Por que algumas pessoas exageram nos presentes? A neurociência tem respostas

O excesso no ato de presentear pode ultrapassar os limites da generosidade e entrar no campo da psicodinâmica relacional e neuropsicológica

Por Maíra Campos em parceria com Anna Luísa Barbosa (Médica - CRMGO 33271)
21/05/2025 11:04

Dar presentes é uma prática social amplamente aceita e, em muitos contextos, vista como expressão legítima de afeto e consideração. No entanto, quando essa ação se torna exagerada em frequência, valor ou teatralidade, ela pode levantar questões relevantes sobre a motivação por trás do gesto.

Por que algumas pessoas exageram nos presentes? A neurociência tem respostas
Por que algumas pessoas exageram nos presentes? A neurociência tem respostas - istock/dikushin

O excesso no ato de presentear pode ultrapassar os limites da generosidade e entrar no campo da psicodinâmica relacional e neuropsicológica. Em determinados perfis de personalidade, o presente não cumpre apenas um papel simbólico, mas assume uma função estratégica na regulação emocional e na busca de validação.

Presentear como reflexo de padrões de personalidade

Segundo a neuropsicologia, o comportamento de presentear em excesso pode estar associado a estruturas emocionais específicas descritas no grupo B do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais.

Os transtornos de personalidade narcisista (TPN) e histriônico (TPH) são os que mais se destacam quando o presente é usado como ferramenta emocional e relacional. Esses perfis costumam demonstrar teatralização afetiva e um padrão de manipulação guiado por reforços externos.

O narcisismo por trás do presente

No Transtorno de Personalidade Narcisista, o ato de presentear não está, necessariamente, ligado a empatia ou generosidade genuína. “No TPN, o presente pode não ser um ato de empatia ou altruísmo, mas um instrumento de controle e manutenção do autoconceito grandioso.”

O presente funciona como espelho para a autoimagem inflada do narcisista, que busca retorno simbólico e emocional para alimentar o próprio ego.

Neurobiologicamente, esse padrão está relacionado a alterações na conectividade entre o córtex pré-frontal medial e estruturas límbicas. Isso compromete a empatia e a capacidade de reciprocidade afetiva.

Por que algumas pessoas exageram nos presentes? A neurociência tem respostas
Por que algumas pessoas exageram nos presentes? A neurociência tem respostas - istock/EyeEm Mobile GmbH

Histrionismo e o presente como espetáculo emocional

No Transtorno de Personalidade Histriônica, o presente ganha contornos ainda mais performáticos. “No TPH, o presentear aparece como comportamento de ativação emocional e de busca por atenção.”

A entrega do presente tem menos a ver com o outro e mais com a necessidade do indivíduo de se sentir visto, validado e desejado.

Esse comportamento decorre de baixa tolerância à inibição afetiva e da hiperreatividade das estruturas cerebrais ao julgamento social. Assim, os gestos são modulados mais pelo impacto externo do que por vínculos genuínos.

Contraponto: vínculos que dispensam o presente

É importante destacar que nem todos utilizam presentes como meio de afirmar valor social. “Em contraposição, sujeitos que não exibem esses padrões de dramatização e validação externa tendem a expressar seu valor social por meios imateriais, como ideias, escuta, presença estratégica ou produção simbólica.”

Esses perfis demonstram maior integração entre os sistemas límbico e executivo, o que favorece o autocontrole e o senso profundo de reciprocidade nas relações.

Nesse caso, o afeto é comunicado de forma sutil, e o valor dos vínculos não depende de reforços externos visíveis.

Atenção clínica e compreensão do comportamento

É necessário cuidado ao interpretar o ato de presentear em excesso. Nem todo gesto grandioso é sinal de patologia, mas padrões repetitivos podem indicar desequilíbrios.

“O ato de presentear em excesso deve ser analisado não como um traço isolado, mas como expressão de uma arquitetura cognitivo-emocional que, em determinadas condições, pode sinalizar disfunções adaptativas no campo afetivo e social.”

Na clínica, esse comportamento exige análise de motivação relacional, coerência narrativa e frequência. É o conjunto desses fatores que define se há ou não um transtorno subjacente.