‘Você tá colocando doença no seu filho’: influenciadora desabafa sobre ataques após diagnóstico de autismo do filho
Mesmo com o diagnóstico do filho confirmado, Hendyohara ainda precisa lidar com o preconceito e a desinformação de muitas pessoas nas redes sociais
Neste Abril Azul, mês dedicado à conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA), a influenciadora digital Hendyohara Munduruca Barboza Matos, de 24 anos, compartilha uma história que começa antes mesmo do nascimento do filho, Dante Munduruca Matos Ataíde.
Quando tinha 2 anos e 8 meses, o menino foi diagnosticado com autismo de nível 2 de suporte. Atualmente, com 3 anos, Dante segue em acompanhamento terapêutico e inspira conversas importantes nas redes sociais da mãe, que acumula mais de 4 milhões de seguidores somente no Instagram.
Em entrevista à Catraca Livre, Hendyohara desabafa sobre os julgamentos que enfrenta de quem trata o autismo com preconceito e duvida do diagnóstico em bebês.
- ‘Já desisti de ir pra festa, socializar, viajar’: a realidade de quem vive com a doença de Crohn
- Este destino é o primeiro a ver o sol nascer no Brasil e tem mar tranquilo o ano inteiro
- Descoberto novos fatores de risco para AVC em jovens
- ‘O amor não está no DNA’, diz publicitária que recebeu óvulos doados para ser mãe, aos 45 anos

Uma suspeita que começou ainda na gravidez
Hendy lembra que era preocupada com o desenvolvimento do filho desde os primeiros meses da gestação: “eu pesquisava muito na gravidez sobre essas coisas, porque a minha família tem histórico de autismo e outras questões mentais, e a família do genitor também”, explica.
Durante a gravidez, além de estresse, ela enfrentou complicações como covid-19, restrição de crescimento intrauterino (RCIU) e depois veio o parto prematuro.
“Ele foi um bebê que nasceu prematuro devido ao mecônio e eu já tinha lido sobre isso na internet, de que crianças que nascem com baixo peso e que são prematuras têm mais chances de nascerem com o transtorno do espectro autista”, afirma.
Alguns comportamentos de Dante chamaram a atenção da mãe já nos primeiros meses de vida.
“Movimentos repetitivos com a perninha, a enorme demora de olhar olho no olho […]. Mesmo com quatro meses, a falta de sensibilidade com coisas que normalmente assustariam bebês recém-nascidos, como por exemplo a porta batia, a luz ligava e desligava, e parecia que nada estava acontecendo com ele. Ele não respondia a certos estímulos e ele sempre foi super estimulado por mim. […] Ele sempre foi uma criança muito alegre, muito serelepe, mas ele não respondia e isso me preocupou muito”, relata.
Ainda segundo Hendy, conforme ele crescia, também andava na ponta do pé, estava com a fala atrasada, empilhava brinquedos, enfileirava os carrinhos sem parar, demorava para dar funcionalidade aos objetos, tinha distúrbios do sono e perdia habilidades já aprendidas, comportamentos associados ao autismo.
Desafios no acesso a profissionais
A influenciadora, que mora em Feira de Santana, na Bahia, já levava o filho para sessões de terapia e fonoaudiologia como parte da intervenção precoce, e foi orientada por profissionais que já o acompanhavam a buscar um neurologista.
Inicialmente, ela procurou um médico especializado em epilepsia por conta dos episódios em que Dante parecia esquecer algumas habilidades.
“Ele tinha uns apagões, ele tava super hiperativo e, de repente, ele apagava, ele olhava pro nada e a gente chamava, mas ele não respondia, parecia que ele estava tendo uma crise de ausência. E aí, primeiro, eu levei nessa neuroespecialista em crise de ausência, em epilepsia, para ter certeza que ele não estava tendo nenhuma convulsão nem nada, pra descartar isso“, lembra Hendyohara.
Depois, teve dificuldade em achar um neurologista especializado e enfrentou consultas breves e pouco aprofundadas. O diagnóstico de autismo de Dante foi confirmado aos 2 anos e 8 meses, após uma neuro realizar uma avaliação detalhada.
“Muita gente falou pra mim que eu tava colocando ‘doença’ no meu filho, que eu era exagerada, que é porque eu era mãe de primeira viagem, que eu era ‘Nutella’, que estava fazendo mi mi mi […]. O diagnóstico não foi algo que me chocou, foi algo que me libertou e eu acho que libertou ele também, no sentido de que agora, tendo certeza de que ele é autista, eu posso procurar as terapias adequadas.”

