Hilda Botequim, entre mapas e menus
O sol nem bem esticou seus raios entre as árvores da pracinha Sá Pinto para dourar a fachada verde água do botequim, e no interior da cozinha todos já se preparam para esquentar os tamborins, opps, as panelas. E os aromas incensam o ar da Vila Ipojuca, tradicional região da Lapa que gosta de preservar seu jeitão familiar.
Quem curte cozinhar coleciona receitas, reúne amigos e viaja para conhecer outras formas de fazer comida. E, quem ama cozinhar, como Alessandra Ramos, coleciona receitas, reúne amigos, viaja para conhecer outras formas de fazer comida, estuda gastronomia, e … abre um restaurante. Porém, se pra mais do que isso tudo, é fã confessa do Brasil, abre um botequim, a expressão da alma mineira.
Mas, a chef Ale Ramos tem muita criatividade para focar na cozinha dum único estado brasileiro. Sua vida antes do Hilda, já balançava entre mapas e menus, pois, durante vinte anos foi agente de viagens. Mas, a forte presença em sua memória da avó Hilda, a quem Ale dedica o botequim, falou mais alto. De sangue mineiro o que significa ter uma mesa farta e acolhedora, a avó traz lembranças de manhãs domingueiras no quintal e o cheiro bom do tempero do feijão. Mais tarde era a hora do bolinho de chuva pra criançada. Memórias que nos fazem lembrar da música de Milton, outro mineiro que sabe das coisas: “sede de viver tudo, e o coração lá…” pois, são desses bocados saborosos que a chef deseja envolver o botequim. Alguns são visíveis como o painel que entesoura objetos de fazer ou servir comida que pertenceram a avós, avôs e até a bisas. Outras paixões se revelam nos seus sabores combinados, aromas e texturas.
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E, por falar em Minas, você tem um fraco por pão de queijo? Ah, mas ainda não provou esse do Hilda, receita de vó que nem sabia que receitas tinham precisão de serem exatas: “ponha um punhadim de queijo canastra minha filha, outro menorzim de queijo parmesão, depois recheie com pernil desfiado, e seja generosa nos temperos… “.
No botequim tem ainda o bolinho de costelinha suína que acompanha um dueto de geleias, o trio de polenta assada com coberturas de alho-porró, cogumelos, e carne de panela, e caprese, petiscarias para harmonizar com cachaça e cerveja.
Para compor os rótulos do Hilda Botequim, Ale chamou os experts Isadora Bello Fornari e Mauricio Maia, que selecionaram o melhor produzido por aqui. Dentre nosso riquíssimo manancial eles escolheram só cachaças premiadas vindas de Ilhéus, Pernambuco, Espírito Santo, Patos de Minas e Aiuruoca, como a Princesa Isabel, a Saliníssima, a Porto do Vianna, a Tiê Prata, a Rio do Engenho, para citar apenas algumas.
Já entre as cervejas artesanais brasileiras a escolha ficou com a Coruja, Way, Dogma, Capitu, Dádiva, Avós, e a Tupiniquim. Há também vinhos brasileiros e drinques assinados, tudo para ser saboreado lentamente, como deve ser.
No quesito bebida, podemos afirmar que o Hilda é um boteco para estrangeiro conhecer o Brasil, e mais, suas mulheres fortes. Como assim? É que a chef desejou homenagear as mulheres brasileiras que fizeram história como a poetisa Hilda Hilst. O drinque que remete à xará do boteco é feito com morango, cachaça e espumante; o Cora Coralina é suave e frutado a base de cachaça Tiê Branca, suco de limão, soda e fruta do dia; o Tarsila do Amaral teria que ser uma bebida audaciosa, e é composta com as cachaças Porto do Vianna e a Weber Haus Amburana e Jack Daniel’s. Já o Elza Soares é um drinque poderoso, levemente amargo e complexo, preparado com a Saliníssima e vermute tinto.
Nossa sugestão é começar com a salada “da horta para a mesa” na qual entram folhas e legumes que chegaram cedinho. Depois vale experimentar o ‘Feijão, o nosso rei’, com tempero secreto de outra avó, a Diva, que acompanha farofa, arroz, ovo frito, carne de panela ou pernil refogado, ou a ‘Polenta cremosa’ com ragu de carne. Prove ainda o ‘Mexido mineiro’, com carninha, cebola, bacon, feijão, pimenta biquinho, e ovo de codorna frio: tudo junto e misturado. Se sua opção é vegetariana tem a Moqueca feita com palmito, banana-da-terra, tomate, pimentão, um fio de dendê e leite de coco, servida com arroz e farofa. E aos sábados um prato vegetariano absurdamente saboroso é a ‘Lasanha de palmito com cogumelos’, que são lâminas de palmito intercaladas com molho de tomate, mix de cogumelos reduzidos no vinho do porto cobertos com muçarela e azeite trufado. Derreta-se.
Vamos falar das sobremesas? Pudim, pudim, pudim! Com aquela textura cremosa peculiar e doçura no ponto certo, peça um só se for capaz. Por isso a chef bolou os três juntos: de leite, de cerveja preta e de doce de leite. E, que tal um ‘bolo de cocada’ que chega quentinho na mesa? Acompanha sorvete de gengibre ou de canela. E ainda tem ‘Mini churros’ com doce-de-leite. Uma gostosurinha delicada.
Aos sábados, Alessandra abre para um café da manhã especialíssimo e servido em bailarinas, aquele charmoso suporte triplex. É um atire-se à aventura, pois, em cada andar vão achadinhos diferentes: em um andar ficam os ovos mexidos com crocante de presunto de parma, no outro pão francês tostado no forno, bolinho de chuva ou bolo do dia, e noutro ainda mel, geleia, cereal, manteiga, iogurte ou salada de frutas, além de café expresso, café com leite, chocolate, ou suco de fruta. Uma festa!
O Hilda Botequim é prova que a comida faz as pessoas felizes. Que bom que existiu uma avó quituteira, uma neta que teve coragem de expor seus sentimentos e nos mostrar como vê e sente a comida, e um companheiro que embarcou em seus planos.
Depois de se deliciar com as degustações primorosas, não se esqueça de me mandar um pensamento agradecido. Vai lá, botecar!!
Hilda Botequim
Onde: Praça Sá Pinto 67 – Vila Ipojuca, SP
Por Heitor e Silvia Reali