Amar o próprio corpo é um ato revolucionário para as mulheres

Enquanto estivermos entorpecidas por dietas e em busca de opções milagrosas para perder peso, estaremos cegas para questões fundamentais

Ontem foi o Dia Internacional da Mulher: data simbólica que representa as dores e delícias de sermos o que somos. Em tempos onde muitas de nós são atacadas pelo machismo, a força da união faz contraponto à sombria realidade. Das altas taxas de feminicídio aos diferentes tipos de assédio – sexuais, morais e físicos –, deparamo-nos constantemente com fantasmas que nos assombram ao cruzarmos ruas escuras.

Mas esse texto não trata da violência explícita à qual muitas mulheres sofrem dia após dia no Brasil. A ideia aqui é aproveitar a perspectiva que tenho por ser uma nutricionista que atende em sua maioria mulheres e, a partir da experiência das minhas pacientes, questionar os impactos à autoestima feminina decorrente da brutal pressão estética que todas sofremos – e que também constitui, mesmo que de maneira velada e indireta, uma forma de violência a todas nós.

A maioria das mulheres vive hoje uma relação com o próprio corpo baseada em insatisfação e desejo de ser mais magra ou mais musculosa. E isso não é um privilégio daquelas que fogem do padrão de beleza socialmente imposto. Isso acontece no íntimo daquelas que julgamos serem perfeitas e satisfeitas com sua aparência.

Acreditar que é possível viver em paz com a sua silhueta e com as silhuetas das mulheres ao seu redor pode te trazer o poder de transformar a sociedade
Acreditar que é possível viver em paz com a sua silhueta e com as silhuetas das mulheres ao seu redor pode te trazer o poder de transformar a sociedade - djvstock/istock

Por isso, acredito que o ato de respeitar e amar o próprio corpo constitua hoje um verdadeiro ato revolucionário para as mulheres. Significa ter força para dizer um basta à avalanche de padrões e pressões sociais que nos oprimem, em maior ou menor grau, em todos os dias e todos os lugares – dos comentários, memes e vídeos ofensivos e misóginos em grupos de WhatsApp às propagandas de televisão, conversas de academias e piadas em almoços de domingo em família. Respeitar e amar o nosso próprio corpo diante de tudo isso é, sem dúvida, uma revolução diária.

E vou além: respeitar o corpo da mulher que está ao nosso lado também constitui um ato revolucionário. Isso inclui, por exemplo, a decisão de não apontar o dedo para outra mulher por causa da roupa que está usando; não julgar a refeição que outra mulher escolheu ter; não importunar qualquer uma de nós pelo fato de estar vestindo biquíni ou cropped; e, sobretudo, não fazer comentários – qualquer tipo de comentário – sobre o corpo de outra mulher.

O Dia Internacional da Mulher deve nos motivar a refletir sobre a necessidade de união de todas as mulheres para construirmos uma sociedade mais justa e igualitária. Enquanto estivermos entorpecidas por dietas e em busca de opções milagrosas para perder peso, estaremos cegas para questões fundamentais, especialmente a de que o nosso bem-estar não pode ser determinado por padrões e pressões sociais.

Dessa maneira, acreditar que é possível viver em paz com a sua silhueta e com as silhuetas das mulheres ao seu redor pode te trazer o poder de transformar a sociedade onde vivemos, além de te dar forças para aproveitar mais as delícias do que as dores de sermos o que somos.

Texto escrito pela nutricionista Marcela Kotait.