Cunha, com a benção das montanhas

Cunha é cidade com gosto de campo e de uma trenzada boa, desde a comida com pinhão, a moda de viola e a congada, bons causos pra contar, e trilhas para percorrer.

Ainda não era Cunha. Era uma passagem apenas. Ostentava o pomposo nome de Estrada Real, embora léguas distante de nobre ou mesmo de caminho. Com muito grotão e biboca, passavam por ela tropeiros e mulas, emergindo e afundando nas vagas daquele montanhoso verdemar.

No lombo dos animais se empoleiravam montes de ouro das minas das Gerais. E o fim da picada era o porto de Paraty, onde a preciosa carga prenhava os porões dos navios que seguiam para Portugal. A estrada tatuava as serras da Bocaina, do Mar e do Quebra-Cangalha, nome este para justificar a quantidade de estateladas de bestas e cargas na serra íngreme e tortuosa.

Mas, voltando a Real, era preciso criar um pouso naquela marafunda de serra, para o descanso e também alimentar homens e animais. Assim nasceu em 1660, um lugarejo que mais tarde viria a ser Vila de Nossa Senhora da Conceição de Cunha, e em 1858 por finalzin Cunha só, como tá inté hoje.

Cunha caipira boa da gema, e das muitas claras que entram no preparo dos suspirões recheados de doce de coco da Cidinha, doceira que herdou antigos sabores e saberes de Cunha. Um deles, fiquem mineiros sabendo –ainda que não engolindo– que aquela comida de sustança, feita lentamente no fogão à lenha, como angu, couve picada bem fininha, frango caipira, o feijão tropeiro misturado à carne e à farinha, e mais doce de leite, frutas em calda, e as renomadas queijadinhas, só foram parar na mesa dos mineiros depois que os comerciantes começaram a circular na Estrada Real. De donde se conclui que a comida mineira nasceu nesses vales. É antes paulista!

Oi, oi, oi, acho bom entrar agora com uma cantoria para serenar a brabeza do mineirim. Nada melhor que os deliciosos versos de Antonio Nicolau cantados na moda de viola:

“Nossa cidade de Cunha
Terra das malacachetas
Tem montanhas que brilham tanto
Como as estrelas cometa.”.

A imponente Pedra da Macela, com 1.840 m de altitude

E por falar em montanhas, a mais alta de Cunha é a imponente Pedra da Macela, com 1.840m de altitude, onde em dias claros, se avistam a baía e a cidade de Paraty, a Baía Grande e Angra dos Reis. A subida é íngreme, mas a vista lá do alto vale, e muito, todo esforço.

Depois da suadeira da trilha da Marcela, não deixe deixe de mergulhar na Pimenta. Haja coragem! A ponta do pé congela só de ensaiar, mas, quando passa o efeito de agulhas pinicando a pele (vai ver que é por isso que a cachoeira se chama Cachoeira do Pimenta), vira-se criança, e aos valentes o prêmio de sair mais limpos do que almas.

Conhecida como a terra dos ceramistas, Cunha abriga charmosos ateliês

Tomou gosto? Então toma mais: na zona rural de Cunha salpicavam artesãs, como Dona Benedita Olímpia que moldavam o barro bom do Barreiro, ou da Sororoca. As paneleiras faziam potes, boiões, cuscuzeiros, pichorras, e fogareiros, cuja confecção em tudo se assemelhava às vasilhas indígenas, utilizando o sabugo de milho raspado para alisar o barro.

O barro bom e a arte das paneleiras foram dando fama à cerâmica de Cunha. Atraídos pelas montanhas e serenidade do lugar, em 1975, chegou à cidade um pequeno grupo de ceramistas provenientes do Japão. O declive natural dos terrenos favorecia a construção dos fornos Noborigama, técnica de origem chinesa, milenar e arcaica, que se baseia em fornos com quatro a cinco câmaras, construídos em rampa. As peças queimam durante 35 horas, atingem temperaturas até 1.400º centígrados, e demoram três dias para esfriar. O resultado é uma cerâmica de grande qualidade, resistência e beleza.

Já se viu um lugar com tanta coisa boa? Tamo afiançando, vai lá conferir, ara!

Onde ficar

Pousada Barra do Bié, o caminho para se chegar até ela é prazeroso, ladeado de fazendas e de cercas que ganharam uma bela pátina do tempo, e a fumacinha saindo da chaminé da pousada anuncia além de interior aconchegante, tem comida boa feita com esmero pela Ana Rosa www.pousadabarradobie.com.br

Pousada da Mata, nem bem o hóspede tira as malas do carro, já vai provando as especialidades da Joana: um biscoitinho de nata, um pão de mel, indicando quanto à estadia ali será saborosa, Tel: (12) 3111-1975, www.pousadamata.com.br

Onde comer

Restaurante Quebra Cangalha, é um bom local para se saborear uma truta com molho de pinhão e o cremoso purê de banana da terra, Tel: (12) 3111-2391, www.quebracangalha.com.br.

Em parceria com Viramundo e Mundovirado

Site de viagens e descobertas. Sugestões para despertar a mudança que o viajante, mesmo sem o saber, deseja. Viajar muda também seu interior, daí “viajar para se descobrir”

Este conteúdo - assim como as respectivas imagens, vídeos e áudios - é de responsabilidade do usuário Viramundo e Mundovirado

A Catraca Livre disponibiliza espaço no site para que qualquer interessado possa contribuir com cidades mais acolhedoras, educadas e criativas, sempre respeitando a diversidade de opiniões.

As informações acima são de responsabilidade do autor e estão sujeitas a alterações sem aviso prévio.