Aoi Berriel é a primeira pessoa não-binária do Rio a mudar certidão de nascimento

Após decisão inédita, ela mandou recado: "lembrem sempre: não aceitem nenhum direito a menos"

21/09/2020 17:53

No fim do mês agosto, Aoi Berriel, que é uma pessoa não-binária, conseguiu uma decisão inédita: a Justiça do Rio de Janeiro autorizou que em sua certidão de nascimento aparecesse: “sexo não especificado”. O pedido foi realizado através da Defensoria Pública do estado.

Pessoa não-binária conquista direito de mudança de gênero em Certidão de Nascimento
Pessoa não-binária conquista direito de mudança de gênero em Certidão de Nascimento - Reprodução/Instagram

No início, Aoi tinha procurado a defensoria lá em 2015 para fazer sua mudança de nome. Assim que foi informada sobre a possibilidade de poder alterar o gênero no documento, no caso para uma pessoa não-binária, não pensou duas vezes em realizar a solicitação também.

Em entrevista à Catraca Livre, ela disse que a única forma de conseguir a retificação do nome era através do processo judicial. “Eu busquei a defensoria pública para tentar atualizar meus documentos com minha identidade. A final, se os documentos são meus eles devem ser coesos comigo. Esse é um direito”.

Para Aoi, o processo de mudança de nome social e gênero era uma promessa, muito importante para a manutenção de sua vida. “O tempo que corri atrás do processo percebi o quanto a burocracia estava distante de saber lidar com pessoas Transgêneras”, disse.

“Sigo dando continuidade ao encaminhamento das mudanças nos meus documentos e ansiosa para saber se terei problemas. Espero a concretização do atendimento. Assim, eu poderei realmente comemorar e colher os frutos do meu processo tão importante para a manutenção da minha vida”, relatou.

Em questão a qual vocativo deve ser referido a sua pessoa, Berriel ressalta que por causa de uma imposição dita masculina em sua criação, os pronomes masculinos lhe causam desconforto.

“Pronomes femininos não me incomodam, então os aproprio ao me relacionar com o outro na língua portuguesa oficializada. Infelizmente a maioria das pessoas não se adaptam fácil a flexão neutra com “e” e isso é desgastante socialmente. No meu caso preferi utilizar os pronomes femininos para manter minha saúde mental”, explicou.

Comunidade LGBTQIA+ a caminho de novas conquistas

De acordo com a cientista social, que inclusive estuda e pesquisa sobre gêneros, o processo é um precedente em um caminho pioneiro que vai impor uma modificação nacional na estrutura de políticas voltadas ao gênero.

“Aposentadoria? Alistamento militar? Ainda existe muito o que se adaptar para que minha existência, agora reconhecida, possa ter os mesmos direitos e oportunidades do que as pessoas binárias”, disse.

Aoi ainda aproveita para mandar recado para pessoas da comunidade LGBTQIA+ e agradece a todo mundo que está vibrando com a conquista.

“Fico muito feliz em poder dizer para as pessoas não binárias que podemos ter nossos documentos retificados e coerentes com nossa identidade. Temos um motivo para comemorar em um ano difícil pra comunidade LGBTQIA+. Fico orgulhosa em poder propagar isso. Lembrem sempre: não aceitem nenhum direito a menos”, conta.

Entenda sobre a não-binaridade

O próprio nome já diz: sem binaridade, ou seja, não é homem, não é mulher, não é transexual, o termo se refere à ausência de gênero.

Vale ressaltar que a não-binaridade não tem a ver com a sexualidade da pessoa em questão, no caso por quem ela se atrai.

Para entender mais, suponhamos que um um homem tenha nascido no gênero masculino e isso não afeta a integridade dele, ou seja, ele é uma pessoa cisgênera por simplesmente se identificar com o gênero designado a ele ao nascer.

O que não acontece, por exemplo com pessoas transgêneras, que não se identificam com o gênero imposto ao nascer. Isso se aplica também a uma pessoa não-binária, que também não se identifica com o gênero que nasceu. Nem homem, nem mulher, apenas não-binário.

Comemorando uma grande conquista

Em sua última publicação feita no último domingo, 20, no Instagram, Aoi celebra a decisão da Justiça do Rio e dispara: “Me nego a ter que aceitar direito a menos! Me nego a não lutar pelo mínimo, que é ser reconhecida pelo meu gênero e nome”. Veja a publicação na íntegra.

https://www.instagram.com/p/CFX3YDYp9SW/