuidados físicos necessários para o retorno ao trabalho?
Após o tratamento, o corpo ainda passa por adaptações e necessita de acompanhamento contínuo. Roberto Filho (CRM/RS: 57598), médico da área de Clínica Médica do AmorSaúde, rede filiada ao Cartão de TODOS, destaca que “a paciente deve manter consultas regulares com seu oncologista e equipe multiprofissional. É fundamental realizar fisioterapia ou exercícios leves para prevenir linfedema, manter a mobilidade do braço e melhorar a força muscular”.
O profissional acrescenta que uma alimentação equilibrada e o respeito aos limites físicos são essenciais. “A alimentação rica em frutas, vegetais e proteínas magras, junto com hidratação adequada, contribui para a recuperação. Outro ponto importante é evitar esforços excessivos e adotar pausas durante a jornada de trabalho”, afirma. Segundo Filho, entre os fatores que influenciam o retorno, pode-se citar:
- Tipo de tratamento: cirurgias, quimioterapia e radioterapia podem exigir diferentes períodos de recuperação e adaptação.
- Estado de saúde: cada paciente reage de forma diferente ao tratamento, com alguns podendo retornar ao trabalho mais cedo e outros necessitando de mais tempo.
- Conceito de fragilidade: a doença pode gerar sequelas físicas ou cognitivas, exigindo que a empresa adapte a função ou realoque o colaborador.
Como evitar complicações
Durante o retorno à rotina, o médico ressalta ser importante adotar medidas que reduzam o risco de complicações. De acordo com Filho, “a prevenção envolve adesão ao tratamento hormonal (quando indicado), controle de fatores de risco como obesidade, tabagismo e sedentarismo, e acompanhamento clínico periódico”. No ambiente de trabalho, pequenas adaptações também fazem diferença:
- Ajustes ergonômicos e redução de atividades físicas extenuantes;
- Pausas regulares durante o expediente;
- Rotina de sono adequada e estratégias para controle do estresse;
- Prática de atividade física moderada, associada a menor risco de recidiva tumoral.
Adaptação aos desafios cognitivos e emocionais
De acordo com o médico Roberto Filho, o tratamento contra o câncer de mama pode impactar energia, foco e concentração, afetando o desempenho profissional. “Quimioterapia, hormonioterapia e radioterapia podem gerar fadiga crônica, déficit de atenção e lapsos de memória. Para se adaptar, recomenda-se dividir tarefas em etapas menores, priorizar atividades mais complexas em horários de maior energia e manter pausas programadas”, orienta o médico.
Além disso, Filho reforça a importância do cuidado mental. “Estratégias como higiene do sono, exercícios físicos regulares e técnicas de relaxamento auxiliam no desempenho. Em alguns casos, o acompanhamento com neurologista ou psicólogo pode ser indicado para suporte cognitivo”, completa.
Sinais de sobrecarga física ou emocional
Segundo o médico, identificar os limites é fundamental para evitar agravamentos. “Os principais sinais incluem fadiga persistente, dor ou inchaço no braço afetado, dificuldade para realizar tarefas simples, lapsos de memória frequentes, irritabilidade, ansiedade e insônia”. Emocionalmente, sentimentos como medo da recidiva, baixa autoestima e isolamento social também merecem atenção. “A observação atenta desses sintomas permite intervenção precoce e evita agravamentos”, ressalta o médico.
Filho ressalta que, para além dos cuidados físicos, o retorno à vida profissional exige acolhimento e empatia. “O acompanhamento psicológico é essencial para lidar com medo de recorrência, alterações de imagem corporal e impacto na autoestima”, afirma.
De acordo com Rennan Vilar, diretor de Pessoas e Cultura do Grupo TODOS Internacional, o papel das lideranças e do RH é determinante nesse processo. “A volta ao trabalho após o tratamento exige escuta ativa e empatia. Cabe às lideranças compreender que cada colaboradora tem um tempo diferente de readaptação e que acolher essas particularidades é um ato de humanidade, não de concessão”, diz.
Vilar reforça que políticas de flexibilização de jornada, mentorias internas e programas de saúde emocional são medidas eficazes.“Quando a empresa adota práticas que equilibram produtividade e bem-estar, ela não apenas contribui para a recuperação da colaboradora, mas fortalece toda a cultura organizacional”, complementa.
Para o diretor, o apoio dos colegas também é parte essencial da retomada. “Para ser mais leve, nenhum tratamento deve ser enfrentado sozinho, e o mesmo vale para o retorno. Quando o time demonstra empatia e acolhimento, a colaboradora sente que pode recomeçar com segurança e confiança”, conclui.
A fim de garantir um retorno tranquilo para a colaboradora, o executivo orienta três ações práticas que podem ajudar.
- Converse com o empregador: mantenha um diálogo aberto e sincero sobre suas necessidades e o que pode ser adaptado no ambiente de trabalho.
- Planeje o retorno: converse com colegas e gerentes antes do retorno para informar sobre suas condições e como se sente confortável para ser tratado.
- Busque apoio: a interação social com colegas pode ajudar a reduzir o isolamento, mas se sentir ansiedade, converse com pessoas de confiança antes.
“Com informação, apoio psicológico e empatia dentro das empresas, o retorno ao trabalho pode ser não um desafio solitário, mas uma oportunidade de recomeço com mais consciência, equilíbrio e valorização da vida”, finaliza Vilar.