Fotógrafo brasileiro percorre rotas da escravidão em busca da memória de seus ancestrais

“Sankofa – A África que Te Habita” estreou no canal de TV por assinatura Prime Box Brazil

Para os povos da África Ocidental, a palavra “sankofa” quer dizer “volte e pegue”. Ela é simbolizada por um pássaro com a cabeça voltada para trás, o que representa o retorno ao passado para ressignificar o presente e construir o futuro.

Foi seguindo a filosofia dessa palavra, que o fotógrafo César Fraga e o professor e doutor em história Maurício Barros de Castro percorreram nove cidades da África, seguindo o trajeto das quatro rotas transatlânticas da escravidão –Guiné, Mina, Angola e Moçambique–, por onde cerca de cinco milhões de africanos escravizados atravessaram o Atlântico para movimentar a economia do Brasil Colônia e Império (1530-1888).

Sacerdotisas de Dan, em Abomé, no Benim, em ritual que só acontece a cada 24 anos
Créditos: Divulgação/Cesar Fraga
Sacerdotisas de Dan, em Abomé, no Benim, em ritual que só acontece a cada 24 anos

A expedição acabou de virar uma série que estreou no começo do mês no canal de TV por assinatura Prime Box Brazil.

Em dez episódios, “Sankofa – A África que Te Habita” também retrata a resistência de grupos regionais para manter a cultura ancestral incorporada à identidade brasileira e apresenta contos mitológicos narrados pela atriz Zezé Motta.

A idealização do roteiro partiu da necessidade de César reencontrar suas raízes.

“O que mais me incomodava é essa ausência de informações da África pré-período escravocrata no Brasil. Ficava me perguntando: e antes do navio negreiro, o que acontecia lá?”, questiona o carioca, neto de escrava.

Celebração na Nigéria; país integrava uma das rotas do tráfico transatlântico de escravos
Créditos: Divulgação/Cesar Fraga
Celebração na Nigéria; país integrava uma das rotas do tráfico transatlântico de escravos

A cada destino, César registrou vestígios de monumentos, tradições locais e beleza de povos em fotografias, no seu primeiro trabalho profissional nesta linguagem, que virou exposição e ilustrou o livro “Do Outro Lado”, com pesquisa histórica escrita por Mauricio.

Partindo de Fortaleza, o projeto viajou por nove cidades das quatro rotas do tráfico transatlântico: Guiné (Cabo Verde, Guiné-Bissau e Senegal), Mina (Gana, Togo, Benim e Nigéria), Angola e Moçambique.

 O fotógrafo César Fraga
Créditos: Divulgação
 O fotógrafo César Fraga

No primeiro episódio da série, César e Maurício explicam as dificuldades de viabilização da viagem, no momento em que o estudo da diáspora africana ganha progressiva relevância mundial.

Maurício contextualiza a inscrição do sítio arqueológico do Cais do Valongo na lista de Patrimônio Mundial da Unesco, oficializada em 2018. Trata-se da maior porta de entrada de escravizados do mundo, localizado na zona portuária do Rio de Janeiro, por onde aproximados um milhão de pessoas passaram.

No Senegal (3º episódio), César e Maurício conhecem a África muçulmana da colorida e contemporânea capital Dakar. Se surpreendem com a beleza e tranquilidade da Ilha de Gorée, rota com menor número de escravos vindos ao Brasil, mas em sua maioria destinados ao Maranhão.

Artesanato do Togo, um dos países visitados na expedição
Créditos: Divulgação/Cesar Fraga
Artesanato do Togo, um dos países visitados na expedição

A cultura africana

As fábulas inseridas em todos os episódios buscam valorizar a cultura oral, transmitida entre gerações como ensinamentos ancestrais que preservam o pensar africano. A história do maior guerreiro do mundo, Ogum, é uma delas.

A falecida Tia Maria, guardiã do Jongo da Serrinha, a Iyalorixá de São João do Mereti (RJ) e a Mãe Menininha de Oxum, são alguns dos personagens entrevistados pela série.