A bactéria do estômago que pode proteger seu cérebro do Alzheimer, segundo a ciência

Cientistas descobrem que uma proteína de bactéria associada a úlceras pode bloquear a formação das principais proteínas tóxicas ligadas ao Alzheimer

30/06/2025 07:02

Uma pesquisa surpreendente publicada recentemente mostra que uma bactéria amplamente conhecida por causar úlceras estomacais pode, na verdade, desempenhar um papel protetor contra o Alzheimer. A Helicobacter pylori, associada a problemas gástricos há décadas, contém uma proteína, que segundo o estudo, é capaz de bloquear a formação das proteínas beta-amiloide e tau, ambas ligadas diretamente à progressão da doença neurodegenerativa.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, um novo caso de demência surge a cada três segundos, sendo a doença de Alzheimer responsável por até 70% dos diagnósticos. A busca por tratamentos eficazes é urgente, já que os medicamentos atuais atuam apenas nos estágios iniciais e, muitas vezes, causam efeitos colaterais severos.

Uma nova abordagem contra o Alzheimer

Cientistas que inicialmente estudavam como a H. pylori interage com outras bactérias acabaram encontrando um caminho inesperado. Eles analisavam uma proteína dessa bactéria, chamada CagA, dividida em duas regiões. Enquanto a parte C-terminal é conhecida por causar danos celulares, o fragmento N-terminal — nomeado CagAN — demonstrou propriedades notavelmente benéficas.

Esse fragmento reduziu drasticamente a formação de biofilmes e estruturas amiloides em bactérias como E. coli e Pseudomonas. Ao aplicar o CagAN em amostras com proteínas beta-amiloides humanas, os pesquisadores observaram que ele praticamente impediu a formação dos temidos aglomerados associados à neurodegeneração.

Cientistas descobrem que uma proteína de bactéria associada a úlceras pode bloquear a formação das principais proteínas tóxicas ligadas ao Alzheimer
Cientistas descobrem que uma proteína de bactéria associada a úlceras pode bloquear a formação das principais proteínas tóxicas ligadas ao Alzheimer - JuSun/istock

Além disso, testes laboratoriais mostraram que o CagAN também bloqueou a agregação da proteína tau — outro elemento crucial no avanço do Alzheimer. Ou seja, a proteína bacteriana atua em duas frentes principais da doença, um feito raro até mesmo entre os tratamentos aprovados.

Potencial além do Alzheimer

O impacto dessa descoberta pode ir além da doença de Alzheimer. Em experimentos adicionais, o CagAN também bloqueou a formação de agregados de IAPP (relacionada ao diabetes tipo 2) e alfa-sinucleína (ligada ao Parkinson), sugerindo que uma única molécula bacteriana pode interferir em múltiplas doenças neurodegenerativas e metabólicas.

A hipótese é que essas doenças compartilhem mecanismos baseados em agregados de proteínas tóxicas, e o CagAN consegue interromper esse processo antes que ele comece.

Cuidado: pesquisa ainda é preliminar

Importante destacar que os testes ainda estão em estágio inicial, realizados apenas em ambiente de laboratório. Ainda não há resultados em animais ou humanos, e os próximos passos envolvem entender mais profundamente o mecanismo de ação do CagAN e testá-lo em modelos vivos.

Estudo ainda não testou o efeito da bactéria em humanos ou animais
Estudo ainda não testou o efeito da bactéria em humanos ou animais - mr.suphachai praserdumrongchai/istock

Mesmo assim, os achados abrem portas para o desenvolvimento de medicamentos baseados em proteínas bacterianas, uma estratégia que pode ser mais segura e eficaz do que os tratamentos atuais.

A pesquisa também lança uma luz sobre o papel ambíguo de microrganismos como a Helicobacter pylori. Tradicionalmente vista como vilã, associada a gastrite, úlceras e até câncer de estômago, essa bactéria pode conter componentes com efeitos positivos no organismo humano.

Isso reforça a ideia de que a medicina do futuro não se baseará apenas na eliminação de bactérias, mas no entendimento profundo de suas interações com o corpo humano.