Caso Robinho: tudo o que se sabe sobre o processo e sua repercussão

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22/10/2020 00:20 / Atualizado em 19/01/2022 14:35

Como se não bastasse a covid-19, além da crise econômica e política que o país enfrenta, o caso Robinho tomou as conversas e se tornou uma das grandes polêmicas nacionais, no início de outubro de 2020. A contratação do jogador pelo Santos Futebol Clube trouxe à tona sua condenação por estupro na Itália e reacendeu o debate sobre a colocação de homens, com esse tipo de histórico, na posição de ídolo no Brasil.

Caso Robinho: tudo o que se sabe sobre o processo e sua repercussão
Caso Robinho: tudo o que se sabe sobre o processo e sua repercussão - Reprodução/Youtube

Desde então, a trama envolvendo o atleta passou a ter vários desdobramentos. Para ajudar você leitor a compreender o que está acontecendo, nós preparamos este conteúdo. Nele contamos de forma cronológica tudo sobre o caso que se tornou de conhecimento público até agora.

Primeiro, Robinho foi condenado, em 2017, pelo Tribunal de Milão, na Itália, a nove anos de prisão por violência sexual em grupo contra uma jovem albanesa. O caso ocorreu em uma boate da capital da Lombardia, em 22 de janeiro de 2013, quando o atacante do Atlético Mineiro ainda defendia o Milan.

Apesar do Tribunal de Milão ter tomado a decisão em 2017, o caso ainda não foi finalizado. Isso porque tanto a defesa de Robinho, quanto de Ricardo Falco, amigo presente na ocasião sentenciada, apresentaram recurso que contesta a determinação da primeira instância. Os detalhes você verá adiante.

10 de outubro de 2020

Na primeira metade do mês de outubro, o Santos Futebol Clube oficializou a terceira passagem de Robinho pelo time paulista. O jogador e assinou um contrato de cinco meses. No entanto, o que era para ser motivo de festa pelo retorno do ídolo tem despertado diversas críticas por conta do caso de estupro envolvendo o jogador.

15 de outubro de 2020

O Santos sofreu a primeira baixa após a contratação de Robinho. A Orthopride, empresa de ortodontia, rompeu contrato de publicidade com o clube da Baixada Santista, ao qual patrocinava desde 2018.

“Nós temos enorme respeito pela história do Santos. Mas neste momento decidimos pelo rompimento do contrato de patrocínio. Nosso público é majoritariamente feminino e, em respeito às mulheres que consomem nossos produtos, tivemos que tomar essa decisão. Queremos deixar claro que não fomos informados previamente sobre a contratação do Robinho, fomos pegos de surpresa pela imprensa no fim de semana”, explicou o diretor de operações da empresa, Richard Adam.

16 de outubro de 2020

O Globo Esporte teve acesso a sentença judicial e a transcrição dos grampos que levaram o jogador a ser condenado. Essas ligações telefônicas realizadas por Robinho foram essenciais para que o veredito da investigação fosse tomado.

As escutas telefônicas, feitas com autorização da Justiça italiana, foram transcritas na sentença. A conversa entre Robinho e Falco mostram que os dois tinham consciência da condição da vítima. (Para mais detalhes, clique aqui)

“Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”, disse Robinho, segundo as gravações da Justiça italiana.

Transcrição dos grampos que levaram o jogador a ser condenado
Transcrição dos grampos que levaram o jogador a ser condenado - Reprodução/Globo Esporte

De acordo com o documento da sentença, a Corte de Apelo de Milão vai iniciar a análise do processo, em segunda instância, no dia 10 de dezembro.

Crítica na imprensa

Ainda no dia 16 de outubro, a repercussão do conteúdo da sentença italiana repercutiu muito e o comentarista Walter Casagrande criticou a contratação de Robinho pelo Santos.

“Estou assustado com a sociedade brasileira, não é um apedrejamento do Robinho. É um apedrejamento da moral da sociedade brasileira, sabe? Não se pode inverter os valores. O Robinho está condenado com nove anos de prisão por violência sexual na Itália. Recorreu, mas nesse momento ele é condenado”, disse Casagrande.

