Para entender: Bolsonaro se diz enviado de Deus e aposta no caos

O principal destaque do Canal Meio é o processo de radicalização do presidente Jair Bolsonaro. Veja abaixo outros temas abordados pela imprensa:

Bolsonaro divulgou neste domingo, 19, um vídeo no qual o pastor congolês Steve Kunda o declara escolhido por Deus para governar o Brasil assim como Ciro o foi, na Pérsia.

“Não existe teoria da conspiração”, afirmou o presidente ao compartilhar o conteúdo, de acordo com o site Poder 360. “Existe uma mudança de paradigma na política.”

No vídeo, falando em francês, o pastor da congregação Orleans Gospel 45 deixa claro que não está fazendo política. “Sustentem esse homem, apoiem-no. Deus falou que os dois primeiros anos dele não seriam fáceis. Mas foi Deus quem o escolheu.”

Texto compartilhado

Na sexta, 17, como revelou Tânia Monteiro em “O Estado de S.Paulo”, Bolsonaro já havia distribuído por WhatsApp um texto com carga pessimista.

“Bastaram cinco meses de um governo atípico para nos mostrar que o Brasil nunca foi, e talvez nunca será, governado com o interesse dos seus eleitores”, afirmou o autor, até então apócrifo. “O Brasil é governado exclusivamente para atender aos interesses de corporações com acesso privilegiado ao orçamento. Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Como todas suas ações foram ou serão questionadas no Congresso e na Justiça, apostaria que o presidente não serve para nada. Bolsonaro não é culpado pela desfuncionalidade, pois não destruiu nada, aliás, até agora não fez nada de fato, não aprovou nada, só tentou e fracassou.”

O texto, sem assinatura, foi escrito por Paulo Portinho, um analista da Comissão de Valores Mobiliários. “Só quis dizer o que está acontecendo no Brasil”, afirmou. Quando perguntado a respeito do que queria dizer com o texto, o presidente limitou-se a afirmar: “Pergunta para o autor, apenas passei para meia dúzia de pessoas”.

Já “O Globo” explica que o texto descreve Bolsonaro como refém das “corporações”, entre elas Congresso, Justiça e Forças Armadas. No fim, traça um cenário de “ruptura institucional irreversível, com desfecho imprevisível”.

Vassourinha

O tom apocalíptico lembra a carta-renúncia de Jânio Quadros, outro presidente que chegou ao poder com discurso messiânico. Na campanha, brandia uma vassoura com a promessa de limpar a “bandalheira” da política. No poder, perdeu-se em medidas como a proibição da briga de galo e do maiô de duas peças. Em agosto de 1961, Jânio escreveu que desejou “um Brasil para os brasileiros”, mas foi “esmagado” por “forças terríveis”.

A renúncia, sete meses depois da posse, foi uma tentativa frustrada de emparedar o Congresso. “Imaginei que o povo iria às ruas, seguido dos militares, e que seria chamado de volta. Deu tudo errado”, ele confessaria, três décadas depois. Bolsonaro já imitou o antecessor nas cruzadas conservadoras. “Ao flertar com a radicalização, o presidente sugere que o fantasma de Jânio continuará a nos assombrar”, escreve Bernardo Mello Franco em “O Globo”.

Ato de apoio

Pois é… Via Twitter e via WhatsApp, aliados de Bolsonaro estão convocando uma manifestação favorável ao presidente para o próximo domingo, 26. Sugerem, assim como afirma a carta distribuída pelo presidente, que o “establishment” está resistindo ao governo e apenas o povo na rua pode mudar esse processo. As informações são do site O Antagonista. Os dois grupos responsáveis pelas manifestações pró-impeachment, MBL e Vem Pra Rua, anunciaram formalmente que não aderirão à mobilização.

Segundo a “Folha de S.Paulo”, a bancada do PSL não está convencida de que a convocação é uma boa ideia. A líder do governo no Congresso vê os atos como um “tiro no pé”, informa o Painel.

Análises

Vera Magalhães, em “O Estado de S.Paulo”, diz que o governo “flerta perigosamente com o tudo ou nada ao estressar as relações institucionais ao mesmo tempo em que tenta medir forças com a oposição nas ruas”.

“Medir forças nas ruas tendo como currículo investidas contra educação, cultura, diversidade social, meio ambiente e direitos humanos […] é uma prova a mais de completa desconexão com a realidade, e pode fazer com que o desgaste do governo escale alguns degraus”, continua a colunista. “É muito cedo para Bolsonaro enveredar pelo tudo ou nada. A insistência nesse caminho pode ter o efeito de evidenciar um desgaste que cresce a cada dia por iniciativa exclusiva do próprio governo”, conclui.

Não acontece todo dia. O ex-presidente Fernando Henrique recomendou, via Twitter, a entrevista concedida pelo ex-presidente José Sarney ao “Correio Braziliense”.

Na entrevista, Sarney diz que “a política é a arte do possível”. “Acho que tem que se lidar com realidades, e a atual é que o presidente não tem maioria dentro do Congresso. […] Temos que compreender que estamos, no Brasil, muito atrasados para enfrentar essa crise que o mundo está vivendo. Então, o presidente está tendo que enfrentar esses problemas, todos mundiais. Era o momento de termos um presidente que tivesse uma visão de todas essas modificações que vive o mundo, para poder enfrentá-las. As perspectivas que temos e que estão sendo construídas nos levam a esperar, lá na frente, um impasse grande.”