Falsos kits e supostos milagres não existem quando o assunto é saúde

Receitas mentirosas de pseudocientistas e pseudonutricionistas espalham desinformações que comprometem o bem-estar da sociedade

Não é de hoje que a ciência garante a ineficácia de tratamentos precoces para a covid-19. Apesar disso, assistimos atônitos a entidades médicas se digladiando sobre usar ou não o chamado kit covid. Para quem trabalha com alimentação e nutrição, porém, essa luta labiríntica da ciência versus o negacionismo e o oportunismo está longe de ser uma novidade.

Até mesmo quando o assunto é o novo coronavírus, nutricionistas verdadeiramente preocupados em honrar a saúde e o bem-estar das pessoas alertavam nos primeiros momentos da pandemia sobre o perigo de se acreditar em shots vitamínicos supostamente milagrosos capazes de prevenir a infecção pelo vírus. E, mais uma vez, não faltaram receitas mentirosas de pseudocientistas e pseudonutricionistas jurando que água com limão acompanhados de suplementos encapsulados seriam suficientes para tal.

 Falsos kits e pseudociência estão aí faz tempo
 Falsos kits e pseudociência estão aí faz tempo - Fahroni/istock

Da mesma maneira, percebemos outras intervenções de profissionais da saúde diante de assuntos altamente especializados, como a questão da eficiência de dietas restritivas. Enquanto sabemos que a grande maioria das pessoas que faz dietas restritas, com a intenção de emagrecer, recuperará o peso perdido ou mais quando abandonar a restrição, ainda convivemos com profissionais que insistem em publicizar métodos infalíveis para emagrecimento baseados em contagem de calorias, retirada de grupos alimentares ou jejuns.

Quem não conhece alguém que já fez uma dieta na vida que atire a primeira pedra! E se essa tivesse sido suficiente e eficiente para a redução de peso não seriam necessárias tantas outras posteriores. É o ciclo da dieta: desejo emagrecer e faço regime; com o regime, perco peso; após perder peso, deixo de seguir as regras da dieta, pois não aguento mais sofrer pensando em comida e passando fome; com o fim da dieta, recupero o peso que perdi; e, com isso, reganhando peso, volto a ficar insatisfeito com o meu corpo e reinicio o ciclo da dieta, incontáveis vezes.

Se todos os profissionais da saúde tivessem o compromisso com a ciência e com a verdade, será que ainda haveria modelos de nutrição baseados em força, fé e foco? Ou ainda em retirar grupos alimentares, como o perseguido carboidrato, por exemplo, das refeições dos pacientes? Até a retirada desnecessária de alimentos com glúten e lactose para aqueles que não são alérgicos ou intolerantes a esses elementos? Haveria ainda o terror em torno do açúcar e dos doces?

Faz-se urgente e necessária a valorização incondicional da ciência. É fundamental que os nutricionistas avaliem se há mudança de comportamento e quais os riscos e consequências envolvidas na prática de dietas restritivas. É necessário conhecer todos os efeitos das restrições alimentares não apenas no curto prazo, mas, especialmente, no longo prazo.

Dietas restritivas impactam a vida dos indivíduos de maneira extensa. Portanto, é preciso valorizar aqueles profissionais que estejam alicerçados em estudos sérios, que acreditam que todos os alimentos podem fazer parte de uma alimentação saudável, e que, principalmente, não há milagre quando o assunto é saúde. Da mesma forma como o tratamento da covid-19, o “kit dieta” não só não funciona, como pode trazer sérios riscos à saúde física e mental daqueles que o utilizam.

Texto escrito pela nutricionista Marcela Kotait.