Relatório aponta intoxicação por agrotóxicos em zonas rurais

Crianças e adultos relatam sintomas de intoxicação aguda em 7 localidades próximas a plantações

23/07/2018 09:45 / Atualizado em 05/05/2020 11:06

Crianças e adultos relatam sintomas de intoxicação por agrotóxicos
Crianças e adultos relatam sintomas de intoxicação por agrotóxicos

Um relatório divulgado pela organização internacional de direitos humanos Human Rights aponta intoxicação por agrotóxicos em sete comunidades rurais do Brasil.

A organização visitou os Estados do Pará, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná e Minas Gerais. Ao todo, 73 pessoas foram entrevistadas e relataram vômito, diarreia, dormência, irritação nos olhos, dor de cabeça e tontura, sintomas de intoxicação aguda.

“A exposição crônica a agrotóxicos—ou seja, a exposição repetida a doses baixas por um período prolongado—também é uma séria preocupação de saúde pública. A exposição crônica a agrotóxicos é associada à infertilidade, a impactos negativos no desenvolvimento fetal, ao câncer e a outros efeitos graves à saúde—e mulheres grávidas, crianças e outras pessoas vulneráveis podem enfrentar riscos maiores”, destaca o documento.

De acordo com a organização, a intoxicação por agrotóxicos se dá em decorrência do desrespeito às zonas de segurança, que estabelecem uma distância mínima entre zonas habitadas e lavouras onde agrotóxicos são pulverizados por aviões.

O uso de pesticidas prejudica inclusive crianças e professores. “Produtores estão aplicando durante o período escolar e aplicando imediatamente próximo às escolas, então claro, a educação do aluno é interrompida”, disse Richard Pearshouse, diretor do programa ambiental da Human Rights Watch e um dos autores do relatório.

O relatório intitulado “Você não quer mais respirar veneno” reforça a oposição da Human Rights Watch ao projeto de lei que flexibiliza o uso de agrotóxicos no Brasil  e afirma que o país precisa urgentemente adotar medidas para limitar a exposição a agrotóxicos e conduzir um estudo detalhado e imediato sobre os impactos à saúde e ao meio ambiente. “Até concluir esse estudo, o Brasil deve impor uma suspensão à pulverização aérea, além de impor e assegurar uma proibição imediata à pulverização terrestre próxima a locais sensíveis”, afirma o relatório.

O relatório ainda faz inúmeras recomendações para as autoridades. Veja a seguir:

Ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

  • Estabelecer e implementar uma regulamentação nacional sobre zonas de segurança em torno de locais sensíveis, incluindo áreas de habitação humana e escolas, para todas as formas de pulverização terrestre;
  • Estabelecer uma suspensão à pulverização aérea de agrotóxicos até que o Ministério, em conjunto com os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente e como parte de uma revisão nacional das políticas atuais sobre agrotóxicos, realize um estudo sobre os impactos à saúde humana, ambientais e os custos econômicos da pulverização aérea (incluindo um estudo de viabilidade sobre formas alternativas de aplicação);
  • Em conjunto com os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente, desenvolver um plano de ação nacional abrangente para reduzir o uso de agrotóxicos altamente perigosos no Brasil, que deverá conter metas vinculantes e mensuráveis ​​de redução com prazos e incentivos para apoiar alternativas e reduções no uso de agrotóxicos altamente perigosos.

