Como uma família que respeita a natureza se tornou uma das principais produtoras de vinhos orgânicos da Argentina
Segundo a Bodega Cecchin, a demanda por rótulos livres de agrotóxicos é crescente
Alberto Cecchin é a terceira geração de sua família a cultivar os vinhedos de cerca de 80 hectares em Mendoza, Argentina. A sabedoria para lidar com a terra herdada do avô sem usar agrotóxicos fez com que a Bodega Cecchin se tornasse um dos mais importantes produtores de vinhos orgânicos do país.
“Meus filhos brincam aqui, se sujam, comem terra. Se eu colocar veneno em tudo eles não vão herdar um patrimônio, mas um problema”, afirma.
As outras plantas e animais que habitam os vinhedos não são tratados como inimigos. São aliados para preservar a qualidade do solo. “Está vendo esses furinhos aqui?”, pergunta Alberto, com um bloco de terra nas mãos. “Foram feitos por organismos que habitam esse ecossistema e ajudam na absorção de água.”
O clima desértico da região é bastante propício para o cultivo de orgânicos. Por conta da aridez, poucos insetos conseguem sobreviver no ambiente e a necessidade de pesticidas é menor. O resultado é um produto saboroso, de alta qualidade, que agrada tanto entendidos de vinho quanto adeptos da vida natural.
Já no Brasil a situação é alarmante: somos o país que mais consome agrotóxicos no mundo e uma pesquisa da Anvisa iniciada em 2012 mostrou que 29% das uvas foram reprovadas por excesso de pesticidas.
Segundo Lis Cereja, proprietária da Enoteca Saint Vin Saint, uma das primeiras a comercializar vinhos orgânicos no Brasil, nos últimos quatro anos a demanda por esse tipo de produto cresceu bastante. “Antes as pessoas praticamente não conheciam nada do assunto, mas sinto uma mudança drástica no interesse por esses produtos”, afirma. Ela aposta que 2015 será um grande ano para esse mercado: “embora ainda seja uma coisa underground, os vinhos orgânicos estão entrando na moda”.
Sangue, cartilagem e ovo
Alberto orgulha-se em dizer que, além de orgânicos, seus produtos também são veganos. Mas se o vinho é produzido pela fermentação da uva, ele não seria sempre livre de produtos derivados de animais? “Traços de sangue, peixe, porco, cartilagem de osso e ovo podem ser encontrados em vinhos tradicionais”, garante o produtor.
Proteínas animais, como gelatina, caseína, albumina, hemoglobina e isinglass são usadas para dar cor e filtrar o vinho, mas a legislação não exige que a informação seja descriminada no rótulo.
Há também um rótulo sem sulfito, conservante amplamente utilizado para prevenir a oxidação da bebida. Além de fazer mal para a saúde quando usado em excesso, o anidrido sulfuroso, como também é conhecido, é apontado como a causa da dor de cabeça do dia seguinte e de várias intolerâncias alimentares.
“Meu contador acha que sou louco”
Ao contrário da produção frenética de grandes vinícolas, na Cecchin um senhor acompanhado de seu cavalo percorre lentamente os vinhedos para colher as uvas. Os rótulos são colados manualmente em todas as garrafas que a Bodega produz. Mais do que a quantidade de garrafas comercializadas, a Cecchin se destaca pelo cuidado com as diferentes etapas da produção.
Enquanto o mercado de vinhos sofreu uma queda no último ano, o de orgânicos não para de crescer. “Não estamos dando conta de atender o mercado”, diz Mario Lazzaro, responsável pelas exportações da Bodega.
Ainda assim, Alberto sabe que desafia a lógica de ter cada vez mais lucro ao optar por um produto que respeita a natureza. “Eu tenho o que comer, meus filhos têm o que comer. Não nos falta nada. O que mais posso querer?”
*Os vinhos da Cecchin são comercializados no Brasil pelos Los Mendozitos. Saiba onde encontrar aqui.