Nas redes sociais, Hendy foi julgada mesmo após o diagnóstico de autismo confirmado
Quando comentou sobre o diagnóstico do filho nas redes sociais, Hendy recebeu ainda mais comentários preconceituosos, como “ele é muito novo para ter diagnóstico“, “seu filho não tem cara de autista“, “hoje todo mundo é autista, todo mundo tem TDAH“.
De olho na repercussão, a influenciadora aproveita para informar e combater ideias equivocadas sobre o TEA: “Eu tento lidar com isso trazendo informação e por isso eu estou estudando muito sobre o assunto, […] eu vivo isso na prática com meu filho e quero trazer conhecimento verdadeiro.“
A Dra. Ana Paula Gomes, neurologista do Hospital Pilar, reforça a importância do diagnóstico precoce e destaca: não existe “cara de autista“.
“O autismo não é uma doença e não está na cara, é um espectro, ou seja, cada pessoa é única e cada pessoa vai ter a sua característica. Seja ela às vezes uma pessoa mais acelerada, às vezes uma pessoa mais calma, às vezes é uma pessoa que tem mais rigidez de pensamento, mais seletividade alimentar, não fixa tanto o olhar, mas dizer que a pessoa tem ‘cara de autista’ é totalmente errado, totalmente equivocado“, ressalta em conversa com a Catraca Livre.
A especialista reforça que, quanto mais cedo vier o diagnóstico, melhor. Segundo ela, é possível perceber sinais até mesmo antes dos 6 meses de vida. “4 anos é a média de diagnósticos aqui no Brasil, mas é importante que a pessoa, diante da menor dúvida, vá atrás, procure as melhores informações, procure profissionais adequados.”
“Esse diagnóstico precoce é super válido, porque a pessoa vai ter qualidade de vida, vai ter mais acesso, a família vai poder ver as intervenções multidisciplinares, poder conversar na escola, para ter um ambiente mais acolhedor, uma escola mais inclusiva. Então quanto antes isso acontecer, melhor“, finaliza a neurologista.
Para Hendyohara, saber cedo fez toda a diferença e vai garantir um futuro bem melhor para Dante. Ela compara com sua própria experiência com o TDAH não diagnosticado.
“Eu sempre me achei ‘burra’, lerda e muita coisa ruim sobre mim mesma. Fiquei com uma estima muito baixa, porque eu não conseguia evoluir em certos aspectos […]. Minha vida toda foi uma série de dificuldades com várias questões que aconteciam comigo. E eu não sabia por quê“, menciona.
Desafios que ainda persistem e superações
Apesar do diagnóstico precoce ser positivo, os desafios permanecem, principalmente no acesso às terapias: “Hoje eu pago um valor muito caro, que ainda não é um valor acessível pra mim, e eu fico muito triste que eu não consigo dar todo o suporte necessário pra ele.”
“Uma dificuldade também que eu encontrei foi achar uma escola. Hoje ainda bem que ele estuda numa escola inclusiva, mas foi difícil encontrar“, desabafa.
A ótima notícia é que Dante tem evoluído e emocionado sua mãe: “me emociona ele chegar pra mim e falar: ‘Mamãe, quero carinho’. Ele sabe verbalizar isso, […] pra mim é uma grande vitória. E outra coisa que faz parte disso é brincar comigo, ele não brincava comigo, era uma coisa muito unilateral, era só ele com o hiperfoco dele, e ninguém podia nem olhar que ele ficava muito estressado, ele entrava em crise. E hoje ele busca por mim pra brincar e eu sempre quis brincar com meu filho.”
Hendy pontua que cada maternidade é única e que apenas uma mãe atípica entende os desafios e as dores: “o que vai funcionar pra mim talvez não funcione pra você e a gente não pode colocar coisas fixas na maternidade.”
“Isso tirou um peso muito grande de mim, porque a galera falava, ‘nossa, seu filho não dorme, você já fez rotina do sono? E eu fazia tudo e com ele não funcionava. Hoje eu sei porque não funcionava, tem coisa que não adianta quando você tá dentro do espectro. A minha maternidade é única e a de outras mães também”, complementa.
Abril Azul
Neste mês de conscientização sobre o autismo, Hendy faz questão de deixar um conselho importante para todos os pais e responsáveis.
“Em caso de suspeita de autismo ou de qualquer outra condição, procure por profissionais, procure por terapeutas, por neurologista, por fono, porque mesmo se o teu filho não estiver dentro do espectro, a terapia precoce nunca vai ser um problema […]. Não escute as pessoas que estão dizendo que você é louca e que criança não precisa de terapia, todo mundo precisa de terapia”, finaliza.
Ao longo de todo o mês de abril, a Catraca Livre publica uma série de reportagens para ampliar o entendimento sobre o espectro e suas características. Clique aqui para conferir.