Ao Ministério da Saúde

  • Como parte de uma revisão nacional das políticas atuais de agrotóxicos, conduzir um estudo sobre os principais efeitos à saúde e os custos associados à exposição aguda e crônica a agrotóxicos entre as pessoas que vivem em áreas rurais, incluindo mulheres grávidas, crianças e outras pessoas vulneráveis;
  • Em conjunto com os Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Meio Ambiente, desenvolver um plano de ação nacional abrangente para reduzir o uso de agrotóxicos altamente perigosos no Brasil, que deverá conter metas vinculantes e mensuráveis ​​de redução com prazos e incentivos para apoiar alternativas e reduções no uso de agrotóxicos altamente perigosos;
  • Desenvolver e implementar um protocolo para receber denúncias sobre a pulverização de agrotóxicos em torno de locais sensíveis, incluindo áreas de habitação humana e escolas, com medidas detalhadas para:
  • Assegurar que as autoridades de saúde conduzam um acompanhamento de saúde e monitoramento da água para consumo humano;
  • Fornecer informações sobre casos de pulverização de agrotóxicos em torno de locais sensíveis às autoridades agrícolas a fim de garantir que a pulverização de agrotóxicos seja realizada de acordo com a lei.
  • Assegurar que a legislação existente sobre monitoramento de água para consumo humano seja aplicada, particularmente a exigência de que provedores de serviços de água conduzam 2 testes por ano de todos os 27 agrotóxicos listados no regulamento do Ministério da Saúde sobre a qualidade de água para consumo humano;
  • Monitorar a presença de agrotóxicos na água para consumo humano em comunidades indígenas;
  • Fornecer apoio técnico aos estados e municípios para realizar o monitoramento da água para consumo humano em comunidades rurais e quilombolas;
  • Garantir que a rede nacional de laboratórios de vigilância sanitária que monitoram os resíduos de agrotóxicos na água e em alimentos disponha de equipamento e treinamento de pessoal adequados para realizar o teste de resíduos de agrotóxicos em alimentos e na água para consumo humano;
  • Ampliar, em termos de número e tipo de alimentos e agrotóxicos testados, a análise de resíduos de agrotóxicos em alimentos no âmbito do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA);
  • Publicar informes anuais sobre os resultados do monitoramento de agrotóxicos na água e em alimentos;
  • Ampliar o treinamento de profissionais de saúde quanto a intoxicações por agrotóxicos, incluindo treinamento em diagnósticos clínicos de intoxicações agudas e de exposição crônica a agrotóxicos, e quanto às obrigações de notificação;
  • Melhorar as informações disponíveis aos profissionais de saúde sobre tipos de agrotóxicos e seus impactos agudos e crônicos à saúde, inclusive por meio de um banco de dados on-line com informações toxicológicas para os agrotóxicos mais amplamente usados ​​no Brasil e o manejo clínico de efeitos agudos e/ou crônicos à saúde;
  • Aumentar o apoio técnico aos programas estaduais de vigilância em saúde de populações expostas a agrotóxicos;
  • Elaborar campanhas de conscientização sobre agrotóxicos, seus riscos relacionados à saúde, e como proceder em caso de exposição e/ou intoxicação.

Ao Ministério do Meio Ambiente

  • Como parte de uma revisão nacional das políticas atuais de agrotóxicos, conduzir um estudo dos principais impactos ambientais das atuais políticas de agrotóxicos;
  • Em conjunto com os Ministérios da Saúde e da Agricultura, desenvolver um plano de ação nacional abrangente para reduzir o uso de agrotóxicos altamente perigosos no Brasil, que deverá conter metas vinculantes e mensuráveis ​​de redução com prazos e incentivos para apoiar alternativas e reduções no uso de agrotóxicos altamente perigosos.

Ao Ministério da Educação

  • Em conjunto com o Ministério da Saúde, realizar uma avaliação nacional das escolas particularmente sob risco de exposição à pulverização de agrotóxicos;
  • Em conjunto com secretarias estaduais e municipais de educação, orientar e garantir que diretores e diretoras de escolas notifiquem os casos de intoxicação de estudantes por agrotóxicos, incluindo casos suspeitos, às autoridades de saúde, conforme prescrito na lista do Ministério da Saúde sobre doenças e agravos que requerem notificação compulsória;
  • Trabalhar em colaboração com autoridades de saúde nos níveis federal, estadual e municipal para monitorar a exposição e os impactos à saúde das populações escolares expostas à pulverização de agrotóxicos;
  • Trabalhar em colaboração com autoridades com competência sobre agricultura nos níveis federal, estadual e municipal para reduzir a exposição a agrotóxicos, incluindo a implementação de zonas de segurança para pulverização terrestre e aérea nas proximidades de escolas;
  • Incluir o ensino sobre danos causados por agrotóxicos e estratégias de proteção no currículo escolar, como parte da educação ambiental.

Ao Congresso Nacional

  • Rejeitar projetos de lei que venham a enfraquecer a estrutura regulatória do Brasil sobre agrotóxicos, incluindo o projeto de lei 6.299/2002.
  • Designar apoio financeiro adequado ao Ministério Público Federal, ao Ministério da Saúde, ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, ao Ministério do Meio Ambiente, ao Ministério da Educação e ao Ministério dos Direitos Humanos para implementarem as respectivas recomendações deste relatório.

