Jornalista relata racismo em salão de beleza da Oscar Freire

"Ele ficou uns três minutos rindo e falando alto, em tom deboche", contou

Luanda Vieira, de 33 anos, contou que foi vítima de racismo no Studio Lorena, um salão de beleza localizado na Oscar Freire, região nobre de São Paulo. Em seu perfil no Instagram, Luana, que é jornalista da área moda, beleza e bem-estar, relatou o caso.

“‘Não deixe confortável quem te desrespeita.’ Eu li essa frase recentemente e diria que ela me curou de anos e anos que passei com medo de expor a minha opinião, entrar em alguns debates ou denunciar um crime como o racismo”, escreveu. Assista ao vídeo:

Segundo a jornalista, o cabeleireiro fez piada a comparando com uma manicure.

“A questão não foi ele ter me relacionado a uma manicure, mas ele ter feito um show porque tinha uma mulher negra ali”, contou.

“Ele ficou uns três minutos rindo e falando alto, em tom deboche, com a manicure que me atendia, como se eu não estivesse lá. E por que a Miriã não poderia estar sentada ali?”

Jornalista relata racismo em salão de beleza
Créditos: Reprodução/Instagram
Jornalista relata racismo em salão de beleza

“Esse é o racismo estrutural: o negro não pode estar em todos os lugares.”

Abaixo, leia a nota do Studio Lorena:


Olá. Aqui é a Fernanda e o Luís.

Nesses últimos dias a gente leu bastante coisa. E a nossa ausência aqui, apesar de parecer descaso, é porque é um assunto delicado de se posicionar, especialmente em um ambiente que potencializa mais o combate do que a conversa.

Gostaríamos de começar dizendo que ouvir o relato da Luanda na sexta logo depois que aconteceu nos deixou muito tristes. Nossa primeira atitude foi ouvi-la e nos desculparmos por ela ter vivido isso.

Na sexta-feira o Augusto agiu de forma que julgamos errada sim ao confundir e comparar a Luanda com a Miriã, já que essa conexão se deu por ambas serem negras e usarem o mesmo estilo de penteado e tranças (que era um penteado que a Miriã usava na época que trabalhava aqui com a gente – há 5 anos).

Isso nos mostra o quanto precisamos trazer o debate racial com mais afinco aqui para dentro, já que nossa proposta enquanto espaço não é a de fazer comparativos entre pessoas, mas sim ser um ambiente onde todos se sintam acolhidos e bem. Não esperávamos mesmo que pudesse acontecer, ainda mais vindo do Augusto, que está com a gente desde o dia 01 do salão (há 11 anos) e que nunca nos deu motivos para duvidarmos dos seus princípios e caráter. Por aqui a gente acredita que a mudança perante os nossos problemas sociais se constrói juntos, ouvindo e conversando ao invés de apenas afastando, pelo menos para aqueles que merecem uma segunda chance.

Por fim, vale deixar claro que em hipótese alguma a surpresa do Augusto se deu pelo fato de ter “uma mulher negra ali sentada fazendo as unhas”. Isso não é nenhuma surpresa para gente que está aqui todos os dias. E, @luandavieira: Você trouxe o fato de que no fim da nossa ligação eu ressaltei a sua educação ao escrever a mensagem e ao falar comigo ao telefone para me contextualizar em seu vídeo como racista. Poxa, sério? Te dando o contexto do lado de cá, eu trouxe isso porque pude sentir o lugar de dor que você estava naquele momento e, ainda assim, teve toda a sabedoria do mundo para trazer essa conversa com as meninas na recepção, no whats e depois na ligação comigo de um modo construtivo. E isso é raro, independente da cor da pele. Continuo elogiando a forma que você veio até nós, bem como a atitude de trazer a conversa para a internet. Mesmo infelizmente tendo a nossa marca envolvida, a gente também acredita que é preciso sim conversar mais e mais. Se, de alguma forma estamos melhorando em alguns aspectos enquanto humanidade, é porque hoje temos a possibilidade de conversarmos, que tantas outras gerações não tiveram. É por isso que a gente está aqui para essa conversa e é por isso que o Augusto vai passar por essa transformação de cultura interna junto com a gente.

Sempre tivemos a porta aberta para receber a todos. E se por essa porta entram poucos negros, sim, isso é um problema. Mas aí é uma outra conversa.


Racismo é crime

Racismo é crime previsto pela Lei 7.716/89 e deve sempre ser denunciado, mas muitas vezes não sabemos o que fazer diante de uma situação como essa, nem como denunciar, e o caso acaba passando batido.

Desde 1989, a Lei 7.716 define como crime a discriminação pela raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional
Créditos: iStock/@innovatedcaptures
Desde 1989, a Lei 7.716 define como crime a discriminação pela raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional

Para começar, é preciso entender que a legislação define como crime a discriminação pela raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, prevendo punição de 1 a 5 anos de prisão e multa aos infratores.

A denúncia pode ser feita tanto pela internet, quanto em delegacias comuns e nas que prestam serviços direcionados a crimes raciais, como as Delegacias de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), que funcionam em São Paulo e no Rio de Janeiro.

No Brasil, há uma diferença quando o racismo é direcionado a uma pessoa e quando é contra um grupo.

Racismo x injúria racial

Assim como definido pela legislação de 1989, racismo é a conduta discriminatória, em razão da raça, dirigida a um grupo sem intenção de atacar alguém em específico. Seu objetivo é discriminar a coletividade, sem individualizar as vítimas.

Esse crime ocorre de diversas formas, como a não contratação de pessoas negras, a proibição de frequentar espaços públicos ou privados e outras atividades que visam bloquear o acesso de pessoas negras. Nesses caso, o crime é inafiançável e imprescritível.

O preconceito racial também pode acontecer por meio de atos “sutis”, como recusar atendimento ou não empregar pessoas negras
Créditos: iStock/@fizkes
O preconceito racial também pode acontecer por meio de atos “sutis”, como recusar atendimento ou não empregar pessoas negras

Quando o crime é direcionado a uma pessoa, ele é considerado uma injúria racial, uma uma vez que a vítima é escolhida precisamente para ser alvo da discriminação.

Essa conduta está prevista no Código Penal Brasileiro, artigo 140, parágrafo 3, como um crime contra a honra, sendo o fator racial uma qualificadora do crime.

É importante ressaltar que em casos de racismo, além da própria vítima, uma testemunha pode denunciar o crime. O mesmo não vale para o crime de injúria racial, pois somente a vítima pode se manifestar sobre o ataque na justiça. Conheça outros canais para denunciar casos de racismo.