Novo tratamento pode revolucionar o diabetes tipo 1
Terapia com células-tronco elimina uso de insulina em pacientes graves
Imagine viver com uma condição crônica que exige controle constante, injeções diárias e atenção redobrada à alimentação. Para milhões de pessoas com diabetes tipo 1, essa é a realidade. Mas um novo estudo está mudando esse cenário e reacendendo a esperança de uma vida sem insulina.
Pesquisadores do Hospital Geral de Toronto, em parceria com a Universidade da Pensilvânia, desenvolveram uma terapia experimental que pode eliminar a necessidade de insulina farmacêutica em pacientes com diabetes tipo 1 grave. Os resultados foram publicados no “New England Journal of Medicine” e apresentados no congresso da Associação Americana de Diabetes.

Batizada de zimislecel, a terapia utiliza células-tronco pluripotentes transformadas em ilhotas pancreáticas —estruturas responsáveis pela produção de insulina. Após a infusão no organismo, essas células começam a funcionar como se fossem parte do pâncreas, regulando os níveis de glicose de forma natural.
Como funciona o tratamento com zimislecel
O processo começa em laboratório, onde as células-tronco são manipuladas para se tornarem células produtoras de insulina. Em seguida, elas são infundidas em um vaso sanguíneo que irriga o fígado, local onde se instalam e passam a produzir insulina de forma autônoma. Para evitar rejeição, os pacientes recebem imunossupressores — como ocorre em transplantes de órgãos.
Na fase atual do estudo, 14 pacientes participaram, sendo que 12 receberam a dose completa da terapia. Após um ano, 10 deles (83%) não precisavam mais aplicar insulina, algo inédito para muitos desde o diagnóstico. Além disso, os episódios de hipoglicemia severa desapareceram completamente em até 90 dias.
Segundo o pesquisador Trevor Reichman, diretor do programa de transplante de pâncreas e ilhotas do Hospital Geral de Toronto, “em muitos casos, eles estão livres da insulina pela primeira vez”. Os pacientes também apresentaram melhora no controle glicêmico, com níveis de hemoglobina glicada abaixo de 7%, o que indica estabilidade no açúcar do sangue.
Limitações e próximos passos da pesquisa
Apesar dos resultados animadores, o tratamento ainda apresenta desafios. O uso contínuo de imunossupressores pode aumentar o risco de infecções e até câncer a longo prazo, o que limita a aplicação da terapia em pacientes com formas mais leves da doença. Por isso, o zimislecel está sendo testado apenas em casos graves e de difícil controle.
A terapia ainda está na fase 2 dos testes clínicos e deve avançar para a fase 3 em breve. A expectativa é que, se os resultados se mantiverem positivos, o tratamento possa ser submetido à aprovação regulatória em 2026. A farmacêutica Vertex, responsável pelo desenvolvimento clínico, já investiu cerca de US$ 50 milhões no projeto, que levou mais de 20 anos para ser desenvolvido pelo cientista Doug Melton.
Enquanto isso, outras abordagens também estão sendo exploradas. A insulina semanal, aprovada recentemente pela Anvisa, representa outro avanço importante, reduzindo a frequência de aplicações e melhorando a qualidade de vida dos pacientes.
Um futuro sem insulina?
A possibilidade de viver sem insulina é um sonho antigo para quem convive com o diabetes tipo 1. Embora ainda seja cedo para falar em cura definitiva, os avanços recentes mostram que a ciência está cada vez mais próxima de transformar esse sonho em realidade.
O zimislecel representa uma mudança de paradigma: em vez de apenas controlar os sintomas, ele atua na raiz do problema, restaurando a capacidade do corpo de produzir insulina. Se os estudos continuarem mostrando eficácia e segurança, essa terapia pode se tornar uma alternativa viável para milhares de pessoas que hoje dependem de aplicações diárias.
Por enquanto, o acompanhamento médico e o controle rigoroso continuam sendo essenciais. Mas com a ciência avançando a passos largos, talvez em breve o tratamento do diabetes tipo 1 seja menos sobre sobrevivência —e mais sobre liberdade.