Jovem fisioterapeuta convive com Doença de Crohn e revela os desafios de uma doença sem cura

Bruno Henrique compartilha como lidar com limitações físicas, emocionais e sociais causadas pela Doença de Crohn

Por Wallace Leray em parceria com Anna Luísa Barbosa (Médica - CRMGO 33271)
16/05/2025 14:46 / Atualizado em 24/05/2025 21:28

Diagnosticado com Doença de Crohn aos 25 anos, Bruno Henrique Souza, hoje com 27, lida com os impactos físicos, emocionais e sociais da Doença Inflamatória Intestinal (DII) enquanto atua como fisioterapeuta em Pirapora, Minas Gerais. Mestre em Fisioterapia, ele compartilha como a doença afetou sua rotina profissional, alimentação, saúde mental e vida social.

Jovem fisioterapeuta convive com Doença de Crohn e revela os desafios de uma doença sem cura
Jovem fisioterapeuta convive com Doença de Crohn e revela os desafios de uma doença sem cura - Reprodução/Instagram @brunohsf_

Diagnóstico rápido e impactante

Bruno relata que o diagnóstico foi mais rápido do que costuma ocorrer com outras pessoas. “Tudo começou com episódios de diarreia e cólica intestinal intensa, cerca de 15 vezes em um só dia. E assim seguiu pelos 20 dias seguintes”, conta. Um desmaio após uma crise intestinal o levou a buscar atendimento médico.

No mês seguinte, ele precisou ser operado às pressas por conta de um abscesso. “Foi após isso que procurei uma especialista, que me solicitou vários exames. Eles foram conclusivos para Doença de Crohn, tudo num período de seis meses.”

O impacto emocional do diagnóstico foi imediato. “Lembro do sentimento até hoje: sensação de impotência, medo de morrer. Eu só pensava que era muito novo para viver com isso, mas precisava lutar, porque eu tinha muita coisa para conquistar na vida.”

Sintomas que interferem no trabalho e na rotina

Desde então, Bruno lida com uma fístula como sequela do abscesso. “Dependendo do que eu como ou se faço mais esforço, a fístula inflama, drena secreção e dói bastante”, explica. Ele atua como fisioterapeuta domiciliar e também no SEST SENAT da cidade. Em crises, a dor e o desconforto o obrigam a cancelar atendimentos.

“É muito importante ter alguém por perto que saiba da sua condição. Diversas vezes já tive que cancelar atendimentos por conta da dor na fístula, cólica abdominal ou diarreia. Isso impacta diretamente na questão financeira.”

Um processo de amadurecimento contínuo

Bruno acredita que a doença exigiu um amadurecimento precoce, mas também reconhece que esse processo ainda está em andamento. “Hoje, depois de dois anos de diagnóstico e um em tratamento, consigo dizer que estou educado na minha condição. Mas é algo que preciso manter em constante pensamento, porque é pra sempre.”

Ele destaca que entender a importância do autocuidado foi um passo fundamental. “Se eu não me cuidar, serei o mais – ou o único – prejudicado.”

Vida social e relações pessoais

As limitações impostas pela doença também exigiram adaptações na vida social. Bruno procura sempre ser transparente com as pessoas ao seu redor. “Já falo com todo mundo que, em algum momento do dia ou do rolê, pode ser que eu precise me ausentar por algum desconforto abdominal ou pélvico.”

Segundo ele, quem se importa realmente com sua saúde compreende e respeita essas situações.

Alimentação restrita e dificuldades em eventos sociais

Um dos maiores desafios relatados por Bruno desde o diagnóstico foi a mudança na alimentação. “Eu sempre fui de comer muito e de comer tudo. Quando vi que, durante a crise, não poderia mais comer as coisas que queria, isso foi o pior.”

Hoje, ele evita alimentos com trigo, açúcar e condimentos, pois sabe que causam desconforto. A dificuldade aumenta em eventos sociais, especialmente quando há falhas no preparo dos pratos. “Na maioria dos lugares que vou pela primeira vez, já saio de casa tendo feito uma refeição segura e saudável antes. Isso ajuda muito.”

