Estudo da PUC-Rio mostra que ficar só nem sempre é ruim para ansiedade

Os pesquisadores investigaram os efeitos do isolamento em diferentes perfis de ansiedade

26/05/2025 20:02

Um estudo publicado no The Conversation Brasil chama atenção para um efeito inesperado do isolamento social: a melhora de sintomas em pessoas com altos níveis de ansiedade e depressão.

A vida em sociedade é fundamental para o desenvolvimento humano, mas para algumas pessoas com transtornos de ansiedade, a socialização pode ser um desafio.
A vida em sociedade é fundamental para o desenvolvimento humano, mas para algumas pessoas com transtornos de ansiedade, a socialização pode ser um desafio. - Tomaz Silva/Agência Brasil

A vida em sociedade é fundamental para o desenvolvimento humano, mas para algumas pessoas com transtornos de ansiedade, a socialização pode ser um desafio.

Esses indivíduos frequentemente relatam alívio ao reduzir ou evitar interações sociais, o que levanta a questão: o afastamento social pode ser benéfico?

Para explorar essa possibilidade, os pesquisadores investigaram os efeitos do isolamento em diferentes perfis de ansiedade, com base em modelos animais.

A pesquisa foi conduzida pelos psicólogos J. Landeira Fernandez, Amanda Peçanha e Thomas Eichenberg Krahe, todos do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). 

Transtornos ansiosos e depressivos: uma dupla recorrente

A ansiedade e a depressão estão entre os transtornos mentais mais comuns do mundo, afetando a vida funcional de milhões de pessoas.

A ansiedade é caracterizada por medo excessivo e comportamentos de esquiva, enquanto a depressão se manifesta por tristeza constante, vazio e perda de interesse em atividades.

A combinação desses transtornos é frequente e pode se intensificar em contextos sociais desgastantes, principalmente em quem possui uma predisposição conhecida como “ansiedade-traço”.

Modelos animais desenvolvidos pela PUC-Rio

Para entender melhor esse fenômeno, o Laboratório de Neurociência Comportamental da PUC-Rio desenvolveu ratos geneticamente modificados com diferentes níveis de ansiedade.

As linhagens, chamadas Cariocas com Alto Congelamento (CHF) e com Baixo Congelamento (CLF), representam padrões distintos de resposta ao medo, servindo como modelos robustos para o estudo dos transtornos ansiosos.

Esses ratos vêm sendo usados há mais de 16 anos para estudar a relação entre ansiedade, depressão e resposta ao estresse em ambientes sociais variados.

O experimento: isolamento e teste de natação forçada

O estudo expôs ratos CHF, CLF e comuns a duas condições: isolamento individual ou convívio com outros da mesma linhagem por 14 dias.

Após esse período, os animais foram submetidos ao teste de “natação forçada”, que avalia comportamentos semelhantes à depressão.

Quanto mais tempo o animal tenta escapar da água, menor o indicativo de comportamento depressivo, sendo essa a principal métrica do experimento.

(Foto usada apenas para fins ilustrativos. Posada para profissional) Isolamento pode ser benéfico em casos de ansiedade
(Foto usada apenas para fins ilustrativos. Posada para profissional) Isolamento pode ser benéfico em casos de ansiedade - FG Trade/istock

Isolamento piora alguns, mas melhora outros

Os resultados foram reveladores: o isolamento social piorou o estado emocional dos ratos com ansiedade média ou baixa.

Já os ratos com altos níveis de ansiedade mostraram melhora significativa, passando mais tempo tentando nadar.

“O convívio com outros ratos igualmente ansiosos tenha causado um ambiente de estresse compartilhado. Então, quando eles ficaram sozinhos, se sentiram melhor.”

O isolamento como estratégia de alívio emocional

Uma revisão científica feita pelos autores reforçou os achados experimentais: o afastamento social pode aliviar o estresse emocional em determinados contextos.

Em casos de ansiedade severa, o isolamento pode funcionar como estratégia de enfrentamento temporária, reduzindo a sobrecarga psíquica.

Apesar disso, os pesquisadores alertam que esse tipo de alívio não resolve os problemas a longo prazo.

Riscos do isolamento prolongado

Estudos mostram que o isolamento excessivo eleva os níveis de cortisol, hormônio relacionado ao estresse, e diminui a dopamina, ligada à motivação e prazer.

Essas alterações afetam o sistema de recompensa cerebral e reduzem o interesse por interações sociais, alimentando um ciclo de retraimento emocional.

Com o tempo, isso pode dificultar ainda mais a reconexão social, agravando quadros de ansiedade e depressão.

O caminho para a recuperação

Embora o isolamento traga alívio momentâneo, ele não deve ser encarado como solução definitiva para transtornos mentais.

Segundo os pesquisadores, “a verdadeira recuperação passa pela reconexão — consigo mesmo, com o outro e com o mundo”.

Para isso, é essencial considerar o histórico do paciente e seu contexto clínico, adotando abordagens personalizadas.

Tratamento ideal e implicações clínicas

O tratamento mais eficaz envolve técnicas de regulação emocional, desenvolvimento de habilidades sociais e treino de flexibilidade cognitiva.

Quando necessário, o uso combinado de medicamentos e psicoterapia também deve ser considerado como parte do cuidado integral.

O estudo contribui significativamente para repensar estratégias terapêuticas e o papel do ambiente social em quadros ansiosos e depressivos.

Este artigo é baseado em texto originalmente publicado no site do The Conversation Brasil.