Ocupação vira residência para idosos

Luzia Britto, 75 anos, nasceu em Juazeiro do Norte (CE), morou numa casa feita de madeira e barro, viveu na periferia, perdeu o barraco na construção de uma avenida em São Paulo. Desde abril, está instalada em um casarão no Jardim Paulista, um dos bairros mais caros de São Paulo, onde as residências podem facilmente passar dos R$ 3 milhões.

Ela é uma das 27 pessoas que ocuparam o imóvel de dois andares na rua Honduras em uma ação da FLM (Frente de Luta por Moradia). Grande parte dos moradores tem mais de 60 anos, e a organização trabalha para transformar a casa que ficou desocupada por sete anos em um abrigo para idosos.

Luzia Britto na cozinha da casa da rua Honduras

É Luzia que ajuda a coordenar as tarefas da casa. Sentada na única mesa da residência, com capacidade para seis pessoas, ela conta que ajuda a preparar as refeições e a manter os cômodos limpos. Está acostumada ao trabalho pesado: com o pai, “fazia serviço de homem nas plantações”, andava quilômetros para buscar água para o consumo.

Na casa dos Jardins, a maioria das pessoas dorme na sala. Colchões são dispostos pelos três ambientes, que têm tacos velhos, mas perfeitamente limpos.

Parte dos moradores vai para o segundo andar, onde há quatro dormitórios e um grande hall. Luzia aponta para o teto e explica que, devido à falta de manutenção, não há mais forro e o telhado ficou avariado. Ou seja, à primeira gota de água de chuva, é preciso correr com os pertences para o andar de baixo. “Ficam três ou quatro no mesmo colchão, como brincadeira de criança”, destaca ela.

Luzia na porta da casa da rua Honduras, ocupada pela Frente de Luta pela Moradia

Luzia conta que chegou a São Paulo em busca do tio do marido, que morava na cidade. Pegou os quatro filhos pela mão e embarcou. Mas, à noite, ao chegar à Vila Carrão, na zona leste, no endereço marcado na carta enviada pelo parente, não havia ninguém.

Sem terem para onde ir, ela, o marido e as crianças conseguiram abrigo em um galpão de construção civil. Distribuiu folhas de jornal no chão e acomodou os filhos. Passou boa parte da noite acordada e, na manhã seguinte, foi para um albergue na avenida Celso Garcia. “A gente tinha almoço, janta e dormida”, conta Luzia.

Ela e o marido compraram um barraco na favela Tolstói, na zona leste da capital paulista. “Mas tiraram o pessoal para construir a avenida Anhaia Mello. Foi quando encontrei o movimento [FLM].”

Viu os filhos crescerem, casarem e terem casa e não quis ficar com nenhum deles. Diz que tem direito a um teto que seja dela. “Até os passarinhos têm casa.”

Em parceria com qsocial