A bactéria do estômago que pode proteger seu cérebro do Alzheimer, segundo a ciência
Cientistas descobrem que uma proteína de bactéria associada a úlceras pode bloquear a formação das principais proteínas tóxicas ligadas ao Alzheimer
Uma pesquisa surpreendente publicada recentemente mostra que uma bactéria amplamente conhecida por causar úlceras estomacais pode, na verdade, desempenhar um papel protetor contra o Alzheimer. A Helicobacter pylori, associada a problemas gástricos há décadas, contém uma proteína, que segundo o estudo, é capaz de bloquear a formação das proteínas beta-amiloide e tau, ambas ligadas diretamente à progressão da doença neurodegenerativa.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, um novo caso de demência surge a cada três segundos, sendo a doença de Alzheimer responsável por até 70% dos diagnósticos. A busca por tratamentos eficazes é urgente, já que os medicamentos atuais atuam apenas nos estágios iniciais e, muitas vezes, causam efeitos colaterais severos.
Uma nova abordagem contra o Alzheimer
Cientistas que inicialmente estudavam como a H. pylori interage com outras bactérias acabaram encontrando um caminho inesperado. Eles analisavam uma proteína dessa bactéria, chamada CagA, dividida em duas regiões. Enquanto a parte C-terminal é conhecida por causar danos celulares, o fragmento N-terminal — nomeado CagAN — demonstrou propriedades notavelmente benéficas.
Esse fragmento reduziu drasticamente a formação de biofilmes e estruturas amiloides em bactérias como E. coli e Pseudomonas. Ao aplicar o CagAN em amostras com proteínas beta-amiloides humanas, os pesquisadores observaram que ele praticamente impediu a formação dos temidos aglomerados associados à neurodegeneração.

Além disso, testes laboratoriais mostraram que o CagAN também bloqueou a agregação da proteína tau — outro elemento crucial no avanço do Alzheimer. Ou seja, a proteína bacteriana atua em duas frentes principais da doença, um feito raro até mesmo entre os tratamentos aprovados.
Potencial além do Alzheimer
O impacto dessa descoberta pode ir além da doença de Alzheimer. Em experimentos adicionais, o CagAN também bloqueou a formação de agregados de IAPP (relacionada ao diabetes tipo 2) e alfa-sinucleína (ligada ao Parkinson), sugerindo que uma única molécula bacteriana pode interferir em múltiplas doenças neurodegenerativas e metabólicas.
A hipótese é que essas doenças compartilhem mecanismos baseados em agregados de proteínas tóxicas, e o CagAN consegue interromper esse processo antes que ele comece.
Cuidado: pesquisa ainda é preliminar
Importante destacar que os testes ainda estão em estágio inicial, realizados apenas em ambiente de laboratório. Ainda não há resultados em animais ou humanos, e os próximos passos envolvem entender mais profundamente o mecanismo de ação do CagAN e testá-lo em modelos vivos.

Mesmo assim, os achados abrem portas para o desenvolvimento de medicamentos baseados em proteínas bacterianas, uma estratégia que pode ser mais segura e eficaz do que os tratamentos atuais.
A pesquisa também lança uma luz sobre o papel ambíguo de microrganismos como a Helicobacter pylori. Tradicionalmente vista como vilã, associada a gastrite, úlceras e até câncer de estômago, essa bactéria pode conter componentes com efeitos positivos no organismo humano.
Isso reforça a ideia de que a medicina do futuro não se baseará apenas na eliminação de bactérias, mas no entendimento profundo de suas interações com o corpo humano.