Aos Ministérios Públicos Federal e Estadual

  • Investigar e processar, sem demoras, os casos suspeitos de pulverização dentro de zonas de segurança ou de danos à saúde ou ambientais resultantes da pulverização de agrotóxicos;
  • Investigar e processar, sem demoras, os casos suspeitos de ameaças contra moradores ou lideranças comunitárias por denunciarem os efeitos dos agrotóxicos à saúde ou por pressionarem por melhor proteção contra a exposição a agrotóxicos;
  • Desenvolver diretrizes sobre como investigar e processar casos de intoxicações agudas ou crônicas por agrotóxicos, incluindo medidas detalhadas relativas:
  • A um canal de comunicação para que autoridades de saúde e ambientais encaminhem casos suspeitos de uso ilegal de agrotóxicos danosos à saúde pública ou ao meio ambiente;
  • À coordenação com serviços de saúde especializados para pessoas expostas aos riscos;
  • À proteção de quem denuncia e de quem testemunha ameaças e atos de retaliação;
  • À coleta de evidências de violação de normas e regulamentos relacionados a agrotóxicos.
  • Treinar procuradores federais e promotores de justiça para investigarem e processarem casos relacionados à pulverização ilegal de agrotóxicos.

Ao Ministério de Direitos Humanos

  • Proteger as pessoas em risco por denunciarem questões relacionadas a agrotóxicos no âmbito do atual programa de defensores de direitos humanos e outros programas;
  • Designar e treinar especialistas para se especializarem em casos relacionados a agrotóxicos.
  • Às Secretarias de Estado da Agricultura
  • Quando estabelecidas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, implementar rigorosamente as zonas de segurança para pulverização terrestre;
  • Na ausência de ação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, estabelecer e implementar rigorosamente as zonas de segurança para pulverização terrestre;
  • Fornecer apoio aos municípios na regulamentação de agrotóxicos, incluindo a implementação e monitoramento de zonas de segurança.

Às Secretarias de Estado da Saúde

  • Assegurar que a legislação existente sobre testes de água para consumo humano seja aplicada, particularmente a exigência de que provedores de serviços de água conduzam 2 testes por ano de todos os 27 agrotóxicos listados no regulamento do Ministério da Saúde sobre a qualidade da água para consumo humano;
  • Desenvolver e implementar o programa estadual de vigilância em saúde de populações expostas a agrotóxicos, incluindo medidas detalhadas relativas:
  • À vigilância da água para consumo humano, incluindo quanto a todos os 27 agrotóxicos listados no regulamento do Ministério da Saúde sobre a qualidade da água para consumo humano, bem como outros agrotóxicos utilizados intensivamente no estado;
  • Ao monitoramento de resíduos de agrotóxicos em alimentos;
  • À identificação e ao monitoramento de comunidades rurais e quilombolas, escolas e outros locais sensíveis expostos à pulverização de agrotóxicos;
  • Monitorar e informar publicamente os incidentes de exposição e quaisquer impactos adversos à saúde causados ​​pela pulverização de agrotóxicos em comunidades rurais, escolas e outros locais sensíveis, bem como quaisquer medidas adotadas ou não pelas autoridades locais para reduzir a exposição à pulverização de agrotóxicos.

Às Secretarias Municipais de Agricultura

  • Quando estabelecidas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ou pela Secretaria Estadual de Agricultura, implementar rigorosamente as zonas de segurança para pulverização terrestre;
  • Na ausência de ação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ou da Secretaria Estadual de Agricultura, estabelecer e aplicar rigorosamente as zonas de segurança para pulverização terrestre.

Às Secretarias Municipais de Saúde

  • Assegurar que a legislação existente sobre testes de água para consumo humano seja aplicada, particularmente quanto a exigência de que provedores de serviços de água conduzam 2 testes por ano de todos os 27 agrotóxicos listados no regulamento do Ministério da Saúde sobre a qualidade da água para consumo humano;
  • Desenvolver e implementar o programa municipal de vigilância em saúde de populações expostas a agrotóxicos, incluindo medidas detalhadas relativas:
  • Ao monitoramento da água para consumo humano, incluindo quanto a todos os 27 agrotóxicos listados no regulamento do Ministério da Saúde sobre a qualidade da água para consumo humano, bem como outros agrotóxicos utilizados intensivamente no estado;
  • À identificação e ao monitoramento de comunidades rurais e quilombolas, escolas e outros locais sensíveis expostos à pulverização de agrotóxicos.
  • Monitorar e informar publicamente os incidentes de exposição e quaisquer impactos adversos à saúde causados ​​pela pulverização de agrotóxicos em comunidades rurais, escolas e outros locais sensíveis, bem como quaisquer medidas adotadas ou não pelas autoridades locais para reduzir a exposição à pulverização de agrotóxicos.