Por que a Gazeta do Povo foi o único veículo que não demitiu Constantino?

Os funcionários enviaram uma carta de repúdio para a direção do jornal, mas não adiantou, já que resposta foi a mesma de antes, ou seja, ele permanece

Veio a público nesta sexta-feira, 6, que o jornal Gazeta do Povo decidiu manter o vínculo com o comentarista Rodrigo Constantino, que já tinha sido demitido da rádio Jovem Pan, da Record, da Rádio Guaíba e do Correio do Povo, por conta de seu posicionamento polêmico sobre o caso Mariana Ferrer. Na ocasião, ele tinha afirmado que castigaria sua filha se ela também sofresse um estupro estando bêbada e que não denunciaria o crime.

Por que a Gazeta do Povo foi o único veículo que não demitiu Constantino?
Por que a Gazeta do Povo foi o único veículo que não demitiu Constantino?

De acordo com o UOL, a posição foi informada pela manhã aos funcionários do jornal que se sentiram “frustrados, envergonhados e revoltados” com a decisão. No comunicado interno, os chefes disseram que vão observar mais o comportamento de Constantino nas redes sociais.

Os diretores do GRPCOM (Grupo Paranaense de Comunicação) falaram que a mudança da decisão pode mudar, caso ele repita a ter este tipo de comportamento. Para eles, as falas foram consideradas graves, mas não faz “apologia ao estupro”.

Por que a Gazeta do Povo não mandou ele embora?

Em nota, o veículo conta que analisou o posicionamento do funcionário e tentou explicar o que Rodrigo queria dizer.

“Rodrigo Constantino explica de forma mais clara e objetiva o que quis e o que não quis dizer. Isso não nos impede de considerar que suas manifestações iniciais foram inoportunas e infelizes, intempestivas e formuladas com imprecisão, dando margem a dúvidas que precisaram ser esclarecidas. É compreensível, portanto, parte do desconforto e constrangimento que despertou em muitas pessoas”, disse em comunicado oficial.

“Na sua coluna desta quinta, no entanto, disse que jamais teve a intenção de analisar qualquer situação em concreto e reforçou a necessidade de que o caso de Mariana seja apurado e que, assim, faça-se justiça. Disse, inclusive, que acha brandas as penas do crime de estupro em nosso país”, completa.

Ao final, o veículo disse entender que Rodrigo não ultrapassou o limite ético da publicação e decidiu por deixar o colunista entre seus colaboradores.

“Ainda que não concordemos com a forma de muitos dos seus posicionamentos e com muitas das suas opiniões, continuamos acreditando na importância da diversidade de ideias e na importância do diálogo para a construção de uma sociedade melhor e de uma democracia cada vez mais madura, razão pela qual, após várias ponderações e análises, decidimos pela manutenção de Rodrigo Constantino em nosso quadro de colunistas”, conclui.

Revolta na redação

De acordo com a carta obtida pelo portal UOL, mais de 100 funcionários assinaram um texto de repúdio.

O manifesto foi direcionado à direção do jornal, a família dos irmãos Guilherme Cunha Pereira e Ana Amélia Filizola e o grupo de comunicação GRPCOM.

“As colaboradoras da Gazeta do Povo abaixo assinadas receberam o comentário com incômodo e enxergam no episódio uma violação às convicções do jornal”, diz o início da carta.

“Gostaríamos, assim, de mais transparência da direção em relação ao tema e seus possíveis desdobramentos. O colunista da Gazeta do Povo, em seu texto, culpa vítimas pela violência sofrida. Não existe ‘assumir o risco de ser estuprada’. É mais uma situação de opressão em cima da mulher, que não considera avanços de entendimento da sociedade de que estupro não é apenas o ato sexual imposto de forma violenta, mas também o que passa por cima do consentimento”, critica.

A carta dos funcionários classifica o texto do jornalista com misoginia. “Constantino cobra ‘responsabilidade’ da vítima e condena ‘banalização’ do uso do termo estupro, mas descarta a palavra da vítima e ignora o fato de que a violência sexual tem inúmeras outras formas que não um ato consumado. Pior: dissemina esse entendimento deturpado, prejudicando o debate tão essencial. A misoginia perpassa toda a construção do texto além de deixar subentendida a avaliação de que tipo de mulher se coloca sob risco”, diz.

O comunicado ainda fala que é frustrante compartilhar o espaço de trabalho com Constantino mesmo depois do episódio em que ele desrespeitou não só as mulheres, mas como a linha editorial do jornal que está no “caderno de convicções” lançado em 2017.

“A Gazeta do Povo quer proporcionar um ambiente onde as mulheres se sentem seguras para desempenhar seu trabalho ou, ao contrário, um ambiente em que o machismo e a violência moral, verbal e, eventualmente, física, seja vista como tolerada pela direção? Neste cenário, as colaboradoras entendem haver um incentivo ao assédio, à cultura de julgar a vítima e desestímulo a denúncias. Com isso, há perda de respeito e engajamento aos valores e ideais do grupo”, encerra.

Após a carta dos funcionários, a empresa continuou com a mesma posição

Além do comunicado publicado no site, Ana Amélia Filizola, sócia-proprietária do grupo, mandou uma mensagem para os funcionários respondendo o documento. O conteúdo é parecido ao publicado pela Gazeta em seu site, o que confirma a permanência de Constantino no veículo.