Festival apresenta melhores publicidades com causa
Com o apoio do Carrefour, evento debateu a importância do posicionamento socioambiental para as marcas e contou com apresentação de Simoninha
“A gente fez pesquisa com consumidores, e todas as propagandas que trazem esse impacto social se destacam em valor para a marca, em interesse, em relevância.” A avaliação da executiva da empresa de pesquisa Ipsos Cintia Lin, durante o 2º Festival Causando, deu o tom da relevância das publicidades com causa no país atualmente.
Catraca Livre criou o projeto Causando, apoiado pelo Carrefour, para mostrar como as marcas desenvolvem e assumem causas.
O evento, que tem patrocínio do Carrefour, foi realizado hoje na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo. E reuniu os principais nomes da publicidade no Brasil, sob a batuta do jornalista Gilberto Dimenstein, fundador da Catraca Livre.
Para Sergio Gordilho, copresidente e CCO da agência Africa, esse é “o melhor momento da publicidade brasileira de todos os tempos”. E completou: “Ela é conhecida como a terceira melhor indústria criativa do mundo”.
Melhores publicidades com causa
Mas publicidades com causa não são para todos, de acordo com Gordilho, responsável pelas campanhas “Listen to the Ocean”, de Corona e Parley for the Oceans (categoria Sustentabilidade), e “Penteado”, da Vivo (categoria Etnia). “Primeiro, as marcas têm que saber o que elas são”, disse o executivo, sobre o risco de atrelar um posicionamento que não tenha conexão com a identidade da empresa.
“Muito mais do que falar, tem que fazer”, ponderou Pernil, diretor-executivo de criação da agência AlmapBBDO, que apresentou a campanha “Coral”, de O Boticário (categoria Inclusão). Segundo ele, é preciso “ter consistência”.
Ou nascer com ela, como é o caso da Güd, empresa de ração com vendas exclusivamente online. “A gente se concentrou no início da jornada”, esclareceu Rodrigo Da Matta, executive creative director da agência Wunderman Thompson, responsável pela campanha “Busca Dogues” (categoria Causa Animal).
A ação, por meio de mecanismos de busca, levava quem queria comprar um cachorro de raça para a página de um vira-lata que precisava de um lar. “Todos os cachorros foram adotados”, afirmou Da Matta, no evento que apresentou as melhores publicidades com causa.
Brasil polarizado
Outro ponto abordado foi o temor de algumas companhias de levantarem bandeiras que possam provocar repercussão negativa.
“O medo ajuda a gente a se preparar melhor no âmbito pessoal”, comparou a gerente de marketing de lubrificantes da Shell, Carla Salgueiro. A Shell Rimula vem apostando, há três anos, em campanhas que mostrem a diversidade no mundo dos caminhoneiros.
Uma delas contou a história de Afrodite, uma caminhoneira trans (categoria Gênero). “Foi recorde atrás de recorde. A gente nunca teve uma campanha sendo organicamente tão compartilhada como essa foi. Nem comentários tão esmagadoramente positivos”, afirmou a executiva.
Pedro Reis, CEO da agência Wunderman, criadora da campanha, relatou que, em nenhum momento, essas histórias reais foram barradas, independentemente da polêmica que possam gerar. “O mundo foi mudando”, resumiu.
Mas e quando a campanha provoca repercussão tão negativa a ponto de o boicote a ela virar trending topics mundial? Foi o caso da Burger King, com o post “Recrutamento” (categoria Diversidade), feito a partir da proibição de uma propaganda do Banco do Brasil pelo governo federal.
Do total de tuítes, no entanto, de “80% a 90% era favorável à marca”, ressaltou Rafael Donato, vice-presidente de criação da agência David, responsável pela iniciativa. Segundo ele, um dos motivos é a rede de restaurantes ter no DNA o apoio à diversidade e à inclusão.
Toda hora é hora
Na publicidade ou em um evento, tudo pode se tornar um mote para abordar uma causa, na avaliação de Lenilson Lima, vice-presidente de criação da Agência UM, responsável pela campanha da Livraria Cultura e da ONG Mães da Sé (categoria Cidadania). Nela, personagens somem da capa dos livros para alertar para o desaparecimento de crianças.
“Não existe delegacia especializada no Brasil, não existe cadastro único [de desaparecidos], não existem pessoas para trabalhar com essas famílias, que, muitas vezes, são socialmente vulneráveis”, alertou ele.
Joanna Monteiro, diretora de criação para projetos globais da agência FCB, que também já havia trabalhado com a ONG Mães da Sé, acrescentou: “Foi muito bem traduzido: o personagem fica no ar. O personagem simplesmente desaparece – não morreu, não foi para outro lugar. É muito aflitivo”.
Monteiro, por sua vez, apresentou a campanha “Trending Botics”, do site jornalístico Congresso em Foco. Foram monitorados robôs, ou bots, na internet, no período eleitoral. E divulgados os assuntos mais abordados por eles, evidenciando a tentativa de manipulação dos internautas. “Não eram as pessoas que estavam falando. Aquilo estava sendo impulsionado”, lembrou ela. “Cada dia acontecia alguma coisa bizarra.”
Grandes eventos, sejam disputas eleitorais, sejam competições esportivas, podem ser pontos de partida para publicidades com causa. A Nike, por exemplo, apostou na Copa do Mundo de futebol feminino na França, para trazer uma campanha com a meio-campista Andressa Alves (categoria Gênero).
Na pesquisa para a elaboração da peça, a equipe se deparou com muito mais barreiras para as mulheres no futebol do que poderia imaginar, segundo Mariana Borga, diretora de criação da agência Wieden+Kennedy. “Só ver salário, espaço na mídia, estrutura, campeonato, público… Tem muito entrave.”
Bruno Oppido, head of art e diretor de criação da Wieden+Kennedy, contou que, a partir da história de Andressa, descobriram diversas outras meninas que também arrancavam as cabeças de bonecas para jogar futebol. A ação deu origem a uma bola com o rosto da meio-campista, “a única boneca que uma menina boleira gostaria de ganhar”, riu ele.
Homenagem
Ao lado de estudantes e de José Vicente, reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, o diretor de criação executivo da agência Grey, Rodrigo Tortima, apresentou a campanha “Machado de Assis Real” (categoria Etnia), que reparou um erro histórico: o escritor era negro. Mas publicações, inclusive didáticas, traziam o imortal fundador da Academia Brasileira de Letras com traços europeus e esbranquiçado.
“Qual é a próxima errata histórica que vamos dar?”, questionou o executivo, lembrando que o racismo produziu muito mais desinformação.
O evento, além de trazer as melhores publicidades com causa, teve a participação especial do cantor Simoninha e da Orquestra Sinfônica Heliópolis (OSH), principal formação do Instituto Baccarelli, que atende, anualmente, mais de 1.000 crianças e jovens por meio de seus programas socioculturais.