Ciência do bocejo: por que bocejamos e o que isso revela sobre nosso cérebro

O bocejo é mais do que um simples sinal de sono ou tédio; ele desempenha funções importantes na regulação da temperatura cerebral

Por Silvia Melo em parceria com João Gabriel Braga (Médico - CRMGO 28223)
21/04/2025 05:02 / Atualizado em 23/04/2025 10:04

O bocejo é um ato reflexo caracterizado pela abertura ampla da boca, seguida de uma inspiração profunda e uma expiração curta. Embora muitas vezes associado ao sono ou ao tédio, esse comportamento ocorre também quando estamos alertas, sendo observado em diversas espécies animais. Sua natureza semi‑involuntária e universal leva os cientistas a investigar funções biológicas fundamentais por trás desse simples gesto.

Mito da oxigenação x termorregulação cerebral

Durante décadas, acreditou‑se que o bocejo tinha como principal função aumentar a entrada de oxigênio no cérebro. No entanto, experimentos mostraram que alterar a concentração de oxigênio ou dióxido de carbono no ar não afeta a frequência de bocejos, indicando que o reflexo não serve à função respiratória. Em vez disso, a hipótese atualmente mais aceita é a de que o bocejo atua como um mecanismo termorregulador, resfriando o cérebro.

Segundo a teoria termorreguladora, o bocejo promove a troca de calor por meio da inalação de ar ambiente mais frio e do aumento do fluxo sanguíneo facial. Estudos comparativos em mamíferos e aves demonstram que a frequência de bocejos segue um “janela térmica”: ocorre com menor intensidade em temperaturas extremas, altas ou baixas, e atinge pico em faixas intermediárias.

Além de sua função fisiológica, o bocejo é famoso por ser “contagioso”
Além de sua função fisiológica, o bocejo é famoso por ser “contagioso” - Julia Gomina/istock

Em modelo experimental com ratos, sensores implantados no córtex pré‑liminar registraram aumento da temperatura cerebral imediatamente antes do bocejo, seguido de queda significativa nos três minutos após o gesto, retornando ao nível basal. Esses dados reforçam a ideia de que o bocejo ajuda a manter a homeostase térmica do cérebro.

Bocejo contagioso e empatia social

Além de sua função fisiológica, o bocejo é famoso por ser “contagioso”: observar, ouvir ou até ler sobre um bocejo pode desencadear o ato em outras pessoas. Esse fenômeno está associado à ativação de neurônios‑espelho, que permitem a imitação de comportamentos e são fundamentais para a empatia e a coesão social.

O que isso revela sobre o cérebro

O estudo do bocejo lança luz sobre dois aspectos centrais do funcionamento cerebral: a importância da termorregulação para a eficiência cognitiva e o papel dos neurônios‑espelho na comunicação não‑verbal.

Mais do que um simples sinal de sono, o bocejo é um reflexo multifuncional que integra processos fisiológicos, emocionais e sociais, revelando a complexidade dos mecanismos que mantêm nosso cérebro alerta e conectado ao ambiente.