Após pressão, ‘patroa’ ganha novo significado em dicionários

Anitta e abaixo-assinado cobraram Google e editoras a alterarem definição considerada machista e pejorativa

Em parceria com Change.org (Oficial)
08/10/2020 13:34

Antes e depois dos significados exibidos pela ferramenta de busca
Antes e depois dos significados exibidos pela ferramenta de busca - Reprodução

A palavra “patroa” mudou de significado. Antes definida como “mulher do patrão”, “mulher que é responsável pela administração da casa; dona de casa” ou, ainda, “tratamento respeitoso dirigido a uma senhora”, o termo teve suas definições alteradas para as mesmas de “patrão”, só que no feminino. A mudança foi resultado de uma mobilização iniciada depois que a cantora Anitta gravou um vídeo dizendo como a diferença de tratamento era absurda.

O vídeo repercutiu rapidamente e, em pouco tempo, chamou a atenção para o fato que até então passava despercebido, mas que colocava as mulheres em uma situação de submissão. Enquanto o substantivo no feminino era apresentado nessas condições, o masculino era definido como “proprietário”, “chefe”, “dono” e “aquele que comanda”.

Google precisa mudar urgentemente sua definição de ‘patrão’ e ‘patroa’

E foi de um homem que partiu a iniciativa de criar uma campanha na internet para pressionar os dicionários a fazerem a alteração. Enquanto o vídeo da Anitta repercutia, o estudante de administração Tiago Acordi, de 23 anos, decidiu transformar toda a indignação em ação. “Fiquei inconformado com a situação e a primeira ideia que me veio à cabeça foi criar o abaixo-assinado”, conta o jovem que mora na cidade de Chapecó (SC).

Tiago recorreu à plataforma Change.org e lançou uma petição para cobrar a Oxford Languages – que fornece os conteúdos ao Google – e outras editoras de dicionários a mudarem o significado da palavra “patroa”. Em pouco tempo, o jovem reuniu quase 4.000 assinaturas. E também de maneira rápida conseguiu um posicionamento da Editora Melhoramentos.

“Obrigado por ter trazido à nossa atenção este tema. Como editora de uma das mais tradicionais linhas de dicionários do Brasil, nós sabemos que um dicionário não determina o significado de uma palavra, e sim retrata o uso da língua. E esse uso evolui. Aqui, estamos diante de um caso que merece ser revisto. E foi revisto”, respondeu a Melhoramentos. A mudança pode ser conferida na versão online do dicionário Michaelis da editora, neste link.

Tiago comenta que não esperava o resultado, mas que considerou as mudanças feitas tanto pela Oxford Languages quanto pela Editora Melhoramentos como um conquista completa que o deixou realizado. Segundo ressalta, a motivação para gerar mobilização em torno da causa e criar a campanha contou com o estímulo de amigos e também resultou da educação recebida por sua mãe Rosmari, que sempre o incentivou a lutar por seus ideias.

“Hoje vivemos em uma sociedade machista, onde há esse pré-conceito da superioridade do homem arraigado há séculos. Não tenho poder de fala para me expressar como uma mulher poderia, porém, como homossexual e fazendo parte de uma minoria, busco ter empatia e tento entender o impacto de uma situação como essa”, declara o estudante.

Evolução

Em sua resposta, a Melhoramentos esclareceu que os dicionários não determinam o significado de uma palavra, mas que retratam o uso da língua. Ou seja, esse uso pode mudar conforme a evolução da sociedade em determinados aspectos, demandando assim a revisão de alguns termos, como foi o caso da palavra “patroa” e que também pode ser de outros.

Depois de Anitta, foi a vez da cantora Luísa Sonza perceber que uma busca na internet pelo termo “mulher solteira” também apresentava resultados diferentes em relação à versão masculina. Enquanto a ferramenta mostrava para “homem solteiro” o significado “que ainda não se casou”, para o caso feminino eram exibidos termos como “prostituta” e “meretriz”.

Para Tiago, a adequação feita no significado de “patroa” e outras futuras que serão notadas e revisadas servem para ensinar as próximas gerações que alguns conceitos antigos tornaram-se impróprios. “Cabe a nós todos os dias nos fiscalizarmos e garantirmos que não disseminaremos essa atitude inadequada”, comenta o autor do abaixo-assinado.

O Google alterou os dois termos. “Espero poder contribuir cada vez mais com a causa, que consigamos seguir esse flow de evolução e possamos adequar os demais exemplares de outras editoras em modelo físico também, e assim ensinar as demais gerações”, finaliza Tiago.