“Eu fico assustado com o que acontece no Brasil. O Brasil solta traficante, o vice-líder do governo é preso com dinheiro na cueca, a Carol Solberg, por se manifestar politicamente, a CBV (Confederação Brasileira de Voleibol) faz censura, e o Santos contrata um jogador que é condenado por estupro, sabe?”, questionou o comentarista.

Suspensão do contrato com o Santos

Horas mais tarde, o time paulista recuou e suspendeu a contratação do atacante. Com um patrocinador perdido e outros quatro ameaçando fazer o mesmo e a repercussão negativa do caso, o Santos se viu sem saída, mas não falou em arrependimento ou assumiu qualquer tipo de erro.

“O Santos Futebol Clube e o atleta Robinho informam que, em comum acordo, resolveram suspender a validade do contrato firmado no último dia 10 de outubro para que o jogador possa se concentrar exclusivamente na sua defesa no processo que corre na Itália”, diz nota do clube.

Nesse mesmo dia, Robinho se manifestou. “Com muita tristeza no coração, venho falar para vocês que tomei a decisão junto do presidente de suspender meu contrato neste momento conturbado da minha vida. Meu objetivo sempre foi ajudar o Santos Futebol Clube. Se de alguma forma estou atrapalhando, é melhor que eu saia e foque nas minhas coisas pessoais. Para os torcedores do Peixão e aqueles que gostam de mim, vou provar minha inocência” afirmou o jogador.

Revolta na web

O Santos revoltou internautas ao suspender contrato com Robinho sem admitir que errou. A motivação do clube também foi criticada.

Para internautas, a decisão do clube foi estritamente financeira, pois a justificativa para a suspensão foi: “Para que o jogador possa se concentrar exclusivamente na sua defesa no processo que corre na Itália” e não, porque o clube não deve colocar na posição de ídolo uma pessoa condenada por praticar violência contra mulher.

E para terminar esse 16 de outubro conturbado, Robinho se compara com Bolsonaro e chama Globo de “TV do demônio”.

“A gente tem N exemplos aí. Você viu o que fizeram com o Bolsonaro antes da eleição? O ataque que fizeram ao cara? Falando que o Bolsonaro era isso e aquilo? Que o Bolsonaro era racista, fascista, que era assassino? E quanto mais eles batiam no Bolsonaro, mais ele crescia. Então estou em paz mesmo, de coração. Não estou preocupado com eles”, disse Robinho.

“O bem sempre vence e a verdade vai aparecer. Os caras aí são pessoas usadas pelo demônio, né? A gente sabe como a TV Globo é uma emissora do demônio. É só você ver as novelas, as programações. Então eu estou em paz. Deus vai dar a vitória. Que se cumpra o propósito de Deus na minha vida. Meter gol neles, ‘tamo junto’. Vou meter uma camisa quando fizer gol: ‘Globo lixo, Bolsonaro tem razão’”, completa Robinho.

17 de outubro de 2020

Robinho afirmou que “infelizmente, existe o movimento feminista”. A declaração foi dada em entrevista ao UOL, em que falou durante cerca de 40 minutos.

“Infelizmente, existe esse movimento feminista. Muitas mulheres às vezes não são nem mulheres, para falar o português claro (…) Eu não sou bonito, sou casado com a minha esposa, mas se eu sair na rua, e a mulher falar: ‘Oi, lindo, gostoso’, tem uma conotação. Se eu mexer com você com falta de respeito é totalmente diferente”, disse.

Robinho seguiu dizendo que é inocente.

Haddad

O ex-candidato do PT à presidência da República, Fernando Haddad virou alvo de críticas nas redes sociais, após fazer um post acusado de racista. O petista compartilhou o vídeo do Casagrande criticando Robinho.

O post de Haddad fez referência à Casa Grande, casa em que moravam os donos de escravos no Brasil do século 19 para trás. “Tem Casa Grande que vale a pena”, comentou o petista ao compartilhar o vídeo do comentarista esportivo. Logo após a repercussão negativa de seu post, Haddad o apagou.

18 de outubro de 2020

Robinho voltou a falar sobre o caso em entrevista a Fox Sports. Robinho atacou a imprensa brasileira, comparou-se com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e contou que a vítima está pedindo R$ 3 milhões de indenização pelo crime.

“A imprensa colocou coisas deturpadas a meu respeito. Só que ninguém colocou que a menina pediu, no processo, R$ 3 milhões. Isso ninguém colocou”, disse Robinho.