Saúde mental ainda em recuperação

Além dos impactos físicos, a Doença de Crohn também afetou a saúde mental de Bruno. Ele relata que o processo ainda é difícil. “Minha saúde mental ainda está abalada com tudo isso que aconteceu. Faço terapia toda semana, e tem me ajudado muito.”

Mesmo com o tempo de tratamento, ele diz que ainda sofre com privações. “A mudança é drástica, e ainda que tenham se passado dois anos, não é algo fácil.”

Apoio profissional e grupos de convivência

Bruno recebeu apoio de colegas de trabalho após o diagnóstico, já que já havia se formado na faculdade e no mestrado. “Trabalhava em um hospital da cidade, e os médicos sempre se preocupavam ao saber da gravidade que a doença poderia atingir.”

Hoje, ele participa de um grupo de apoio de pacientes com DII em Minas Gerais. “Sou associado ao grupo e acho de extrema importância. Lá a gente conversa, doa medicamentos, troca vivências e principalmente acolhe quem está chegando.”

Bruno Henrique durante atendimento domiciliar em Pirapora (MG): “A fístula me obriga, às vezes, a cancelar o trabalho.”
Bruno Henrique durante atendimento domiciliar em Pirapora (MG): “A fístula me obriga, às vezes, a cancelar o trabalho.” - Reprodução/Instagram @brunohsf_

O que a sociedade precisa entender sobre a DII

Bruno acredita que ainda há muita desinformação sobre as Doenças Inflamatórias Intestinais, especialmente quando afetam pessoas jovens. “As pessoas precisam entender que ter uma DII não mexe só com o intestino. Mexe com toda a estrutura do ser.”

Ele destaca a fadiga extrema como um dos sintomas mais difíceis. “Se tiverem contato com um jovem com DII, não falem que ele ou ela é preguiçoso. Isso só afeta ainda mais a saúde mental.”

Uma mensagem para outros jovens com DII

Ao final, Bruno deixa uma mensagem de apoio para outros jovens que estão começando a lidar com a Doença de Crohn ou outras DII:

“Você não está sozinho. Muitos jovens enfrentam essa jornada todos os dias, com coragem, dúvidas e muita força. Vão existir dias difíceis, mas o mais importante é lembrar que a DII faz parte da sua história e não define quem você é. Cuide do seu corpo e da sua mente. Converse com seus amigos, busque apoio profissional quando sentir que precisa e, principalmente, celebre cada pequena vitória no seu caminho. A vida continua e pode ser leve, feliz e cheia de possibilidades.”

Aumento dos casos de Doença de Crohn no Brasil

A Doença de Crohn é uma condição inflamatória crônica do trato gastrointestinal, sem cura definitiva, que pode afetar pessoas de todas as idades. No Brasil, a incidência da doença tem aumentado significativamente.

Um estudo publicado na revista The Lancet Regional Health Americas em 2022 apontou que a quantidade de pessoas diagnosticadas com doenças inflamatórias intestinais (DII) no Brasil aumentou 233% em oito anos, passando de 30 casos por 100 mil habitantes em 2012 para 100,1 casos por 100 mil pessoas em 2020 .

Mudança de hábitos alimentares e apoio emocional foram essenciais na adaptação à Doença de Crohn, segundo o fisioterapeuta.
Mudança de hábitos alimentares e apoio emocional foram essenciais na adaptação à Doença de Crohn, segundo o fisioterapeuta. - Reprodução/Instagram @brunohsf_

Impacto na saúde mental dos pacientes

Além dos sintomas físicos, a Doença de Crohn pode ter um impacto significativo na saúde mental dos pacientes. Estudos indicam que a ansiedade é uma resposta emocional comum que os indivíduos com doença de Crohn costumam experimentar . A relação entre a doença e a saúde mental é complexa e multifacetada, exigindo uma abordagem de tratamento que considere tanto os aspectos físicos quanto emocionais da condição.