Amizades são tão importantes quanto casamento, defende especialista de Harvard
Autora propõe que levemos a amizade a sério: como algo pelo qual vale a pena fazer sacrifícios, investir tempo e construir uma vida ao redor
Durante muito tempo, o amor romântico foi visto como o centro da vida emocional de uma pessoa. Mas será que isso precisa ser assim? A jornalista e autora Rhaina Cohen acredita que amizades profundas e comprometidas podem ter o mesmo valor, ou até mais, que casamentos tradicionais. Seu livro “A Vida é Melhor com Amigos” propõe uma revolução silenciosa: valorizar as amizades como vínculos duradouros, capazes de sustentar vidas e formar lares.
Quando o amigo é a pessoa mais importante da sua vida
Rhaina Cohen, formada em Harvard, parte de sua própria experiência para abordar a questão. Em vez de morar apenas com o marido, ela vive com ele, dois grandes amigos e os filhos pequenos deles. Não formam uma família tradicional, mas compartilham responsabilidades, afeto e convivência diária, como qualquer núcleo familiar.
Essa configuração pode parecer incomum, mas, para Cohen, colocar a amizade no centro da vida é uma escolha consciente e poderosa. Sua experiência inspirou a pesquisa que deu origem ao livro, onde ela investiga amizades que funcionam como parcerias: compram casas juntas, criam filhos, cuidam umas das outras na velhice, tudo sem o componente romântico-sexual.

Parcerias platônicas: um modelo negligenciado
O livro resgata conceitos antigos como “amizade romântica”, comum em séculos passados, e parcerias platônicas, que envolvem comprometimento mútuo, decisões compartilhadas e planos de vida em comum. Cohen argumenta que a sociedade moderna perdeu a noção da profundidade que uma amizade pode alcançar, e que isso é prejudicial não apenas aos amigos, mas também aos casamentos.
A história apagada das amizades intensas
Durante séculos, amizades intensas entre pessoas do mesmo sexo eram celebradas, com carinho, lealdade e devoção mútua. Mas, com o avanço da ideia moderna de casamento romântico e o surgimento do estigma ligado à homossexualidade, essas amizades passaram a ser vistas com desconfiança.
A autora aponta que a homofobia e a centralização do casamento como único vínculo emocional legítimo empobreceram a amizade. A expressão “só amigos” é, para ela, um reflexo desse rebaixamento, como se a amizade fosse um relacionamento menor, descartável ou superficial.

Amizades podem fortalecer casamentos
Embora não seja seu foco principal, Cohen reconhece que amizades profundas também ajudam a aliviar a pressão sobre os casamentos, distribuindo a carga emocional e logística que hoje recai inteiramente sobre o parceiro romântico. Ao aceitar que diferentes pessoas podem exercer diferentes papéis — confidente, cuidador, parceiro de vida —, as relações se tornam mais saudáveis e sustentáveis.
Ela defende que a sociedade precisa deixar de esperar que uma única pessoa satisfaça todas as nossas necessidades. Abrir espaço para que amizades sejam igualmente importantes pode trazer leveza, apoio emocional e liberdade para construir laços mais reais.
A solidão e a crise dos vínculos
Cohen também chama atenção para um problema crescente: a epidemia de solidão. Muitas pessoas, especialmente os americanos, não têm amigos próximos, especialmente homens, que frequentemente não são ensinados a buscar intimidade emocional com outros homens. A expectativa de que o cônjuge supre tudo deixa as pessoas vulneráveis, especialmente em fases difíceis da vida.
Restaurar o valor da amizade é uma resposta à solidão, e também uma forma de fortalecer a saúde emocional da sociedade como um todo. Laços de amizade significativos podem ser tão duradouros e impactantes quanto casamentos, e já começam a ser reconhecidos legalmente em alguns contextos.
Como viver uma amizade mais completa
Para Cohen, a versão mais rica de uma amizade não precisa ser morar junto ou criar filhos em conjunto, mas sim encontrar formas de intensificar o vínculo. Pode ser viajar juntos, passar mais tempo de qualidade ou compartilhar responsabilidades práticas do dia a dia.
No caso dela, morar com amigos trouxe benefícios emocionais e logísticos, como dividir os cuidados com as crianças, celebrar tradições juntos e saber que há suporte nas emergências.
A autora propõe que levemos a amizade a sério: como algo pelo qual vale a pena fazer sacrifícios, investir tempo e construir uma vida ao redor. Para isso, é preciso abandonar ideias como “apenas amigos” e abrir espaço para formas alternativas de conexão afetiva, mais sinceras, variadas e significativas.
Afinal, talvez o relacionamento mais importante da sua vida não seja um romance, mas sim aquela amizade que te conhece profundamente, te apoia nos momentos difíceis e constrói sonhos ao seu lado.