O atacante também disse que conta com o apoio de Neymar, jogador do PSG que também já foi acusado de estupro, mas que teve seu caso encerrado, sem condenação.

19 de outubro de 2020

Em 19 de outubro, pelo menos três jornalistas do Grupo Globo relataram ter sido alvo de ameaças de torcedores do Santos que defendem a contratação de Robinho. Os jornalistas Ana Thaís Matos, Rodrigo Capelo e Carlos Cereto, do SporTV, tiveram seus números de telefones pessoais vazados em grupos de WhatsApp.

O caso mais grave aconteceu com a comentarista Ana Thaís, que recebeu ligações e mensagens com ameaças contra sua integridade física. Ela se viu obrigada a desativar sua conta no WhatsApp por segurança. Assim como a jornalista, Carlos Coreto também tomou a mesma medida. Rodrigo Capelo relatou que bloqueou mais de 600 números que tentaram fazer ofensas pessoais.

Mais críticas na imprensa

Ainda no dia 19, o apresentador da Band TV, Neto, criticou severamente o jogador Robinho, durante programa “Baita Amigos”. “Animal não faz isso. Não é por que é famoso, celebridade que pode fazer o que quiser da vida. Ninguém pode fazer isso. E outra coisa, condenado é condenado. Lei é lei para todo mundo. Não é porque é jogador de futebol, não”, disse Neto.

“Como o Santos contrata o Robinho? (…) Vocês pensam se o Robinho vai jogar, se o patrocinador vai sair. Alguém falou da menina? Alguém sabe da mãe dela? Da avó dela? Da história dela? Alguém sabe o quanto ela está sofrendo agora?”, afirmou Neto. Para ver o vídeo, clique aqui.

Repercussão negativa até no governo Bolsonaro.

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, defendeu “cadeia imediatamente” para Robinho.

“Cadeia imediatamente, não tenho outra palavra para falar. Ainda cabe recurso, mas o vazamento dos áudios, gente. Querem mais o quê? Cadeia. Nenhum estuprador pode ser aplaudido. O cara quer voltar para o campo para posar como herói”, declarou Damares.

“O clube já reviu, e parabéns ao Santos por ter rescindido. Eu sei que ainda cabe recurso, mas acho que está muito claro. O vazamento dos áudios está muito claro, a forma como isso chegou para nós”. “Esse é um crime que não merece nenhuma consideração ao abusador, ao estuprador. A gente não tem que fazer concessão com esse tipo de crime. Tem que cumprir a pena que é estabelecida, ou lá ou aqui, imediatamente”, afirmou Damares.

20 de outubro de 2020

O apresentador da Globo, Galvão Bueno, falou sobre o caso de Robinho, no programa “Bem, Amigos”. “O posicionamento, as falas e as transcrições das falas dele, e tudo aquilo que ele disse, dói demais, é horroroso. É doloroso. É muito triste”, disparou o narrador da Rede Globo. “Eu não estou aqui para saber se era primeira instância, segunda instância, ou qualquer coisa do tipo, eu estou arrasado. Arrasado. O ser humano não pode fazer uma coisa dessa”, disse o narrador.

Cleber Machado, outro narrador da Globo, também criticou Robinho e o Santos. Ele ressaltou que “não é não”, frase que faz parte de inúmeras campanhas contra assédio sexual contra mulheres.

“Não devia nem existir esse tipo de coisa, mas existe. Aliás, existe um a cada oito minutos. Então, ainda tem mais isso. A cada oito minutos há um registro de estupro. [Crime] hediondo”, disse Cléber destacando os dados de violência contra a mulher no Brasil. “É isso. É aquela frase que já foi dita: ‘Não é não’”, disse Cleber.

Após defesa a Robinho, Caio Ribeiro é repreendido ao vivo por Cleber Machado.

O comentarista Caio Ribeiro chegou a dizer que Robinho “perde o benefício da dúvida”. Depois, no “Bem, Amigos” da SporTV, ele tentou se retratar e afirmou: “Na sexta-feira, eu não tinha ciência da transcrição do processo. Eu só fui ver isso no final de semana. Por isso hoje no Globo Esporte eu fiz questão de tocar no assunto e ser um pouco mais duro no meu posicionamento. Poxa, eu sou pai de menina, eu não imagino o que eu faria com qualquer pessoa que encostasse o dedo nela”, disse Caio.

