Oráculo literário: 5 dicas para se conectar com o horóscopo da lunação de escorpião
Mergulhar na lagoa escura para renascer num novo mundo
É na manhã do dia 25 de outubro, mais precisamente às 7h49, que a lua encontra o sol e a vênus nos primeiros graus do signo de escorpião para iniciar um novo ciclo. De mãos dadas, os três respiram fundo e, juntos, caminham em direção às profundezas das águas fixas e escuras do misterioso reino do lacrau.
O mergulho é profundo porque escorpiano, o que diz das intensidades e transmutações, mas também porque de casa 12, território do inconsciente e dos mistérios ocultos da mente, coincidindo ainda com um eclipse solar, que indica o bloqueio da luz e as mudanças de paradigma. A presença dos dois luminares (sol e lua) – doadores da vida – e da vênus – planeta do amor e das artes – por ali anuncia a necessidade de olhar para dentro de si para inventar novos mundos, novas formas de viver.
Não é questão de querer, não há mais para onde olhar agora. Os velhos caminhos não dão mais passagem.
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É o escorpião quem nos lembra que a planta morre, a folha cai, apodrece e depois se torna terra para planta nova nascer. Decomposição. Fungos. Renovação. A inteligência do subterrâneo age. A água parada fermenta alquimias e venenos. O segredo está na dose. Indestrutível, o escorpião domina as artes da guerra. Estrategista das sombras, sabe que seu poder está na mutação. Na troca de pele, morte-vida necessária para continuar. Resiliência, não sem dor.
Mas “CALMA, CALMA, também tudo não é assim escuridão e morte”, diria Hilda Hilst. Na hora exata da nova, sagitário dispara uma flecha de fogo no horizonte. Conjunto à fortuna da carta, o brilho do arco do centauro ilumina o céu para nos lembrar do poder do sonho, da importância da educação e das grandes metas para o futuro.
Se escorpião nos convoca para dentro, sagitário nos convida para olhar para cima, para o meio do céu, que exalta a exuberância solar leonina, para frente, sempre adiante, num galope vigoroso. O palanque logo ali, está quase, já dá pra ver a boa hora. Conectada a Júpiter em áries e seu amplificador cósmico, a energia sagitariana nos contempla com a dose de entusiasmo necessária para cavalgar com fé, lembrando que, deste modo, não costuma falhar.
Enquanto isso, um vento forte anuncia bons presságios. A luta é cotidiana, quem tá no corre sabe. A força horizontal da multidão se opõe ao poder centralizador. Chama os irmãos, os amigos, os vizinhos, os bons afetos, chama o crush, o ‘conje’, o sócio, chama todo mundo pra luta, pra conversa, pro debate e manda descer pra ver, que vem coisa boa por aí. Mentaliza e assopra com força que é qualidade da ventania derrubar castelos de areia.
Cuidar do mundo interior, terminar com o que precisa acabar. Não ter medo da metamorfose para que um mundo novo possa nascer. Se conectar com os chegados e o coletivo, ter fé na sorte e no destino. Acreditar no sonho! Esses são os conselhos desta lunação, e esses são alguns livros que podem te ajudar a se conectar com essas energias.
Mergulhar na lagoa escura
Os Abismos, Pilar Quintana, Intrínseca
Os Abismos, da colombiana Pilar Quintana, fala essencialmente dos abismos que existem em nós. Mas não quaisquer abismos, não quaisquer nós. O romance, que se desenrola sob o calor opressivo de Cáli, trata mesmo é da solidão feminina e da queda livre das vidas de mulheres, esvaziadas de um sentido verdadeiro, geração após geração.
“Então eu o vi em seus olhos. O abismo dentro dela, igual ao das mulheres mortas […] uma fenda sem fundo que nada pode preencher”
Mas as histórias de Quintana são percebidas e narradas pela perspectiva de Cláudia, uma menina de 8 anos, capaz de mudar tudo. A trama, que por vezes ganha ares de terror psicológico, apresenta os dilemas de uma estrutura familiar e genealógica em ruínas e a possibilidade de romper com padrões criados e perpetuados muito antes de nós. Não sem antes, mergulhar nos abismos.
Aprender o poder da mutação
Escute as feras, Nastassja Martin, Editora 34
“É um nascimento, pois claramente não é uma morte”, alerta a antropóloga Nastassja Martin logo na primeira página de Escute as Feras. Inspirados em anotações e registros de diários da própria autora, o livro relata acontecimentos internos e externos, após seu encontro com um urso. Estudiosa do Grande Norte subártico, a autora viveu e trabalhou muito tempo entre os even, um povo que, tomando distância da civilização pós-soviética, preferiu voltar a viver no coração das florestas siberianas.
