Pipoca de micro-ondas pode causar alterações cerebrais
Pesquisa indica que o consumo excessivo do composto diacetil, encontrado em alimentos como pipoca de micro-ondas, pode ter impactos negativos à saúde
Pesquisadores do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da USP conduziram um estudo que revela novas evidências indicando que o diacetil, um composto presente em certos alimentos, como algumas marcas de pipoca de micro-ondas, e responsável por conferir aroma e sabor amanteigado, pode ser prejudicial à saúde quando consumido em excesso e por um longo período de tempo.
No estudo, os cientistas administraram o composto a ratos durante 90 dias consecutivos e observaram a presença de proteínas associadas ao Alzheimer no cérebro desses animais. Esses achados sugerem a possibilidade de que o diacetil possa ter efeitos prejudiciais, pelo menos em ratos, levantando a necessidade de investigações adicionais para compreender melhor o impacto potencial do composto na saúde humana.
“Das 48 proteínas cerebrais que avaliamos após a exposição dos animais ao produto, 46 sofreram algum tipo de desregulação ou modificação em sua estrutura por conta do consumo prolongado do composto. Durante as análises, nós identificamos o aumento da concentração de proteínas beta-amiloides”, explica Lucas Ximenes, doutorando do IQSC e autor da pesquisa.
Apesar de ainda não termos um claro entendimento dos mecanismos envolvidos nessa doença, é comum encontrar essas proteínas em pacientes com Alzheimer.
Para avançar na pesquisa, os pesquisadores do IQSC planejam realizar novos testes, envolvendo um maior número de animais, a fim de aprofundar a compreensão desses resultados preliminares.
“Claro que comer esporadicamente certos alimentos não tem problema, e alguns prazeres em excesso podem fazer mal. Mas por mais que a gente coma o produto, nós temos muito menos contato com o diacetil do que os trabalhadores que lidam ou até inalam diariamente o composto nas fábricas”, exemplifica.
Análises
O cientista relatou que o diacetil afetou tanto os cérebros dos ratos machos quanto dos ratos fêmeas, sendo observado um comprometimento maior em certas regiões do órgão, como o hipotálamo.
“Até então, não se sabia exatamente quais os possíveis efeitos e modificações que o composto poderia gerar no cérebro de organismos vivos, existem poucos estudos nesse sentido, ainda é um universo pouco explorado. Além disso, alguns trabalhos utilizam quantidades absurdas do composto, até 50 vezes maiores que a nossa, o que facilita o aparecimento de problemas. O que nós fizemos foi utilizar concentrações de diacetil mais próximas do que seria um consumo diário normal”, revela Ximenes, que é orientado pelo professor Emanuel Carrilho, do IQSC, e co-orientado pelo professor Nilson Assunção, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Os pesquisadores avaliaram os cérebros dos ratos utilizando dois equipamentos. Um deles é o espectrômetro de massas, que realiza leituras e gera mapas de calor dos órgãos, fornecendo uma espécie de impressão digital dos cérebros. Isso permitiu observar a distribuição das proteínas e do diacetil em diferentes regiões.
Em uma etapa subsequente, utilizaram um cromatógrafo para determinar se essas proteínas sofreram alterações, como aumento na concentração ou mudanças estruturais preocupantes. O estudo foi conduzido em um total de 12 ratos, sendo metade do grupo controle (que recebeu placebo) e a outra metade ingeriu o diacetil.
O diacetil é amplamente utilizado na indústria, incluindo o setor alimentício, onde é empregado como conservante e flavorizante, conferindo sabor e aroma aos alimentos. É encontrado naturalmente em produtos como café, cerveja, chocolate, leite e iogurte, e é utilizado em concentrações mais elevadas na pipoca de micro-ondas como aditivo.
Embora o consumo do diacetil seja aprovado pelas agências reguladoras, a exposição prolongada a esse composto pode ser prejudicial à saúde. Devido à sua presença no cotidiano da população, diversos estudos buscam compreender a influência desse composto em organismos vivos e como ele pode afetar as funções biológicas.
O estudo recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).