Logo na sequência da fala, Cleber Machado interrompe e diz: “Ah, eu também sou. Mas, mesmo que a gente não tivesse filho, nem filha. A questão é geral”, fala o apresentador visivelmente incomodado com o fato de Caio se justificar.

Nem grampeada vítima se contradisse

O procurador do caso de Robinho na Itália, Stefano Ammendola, afirmou que o relato da vítima teve credibilidade porque os investigadores também grampearam as ligações dela e as conversas gravadas coincidem com depoimento dado à Justiça.

Stefano Ammendola falo ao portal UOL Esportes sobre como a investigação foi importante para que a Justiça chegasse na decisão de condenar Robinho a prisão logo na primeira instância. “As interceptações [de diálogos] servem para entender se a vítima está dando uma versão pré-constituída diferente daquela dada no imediatismo da verbalização da denúncia com o procurador ou com a polícia judiciária”, explicou.

Em relação à albanesa, “não houve conversas que pudessem alterar sua versão [quanto ao que havia declarado em depoimento], o que indica o índice de confiança da vítima”, disse.

21 de outubro de 2020

O presidente do Santos Futebol Clube, Orlando Rollo, disse que os áudios de Robinho são gravíssimos, porém, quer mais tolerância com ele. Rescisão só após condenação em segunda instância.

o presidente do Santos afirmou: “Decidimos uma licença do contrato para que o atleta possa se defender no processo que responde na Itália. Não vou entrar no mérito se é culpado, inocente (…)Temos de apedrejar menos e ter mais tolerância.”, disse Rollo sobre o caso Robinho.

O vínculo com Robinho no Santos era válido por cinco meses e, de acordo com o presidente do clube, será discutido em reunião do Conselho Deliberativo.

“Evidente que os áudios são bem significativos. O crime de estupro é bem repugnante. Eu nunca respondi a nenhum processo administrativo porque sou respeitador de todos os direitos e garantias fundamentais, e entre eles, é claro, ele não pode ser considerado culpado até que se transite em julgado. Os áudios são graves? Gravíssimos! Fiquei incomodado? Sim, fiquei muito incomodado. O atleta e sua defesa alegam que alguns áudios foram traduzidos do português para o italiano de maneira equivocada e outros foram tirados de contexto”, defendeu o presidente do Santos.

19/01/2022 – o ponto final!

A Justiça italiana condenou em última instância (ou seja, sem direito a recursos) o jogador de futebol Robinho. Após quase seis anos de julgamento, a Corte de Cassação de Roma rejeitou recurso apresentado pelo jogador e por Ricardo Falco, amigo de Robinho, e o condenou a nove anos de prisão pelo crime “violência sexual em grupo”, ou estupro, contra uma mulher albanesa, em 2013.

Apesar da condenação ser em última instância, Robinho e Falco não poderão ser extraditados para a Itália, já que a Constituição de 1988 proíbe a extradição de brasileiros. Eles podem até mesmo nunca serem presos de fato. Entenda o porquê aqui.

Como denunciar casos de assédio sexual ou estupro

O assédio contra mulheres envolve uma série de condutas ofensivas à dignidade sexual que desrespeitam sua liberdade e integridade física, moral ou psicológica. Lembre-se: onde não há consentimento, há assédio! Não importa qual roupa você vista, de que modo você dance ou quantas e quais pessoas você decidiu beijar (ou não beijar): nenhuma dessas circunstâncias autoriza ou justifica o assédio.

Tecnicamente, de acordo com o Código Penal, assédio sexual é aquele que ocorre onde há relações hierárquicas entre a vítima e o assediador. Em regra, é aquele que ocorre em relações de trabalho, ou seja, o assediador é o empregador ou chefe e o funcionário é o assediado. Os atos invasivos que ocorrem na rua e em outros espaços públicos, geralmente entre desconhecidos, e que popularmente chamamos de “assédio sexual”, configuram, em geral, o recém-criado crime de importunação sexual.

No entanto, as violências que ocorrem nas ruas podem configurar outros crimes além da importunação. Quando há ofensas verbais, por exemplo, fica caracterizado o crime de injúria. Além de configurar crimes, os mesmos atos podem trazer consequências na esfera cível, gerando um dever de indenização.