Pesquisadora das relações entre humanos e não humanos e das presenças múltiplas que podem habitar um mesmo corpo, comuns entre cosmogonias originárias, Martin acaba por viver na pele a sua pesquisa. A partir deste acontecimento, passa a tecer a trama de Escute as feras, levando-nos a uma reflexão vertiginosa sobre o humano e o natural, a identidade e a fronteira, o tempo do mito e a vida contemporânea.
A inteligência do subterrâneo age
A Trama da Vida, Merlin Sheldrake, Ubu Editora
As mais de 2 milhões de espécies de fungos que habitam o mundo desafiam nossas ideias tradicionais de individualidade e inteligência. Frequentemente invisíveis para nós, os fungos se entrelaçam e articulam parcerias complexas e são responsáveis pela decomposição da matéria orgânica e da existência da vida, portanto. Capazes de feitos inimagináveis, estão por toda parte, nas águas dos rios, no fundo do oceano, sobre todas as superfícies, dentro das rochas, emaranhados nas raízes, soltos no ar e até dentro de nós.
Apaixonado por este mundo invisível desde criança, Merlin Sheldrake mergulhou de cabeça nesse universo. Formado em biologia em Harvard e doutor em ecologia tropical pela Universidade de Cambridge, ainda na faculdade, fez bebidas alcoólicas a partir de receitas medievais, rastejou por florestas tropicais coletando espécimes, passou horas e horas em laboratórios, tomou psilocibina (substância alucinógena presente em cogumelos psicodélicos) e visitou e entrevistou diversos pesquisadores e aficionados. O resultado de todo este percurso está no livro A Trama da Vida.
Dispara uma flecha de fogo no horizonte
Flecha, Matilde Campilho, Editora 34
Uma flecha disparada no princípio de tudo. “Uma flecha é sempre feita de asa”. Uma história com princípio, meio e fim. Bem diferente do último livro de Matilde Campilho, Jóquei, Flecha reúne mais de duzentas histórias nascidas de outras histórias, inspiradas em livros, pinturas, viagens e fotografias. Histórias inventadas e histórias escutadas pela própria autora. Crônicas de animais, de objetos, mas sobretudo de pessoas, indistintamente reais ou fictícias. Campilho resgata Cristina Campo, em “Dardos em direção ao céu”, para explicar, no início do livro, a ligação entre flecha e oração. Voando por todos os tempos e lugares do mundo, essa flecha iniciática é ao mesmo tempo mantra, memória e feitiço, o elemento que atravessa o livro inteiro. O fio que une tudo com tudo. Mas voltando ao início, onde a flecha foi disparada, “fazia frio no princípio do mundo”, e Campilho nos recorda de que “em volta do fogo sempre se contaram boas histórias […] Junto ao fogo não há tempo, nem século, nem sequer a hora fixa. Frente ao fogo, todos somos ouvintes”.
Inventar novos mundos, novas formas de viver
Floresta é o nome do mundo, Ursula K Le Guin, Editora Morrobranco
“Tempos difíceis estão por vir, quando desejaremos ouvir a voz de escritores que consigam ver alternativas ao que vivemos hoje e possam enxergar além desta nossa sociedade, tomada pelo medo e por sua tecnologia obsessiva, outras maneiras de existir, e que possam até imaginar possibilidades reais de esperança. Precisaremos de escritores que possam se lembrar da liberdade. Poetas, visionários — os realistas de uma realidade mais ampla. […] A resistência e a mudança muitas vezes começam na arte, e muitas vezes mais na nossa arte — a arte das palavras.”
(Trecho do discurso de Ursula K. Le Guin, em 2014, quando foi homenageada pela sua contribuição à literatura americana no National Book Award. A íntegra você pode conferir abaixo.)
Vencedor do Hugo Award, Floresta é o nome do mundo é uma distopia, que conta a história do planeta Athshe, paraíso coberto por densas e colossais florestas. Seus habitantes, humanoides com pouco mais de um metro de altura e corpos cobertos por pelos verdes e sedosos, viviam em paz e integração com a natureza até o dia em que chegam “os outros”. Muito mais altos e de pele lisa, eles caíram do céu em naves e começaram a desbravar o território ao seu redor, tratando os nativos como animais selvagens.
Eles vieram de um mundo em ruínas e superpovoado, faminto por matérias-primas, madeira e grãos: a Terra. Sem precedentes culturais para tirania, escravidão ou guerra, os nativos encontram-se à mercê de seus novos e brutais colonizadores. Quando o desespero atinge níveis inimagináveis, uma revolução mostra-se inevitável. Numa potente analogia às colonizações e à crescente degradação e exploração da natureza e desrespeito aos direitos humanos, Le Guin expõe neste romance as feridas mais urgentes e atuais do mundo contemporâneo. Visionária que foi, antecipou a crise climática e foi pioneira em apontar sua conexão com a violência das invasões coloniais que perpetuam a exploração do ser humano, dos animais e da natureza até os dias de hoje.