Conferências TED com agressor e vítima de estupro causa polêmica

20/03/2017 10:34

Thordis Elva e Tom Stranger durante conferência TED que vem causando polêmica
Thordis Elva e Tom Stranger durante conferência TED que vem causando polêmica

Em 1996, a islandesa Thordis Elva tinha 16 anos quando foi violentada por Tom Stranger, um australiano que tinha 18 anos. Na época, os dois namoravam havia um mês e foram a uma festa natalina em Reykjavik, capital da Islândia. Thordis bebeu rum, passou mal durante a festa e Stranger a levou para casa, violentando a namorada.

Thordis não denunciou o estupro, mas, nove anos depois, enviou uma carta para Stranger. Ele a respondeu e os dois decidiram escrever um livro para relatar o ocorrido. A obra despertou a atenção dos organizadores das conferências TED, uma rede de eventos sobre tecnologia, entretenimento e design que os convidou para dar uma palestra em um evento realizado em outubro do ano passado.

A palestra da dupla foi assistida por mais de 2,7 milhões de pessoas, causando reações positivas e negativas. De acordo com informações de uma matéria da BBC, ativistas de grupos de defesa dos direitos da mulher e vítimas de estupro têm protestado contra as palestras de Thordis e Tom. As acusações giram em torno de mudar o foco da vítima para o agressor e do fato de Tom ter utilizado o livro para se beneficiar.

Relatos do agressor e da vítima

Os protestos, no entanto, não têm impedido que, atualmente, Thordis e Tom viajem o mundo discutindo o impacto da experiência na vida dos dois.

Nas palestras, por exemplo, Thordis justifica a razão de não ter denunciado o estupro à época. “Eu tinha 16 anos e estava apaixonada pela primeira vez na vida. Fiquei machucada e chorei por semanas, mas tudo era muito confuso para mim. Tom era meu namorado, não um lunático”, conta. “E o estupro ocorreu na minha cama, não em uma viela. Quando finalmente concluí que havia sido estuprada, Tom já tinha voltado para a Austrália, ao final de seu programa de intercâmbio”.

Ela também relata por que decidiu entrar em contato com o agressor e participar das palestras junto com ele. “A demonização dos agressores pela mídia atrapalhou minha recuperação. O fato de Tom não ser um monstro e, sim, uma pessoa que tomou uma decisão terrível tornou ainda mais difícil para mim reconhecer seu crime”, explica.

“Não quero receitar uma fórmula às pessoas. Ninguém tem o direito de dizer a uma vítima de estupro como lidar com a dor. Mas a violência sexual não pode ser tratada apenas como assunto feminino”, acredita. “Homens cometem a maioria dos ataques, mas suas vozes não estão representadas proporcionalmente nessa discussão. Precisamos ousar enfrentar esse problema juntos. Imaginem quanto sofrimento podemos ajudar a evitar.”

Já Tom lembra que repudiou a violência mesmo quando a cometia. “Mas contei para mim mesmo uma mentira, a de que havia sido sexo, não estupro. Negligenciei o imenso trauma que causei a Thordis. E a mentira me deixou com uma culpa atroz”, conta. Para ele, ter assumido a responsabilidade do ato foi algo surpreendente. “Quando admiti o estupro, a pena que sentia de mim mesmo se transformou na aceitação de que tinha machucado uma pessoa maravilhosa e que sou parte de um enorme e chocante grupo de homens que cometeram violência sexual contra seus parceiros”.

O Catraca Livre é contra qualquer tipo de violência e incentiva que toda forma de abuso ou assédio sexual seja denunciada. Saiba como agir em caso de assédio sexual